Sérgio C. Buarque

Diego Rivera, Detroit Industry murals, 1932-33.

Diego Rivera, Detroit Industry murals, 1932-33.

De forma simples e direta, no mundo contemporâneo o Estado serve para regular o mercado e estimular o ambiente de negócios. E serve, principalmente, para prover a sociedade de serviços públicos de qualidade. Para exercer esta função, o Estado precisa coletar impostos das atividades econômicas e dos cidadãos. A sociedade contribui cedendo parte da sua renda para receber como contrapartida os serviços gratuitos e de qualidade (educação, saúde, segurança e conforto). Em princípio, quanto mais amplos e melhores estes serviços, maior o volume de recursos que o Estado precisa receber de cada uma das pessoas que compõe a sociedade. Como é sabido, o Estado também exerce um papel distributivo na sociedade, na medida em que cobre e arrecade mais impostos dos ricos e entregue serviços públicos iguais para todos os cidadãos.

Se o Estado deve ser o provedor dos serviços à sociedade, pra que serve o Estado brasileiro? Esta pergunta deve passar pela cabeça de cada brasileiro quando vai a um hospital público e se depara com o desmantelo do atendimento, a carência de condições mínimas de tratamento, a falta de medicamentos, equipamentos e médicos, doentes em filas intermináveis e acumulados nos corredores. Para onde estão indo os bilhões de reais que a sociedade entregou aos governos, se não recebem os serviços de responsabilidade do Estado? As famílias com melhor renda que têm um seguro de saúde (cada vez mais caros) para receber um atendimento particular de melhor qualidade podem fazer a mesma pergunta: estou pagando duas vezes pelos mesmos serviços? Pagam impostos para criar os fundos que o Estado requer para a prestação dos serviços. Porém, para fugir o desastre dos hospitais públicos, terminam por pagar pelos serviços privados. O mesmo vale para a educação, para a segurança, para o conforto nas cidades.

Como já tem sido dito, o Estado brasileiro cobra uma carga tributária de primeiro mundo mas oferece serviços de terceiro ou quarto mundo. Para que tanto dinheiro? Não é necessário um estudo para perceber o fracasso do nosso Estado: perdulário, ineficiente, caro, corrupto e inadimplente na prestação dos serviços. Os dados servem para confirmar e ilustrar o que os brasileiros sentem no seu cotidiano. O desempenho de um Estado nacional pode ser medido pela relação entre a carga tributária (o que retira da sociedade) e a qualidade dos serviços que entrega aos cidadãos. Nesta relação, o Brasil está muito mal e várias vezes pior que muitos outros países, quando medido pelo Índice de Retorno de Bem Estar à Sociedade do Estado que compara a carga tributária com o IDH-Índice de Desenvolvimento Humano (Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação).

De acordo com o índice, o Brasil tem o pior desempenho entre os 30 países de maior carga tributária no mundo: recolhe 35,04% do PIB em impostos e gera serviços que levaram a um IDH de apenas 0,744 (menos do que o Uruguai, por exemplo, que tem uma carga de tributária bem inferior, 26,3% do PIB). O Brasil tem o pior IDH dos 30 países analisados, embora se situe em 11º lugar no tamanho da carga tributaria. Com uma apropriação bem menor da renda dos seus cidadãos, o Estado uruguaio presta um serviço superior ao do Estado brasileiro. Da mesma forma a Argentina, com uma carga de 31,2% do PIB, oferece serviços que levaram a um IDH de 0,808. O Estado com maior retorno para a sociedade é a Austrália, que alcançou um IDH de 0,933 com uma carga tributária de apenas 27,3% do PIB. Ou seja, com muito menos impostos que o Brasil, aquele país gera resultados bem superiores. A Noruega, com uma das maiores cargas do mundo (40,8% do PIB), tem, em contrapartida, o maior IDH dos 30 países, com 0,944, muito acima do brasileiro.

O governo brasileiro quer aumentar mais ainda os impostos. Não para melhorar os serviços, mas para tapar buracos. Com razão, a sociedade espera, ao contrário, que o Estado utilize os enormes recursos que já são recolhidos pelo fisco para oferecer serviços semelhantes aos da Alemanha. Por que Alemanha? Porque é o país com uma carga tributária quase igual à brasileira (36,7% contra 35,04% do PIB). Ou, melhor ainda, que reduza o peso na sociedade para razoáveis 24,3% do PIB, como a Coréia do Sul, que consegue, com estes recursos, gerar um IDH de 0,891, superando em muito o do Brasil.