Sérgio C. Buarque

O aguçamento e a virulência do embate político provocam tantas e profundas cicatrizes e rancores que contaminam o discernimento e, principalmente, o despreendimento dos adversários para negociação e entendimento. O Brasil está gravemente dividido por sentimentos radicais de repulsa e ódio entre o PT – Partido dos Trabalhadores e seus simpatizantes, minoria organizada e fanática (quase religiosa), e a oposição esmagadoramente dominante, mas dispersa, desigual e igualmente emotiva. Não parece existirem possibilidades para entendimento e nem espaço para lideranças independentes com alguma proposta de reconciliação entre os dois polos. E, no entanto, o país não aguenta mais a falta de governabilidade e a crise econômica.

Tudo indica que o governo de Dilma Rousseff acabou e que o PT está na iminência de perder o poder que deteve ao longo dos últimos 12 anos. O discurso do senador Humberto Costa nesta semana era claramente de alguém que já se sentia na oposição e, portanto, fora do governo, anunciando uma oposição violenta e avisando que Michel Temer seria o proximo a cair, mesmo este não sendo ainda o presidente. O fato é que a presidente não governa, não tem a menor possibilidade de restaurar credibilidade e governabilidade e acaba de perder o apoio do maior partido no Congresso, o PMDB. Seja o impeachment, seja uma duvidosa renúncia de Dilma, o PT encerra agora, de forma melancólica, sua presença destacada na política brasileira.

Mas, e depois? Qual o futuro do Brasil após a quase certa saída de Dilma? O futuro é sempre incerto. Em todo caso, considerando que o vice presidente Michel Temer assuma a presidência da República (o que seria inviabilizado apenas por uma decisão do TSE de anular as últimas eleições), o futuro do Brasil depende da sua capacidade de construção de uma nova governabilidade. Se fracassar, o Brasil vai afundar no confronto político e se arrastar mais ainda na crise econômica, chegando às eleições de 2018 como uma nação fraturada e desesperada e uma economia desestruturada.

Mas, como ocorreu em 1992 com Itamar Franco, o novo presidente – Michel Temer – pode construir uma base política com governabilidade para um governo de transição até as eleições de 2018. Para isso, teria que controlar o seu partido, o PMDB, e agregar a ele outras forças políticas da atual oposição (principalmente PSDB, PPS e PSB). O melhor para o Brasil neste momento de fragmentação política seria a formação de um “governo de união nacional” sugerido pelo deputado Jarbas Vasconcelos, tentando contar com a participação do próprio PT. Considerando o aguçamento do confronto nós-e-eles, esta participação do PT num governo de união nacional dirigido por Temer parece muito improvável. Tudo indica que, no caso de um novo governo, o PT e parte dos movimentos sociais aliados farão oposição radical e mesmo virulenta, como têm anunciado Humberto Costa, Lula e líderes do MST. A começar pela oposição dura à implementação de um inevitável ajuste fiscal e algumas reformas inadiáveis, que Dilma defendia já contra a vontade do seu partido.

Embora 2016 seja um ano praticamente perdido do ponto de vista econômico, um novo governo com credibilidade e governabilidade poderá criar um ambiente favorável a decisoes difíceis e mesmo a uma reanimação dos agentes econômicos. Neste caso, o Brasil teria condições de reequilibrar a economia e iniciar uma tímida mas consistente recuperação até as eleições de 2018.

Nesta altura dos acontecimentos, a posse de Michel Temer e, a partir dela, a restauração da confiança da sociedade e a formação de uma base política para enfrentar a crise fiscal e implementar algumas reformas fundamentais é a melhor alternativa para o Brasil. Ele deve ter os defeitos dos políticos tradicionais, mas tem demonstrado capacidade de negociação, mostrou que tem proposta, com o documento “Ponte para o Futuro”, e seguramente deseja encerrar sua carreira politica como o presidente que “salvou o Brasil do desastre”.  Devemos brigar pela alternativa ótima. Mas temos que aceitar e convergir para alternativas viáveis e adequadas à dramática situação política e econômica que vive o Brasil, a melhor dentro das circunstâncias.