Teresa Sales

Editores da Revista Será?, há um ano, tentando tirar uma foto para o site

Editores da Revista Será?, há um ano, tentando tirar uma foto para o site

O riso é a sabedoria, e filosofar é aprender a rir.
Sem a liberdade de rir, de caçoar e fazer
humor, não há progresso da razão.

(Georges Minois) 

Que seja tida como falsa toda verdade em que não houve sequer uma risada!  (Nietzsche)

30 de setembro de 2010

Em 10 de outubro de 2013 a Revista Será? entra na sua segunda primavera, ou seja, completa um ano de existência, tendo chegado a quase setecentos colaboradores e comentadores. É hora de contar a vocês porque nesse período estivemos mudando a foto dos editores na página principal, até chegar à foto atual de nós cinco na cobertura do prédio onde se encontra o escritório de Cláudio Marinho, o Porto Marinho.

Nossa estrutura organizativa, assentada no puro gosto de escrever, dar nosso recado e propiciar o bom debate, é simples: troca de e-mails, um auxiliar para as tarefas mais técnicas e reuniões no escritório de Cláudio Marinho, na minha casa, na casa de Sérgio Buarque. As gravações de vídeo, no Studio da casa de João Rego, depois de passar por improvisações na minha casa e no escritório de Cláudio Marinho.

João, como nosso homem das imagens que ilustram todas as matérias, decidiu que o melhor espaço para a foto dos editores seria a minha casa. Nós todos no sofá, com o quadro de Jim Hollander atrás, ladeado de uma pintura de José Hamilton de um lado, do outra uma de Sérgio Lemos e uma gravura de Goeldi. Marcamos mais de uma vez para essa fotografia, sem sucesso, pela impossibilidade de Cláudio Marinho comparecer, acompanhando que estava naquele período a doença de Luci. Sugeriu-nos que tirássemos o foto sem ele para não atrasar mais.

A revista apareceu em poucos números com somente quatro de nós no dito sofá. Para nossa surpresa, num determinado número, aparece a fotografia de Cláudio Marinho pendurada na parede. A ideia de João foi fantástica. Mas eu não gostei de substituir a figura andrógina de minha parede (justamente o quadro de José Hamilton que eu mais gosto) pelo retrato de Cláudio Marinho. Mas como o computador, na mão de quem sabe, é mais milagroso do que Padre Cícero, na semana seguinte voltou a pintura original e, junto dela, um quadro a mais na minha parede: a mesma foto de Cláudio Marinho.

quemsomos+cmarinho2Assim ficamos até o dia em que pudemos nos reunir os cinco editores na minha casa. Primeiro, comemos um cabrito guisado preparado com a competência de dona Edinha. Depois, enquanto João Rego preparava sua câmara fotográfica, sentamos os quatro, deixando na ponta do sofá o lugar para ele, no curto tempo que a máquina lhe concedia para vir sentar conosco.

Ela disparou exatamente no momento em que o assento do sofá caiu no chão, derrubando nós cinco. A foto está aí para não negar tantas teorias que já se fizeram sobre o riso, desde Platão e Aristóteles. Se eu tivesse no meu apartamento um gato ou um cachorro, eles, mesmo que estivessem sentados no sofá, no máximo tomariam um susto e sairiam correndo. Hoje já é comum o que foi uma das descobertas de Aristóteles, do riso como especificidade humana.

Outro grande pensador sobre o riso, Henri Bergson, reforçaria esse pensamento dizendo que não existe comicidade fora do homem. Para ele, a comicidade se dirige à razão e o riso é incompatível com a emoção. “O riso não tem maior inimigo que a emoção. Numa sociedade de puras inteligências, não mais se choraria, mas talvez ainda se risse; ao passo que almas invariavelmente sensíveis não conheceriam nem compreenderiam o riso”.

O mesmo Bergson afirma que há cenas da vida real tão próximas da alta comédia, que o teatro poderia apropriar-se delas sem mudar uma palavra. Seria esse o caso da cena da queda do sofá?

Em seu ensaio sobre a essência do riso, Charles Baudelaire afirma que há um sintoma de fraqueza no riso. “Com efeito, que sinal mais marcante de debilidade do que uma convulsão nervosa, um espasmo involuntário, comparável ao espirro e causado pela visão da infelicidade de outrem? Tomando um dos exemplos mais vulgares da vida, o que há de tão engraçado no espetáculo de um homem que cai no gelo ou na rua, que tropeça na beirada de uma calçada, para que a face de seu irmão em Jesus Cristo se contraia de modo desordenado, para que os músculos de seu rosto comecem a trabalhar subitamente como um relógio ao meio dia ou um brinquedo de cordas?”

Baudelaire traz mais elementos para deixar-nos, os cinco do sofá, lisonjeados. “O cômico, a potência do riso está naquele que ri e, de modo nenhum, no objeto do riso. Não é nunca o homem que cai, que ri de sua própria queda, a menos que se trate de um filósofo, de um homem que tenha adquirido, por hábito, a força de se desdobrar rapidamente e de assistir, como espectador desinteressado, aos fenômenos do seu eu. Mas tal caso é raro”.

O grande poeta e ensaísta francês não conheceu o povo brasileiro, que sempre cultivou essa arte de rir da própria desgraça.