Cristovam Buarque >

“Jovens do Brasil, brasileiras e brasileiros:

Nós erramos. Erramos todos nós que recebemos de vocês mandato para governar bem o Brasil, esquecendo os sonhos de vocês. Nós todos, os políticos e seus partidos erramos. Mas, devo admitir que mais erramos nós que há 10 anos governamos o Brasil e especialmente eu própria errei ainda mais, como a presidenta de vocês.

Nós erramos ao sermos 6a economia e 88a nação em educação; ao deixarmos o Brasil ser o mais violento país do mundo, fora de guerra; ao priorizarmos sempre o privado, especialmente transporte, em detrimento do público;  tolerarmos corrupção e não conseguirmos punir aos corruptos; erramos ao consumir o presente sem investir no futuro; ao deixarmos toda  juventude sem sonhos de utopia para seu país e parte dela sem o atendimento do essencial para seu presente; ao montarmos governos de acordos, lotando os cargos, nem sempre utilizando os mais capazes.

Nós erramos e temos que agradecer a vocês que foram para a rua manifestar indignação com a realidade política do Brasil. E erraremos muito mais se não entendermos que dois milhões de pessoas nas ruas não podem aceitar menos do que uma revolução.

Creio, e gostaria de ouvir a opinião de vocês, que no momento não se trata de uma revolução econômica e social, como aquela que me levou às ruas e até a lutas mais radicais, algumas décadas atrás. Para mim, a economia e a sociedade precisam de fortes reajustes, de uma inversão nas prioridades, mas a revolução pela qual vocês vão às ruas está na subversão da atual estrutura política. Fazer uma revolução na política para que nossos dirigentes tenham o sentimento das necessidades e vontades que estão na alma do povo, e que nossos executores tenham o mérito necessário para ocupar as diversas posições com a competência que o Estado moderno exige.

Este é meu sentimento, como a presidenta do Brasil, mas quero ouvir vocês, sentir o que pensam, pedindo que escolham e me enviem interlocutores, sem que quaisquer deles tenham monopólio, ouvirei todas as vozes e não só aquela de meu partido e de minha base de apoio. Quando o povo coloca dois milhões de pessoas nas ruas, o governante não pode ter a cegueira de ficar restrito aos seus apoiadores e assessores. Até segunda feira, submeterei ao Congresso a proposta de realização de uma constituinte exclusiva para definir o marco legal de uma revolução na política. Antes de entrar em vigor, a proposta destes constituintes será submetida a um plebiscito, para saber se ela está de acordo com o que o povo deseja. Determinarei também aos meus ministros uma reanálise completa das prioridades dos investimentos e gastos governamentais, não apenas para os meses que restam de meu mandato, mas também para o futuro do nosso país.

Como quem na juventude lutou como vocês por um Brasil melhor, fico  entusiasmada e grata pelo fato de a história ter me colocado o desafio de presidir um país onde 2 milhões de pessoas estão nas ruas protestando pelo acúmulo de tantos anos de erros, especialmente de meu governo. Eleita democraticamente, agora preciso ir além da eleição e me ajustar à vontade do povo. São desafios como este que permitem um governante na história, não apenas como administradora da herança recebida, mas como estadista do futuro a ser construído.

Eu agradeço a vocês não apenas pelo alerta, mas sobretudo pela chance histórica que me ofereceram. Não vou deixar de ouvi-los, não vou decepcioná-los, podem ficar certos de que dedicarei cada instante do que me resta do mandato para estar a altura do momento e de vocês.

Muito obrigada, viva a democracia, viva o Brasil que vocês querem construir.”