Clemente Rosas

Sou um otimista incorrigível. Ou um “realista esperançoso”, como preferia Mestre Ariano Suassuna. Afinal, por que antecipar o sofrimento com uma expectativa do pior?

Nessa estação de sombras por que passa a vida político-administrativa brasileira, alegrei-me com o lampejo da negritude do Ministro Joaquim Barbosa, que inaugurou uma nova era na nossa Suprema Corte, mandando gente rica e branca para a cadeia. Se mais não fez, foi pela pusilanimidade de alguns dos seus pares, que preferiram proteger-se com o escudo do formalismo jurídico a realizar o supremo valor da Justiça. Mas – dizem que por medo à morte – o nosso herói omitiu-se, calou-se, em momento posterior, quando a sua voz, tão aguardada, teria ecoado pelos rincões da pátria, consolidando esperanças em nossos corações.

Temos, no entanto, uma nova luz na ribalta, brilhando, na expressão de Elbert Hubbard, como o planeta Marte no seu periélio. No Paraná, o juiz Sérgio Moro, ao julgar escândalo ainda maior que o popular “mensalão”, de forma serena e destemida, está levando à prisão, indistintamente, grandes figuras dos meios empresariais, altos executivos de empresas estatais e privadas, corruptos e corruptores. O palco está, pois, iluminado para um novo espetáculo, a merecer nossa atenção e nosso aplauso.

Louvemos, portanto, a bravura desse compatriota que nos ensina, com seu exemplo, que o cidadão brasileiro é nobre. Como ressalva o poema de Luís Cernuda, pouco importa que tão poucos o sejam. Um, apenas, pode ser o bastante, como testemunho dessa desacreditada nobreza. E seu nome nos evoca a tragédia do Primeiro Ministro Aldo Moro, sacrificado pelo fanatismo das “brigadas vermelhas”, e, por tabela, o comparável destemor do presidente italiano, ante o risco de destino semelhante, ao declarar de público: “Se me sequestrarem, não quero negociações. Deixem-me só, com eles”.

Mas há, ainda, outra lição valiosa a ser extraída desse quadro: a prova da solidez estrutural da democracia brasileira. Justiça Federal, Ministério Público da União e Polícia Federal são, na essência, instituições independentes e honradas, não por graça de nenhum integrante dos Poderes da República, mas a partir do ”status” que a Constituição de 1988 lhes concedeu. E sua ação demonstra que nenhuma instância governamental, nenhum agente público, nenhum magnata privado pode considerar-se acima da Lei.

É lição, sobretudo, a ser tomada pelos inconsequentes que, de forma primária, ingênua ou maliciosa, vêm pregando a intervenção militar para “pôr o país em ordem”. Se tal acontecesse, regrediríamos como nação democrática, e nossas instituições republicanas estariam sob risco, como vem acontecendo em nosso entorno.

Que sosseguem, pois, as “vivandeiras alvoroçadas” de que falava o General Castelo Branco. Os “granadeiros” aprenderam a lição: estão quietos, conscientes, eles também, da nobreza do seu papel, na forma como vem sendo cumprido agora.

 

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* Clemente Rosas, procurador federal aposentado, é consultor de empresas