Alberto Aggio

Como refletir e desvendar o ponto central da conjuntura política que estamos vivendo? Essa pergunta, mais do que necessária, é o dilema político que vai impulsionar o batimento cardíaco da política, pelo menos até a definição das candidaturas para o embate de 2018.

É um equívoco imaginar que a campanha presidencial de 2018 irá ser travada em torno do governo Temer. A eleição presidencial não será um confronto entre situação e oposição ao governo federal. Lula imaginava que esse seria um trunfo seu e que lhe daria uma colheita segura. Certamente fará muita retórica desse ponto de força. Mas seu objetivo não é a avaliação do governo em si e sim a definição de um inimigo para lhe dar sustentação ao discurso salvacionista. Mesmo ele, como noticiam os jornais, já arriou a bandeira de derrubar Temer. Nas suas palavras: “agora não é hora de tirar Temer, é hora de saber quem será o próximo presidente do Brasil”. O tempo de derrubar Temer passou e Lula imediatamente atualizou seu discurso afirmando que “perdoaria os golpistas”, o que foi entendido também que o PT deveria estar aberto a negociar politicamente com o PMDB, principalmente, para tentar recuperar o eleitorado perdido.

Por outro lado, os parcos êxitos do governo em matéria econômica (controle da inflação, retomada da atividade econômica e pequena diminuição do desemprego) não são suficientes a ponto de se imaginar que Temer conseguirá fazer o sucessor. Em função da sua baixíssima popularidade – que não dá sinais de recuperação –, o mais provável é que Temer não tenha nem mesmo um candidato para chamar de seu. Mais do que isso: pode-se supor que posicionamentos polarizados em relação ao governo Temer serão, no fundo, irrelevantes na pugna que se travará em 2018. A população reprova contundentemente o governo, mas vai às ruas protestar, sinalizando que não quer mais instabilidade. Assim, um discurso que apontar nesse sentido estará fadado ao fracasso.

Na conjuntura política que vai compondo o embate eleitoral, a polarização PT versus PSDB deixou de ser um tópico essencial. Da mesma maneira que a visualização de uma “terceira via” perdeu pequena força que tinha. Diante de Lula e Bolsonaro e do problema que isso pode significar caso essa disjuntiva chegue ao segundo turno, a alternativa que emergiu foi a de se buscar a construção de uma alternativa a partir da ideia de um “centro democrático”. Mas, como construí-lo? Quais seriam os seus termos e o seu programa? Quais seriam os seus signos identificadores, suas marcas, capazes de carrear apoios não apenas entre os setores organizados, mas em relação ao conjunto da sociedade?

As alternativas ainda não estão seladas. Pior, o discurso que possa compor essa candidatura de centro, apesar de contar com o apoio de pessoas preparadas e experientes, ainda não decantou. Lula sabe disso e já se dispôs a novamente flertar com o centro, buscando romper seu isolamento à esquerda, a despeito de setores do seu partido, em especial da sua presidente, a senadora Gleisi Hoffmann, que rejeitam esse movimento do seu líder maior. Por outro lado, a consigna “o Brasil precisa de construtores e não de gladiadores”, repetida comumente por Geraldo Alckmin visa insinuar que aqueles que querem o “bem do Brasil” devem buscar sua união e não digladiarem entre si. Para os propósitos de uma candidatura de centro democrático, está é uma construção feliz. Em tom mais beligerante do que Alckmin, mas não sem ter suas razões, João Doria tem falado incisivamente em que o combate ao lulismo – para ele o principal adversário – deve se dar com a formação de uma “frente do centro democrático”. Certamente, um discurso alinhado com a alternativa que se propugna para os setores que não querem os extremos à direita nem à esquerda. Por enquanto os outsiders ainda estão fora da luta política e, por isso, é duvidoso que politicamente possam dar alguma contribuição ao país. Pior, o chamado “corporativismo de partido” que tanto o PT praticou no passado, pensando mais nele do que no país, não é bom conselheiro, especialmente numa época de crise profunda por que passa a relação da sociedade com a política.

O dilema tucano em relação ao governo Temer, que vem agitando a cena política, não é o centro da conjuntura, mas é um problema para a definição de uma candidatura forte que possa chegar ao segundo turno expressando um programa que articule setores democráticos da direita liberal à esquerda democrática. Ao que parece, o tempo político de “ruptura” com o governo Temer já passou e mesmo que o PSDB assim decida até dezembro, pouco afetará a tarefa que os democratas  têm pela frente. Sair do governo provavelmente será uma operação com dividendos irrelevantes se pensarmos em função do impacto que terá no conjunto da sociedade. Em contrapartida, pode produzir um resultado nefasto: abrir passagem para Lula conquistar uma parte do centro político que estava perdido para ele. O núcleo central da política democrática está nas saídas para um país que se encontra afogado pela crise que nos deixou o PT e tem pouco a ver com o fato de estar ou ter apoiado o governo Temer.

Felizmente, já nos afastamos da lógica binária que tantos prejuízos políticos causaram e precisamos construir uma estratégia de largo folego para enfrentar e superar a crise. As expectativas quanto à uma transição que colocasse o país num novo patamar não foram e não serão correspondidas até o final do próximo ano, por diversas razões. Haverá a necessidade de paciência nessa espera ativa que teremos que cumprir até as eleições de 2018. Nesse percurso, à moda de Weber, teremos que mobilizar, dentro das nossas melhores tradições, além da “conciliação”, os valores da política, na sua dimensão de vocação, bem como ato de realismo diante de nossas responsabilidades públicas perante o país.