Na medida em que se aproximam as eleições, cresce a movimentação de Lula e Bolsonaro pelo voto útil, cada um no seu terreiro, tentando esvaziar candidaturas concorrentes. E a disputa autofágica das lideranças do centro-democrático, atrasando a definição das candidaturas, tem estimulado a migração de votos para os dois candidatos que lideram as pesquisas, consolidando a polarização. Dentro dos dois principais partidos do centro-democrático, PSDB e MDB, é grande a adesão, explicita ou não, de figuras destacadas pregando o voto útil e detonando as suas próprias candidaturas. Reagindo às pressões de Lula para a retirada da candidatura de Ciro Gomes, Carlos Lupi, presidente do PDT, foi taxativo: a defesa do voto útil promove, na verdade, “um voto inútil”, congela e reforça a polarização eleitoral que empobrece o debate político em torno de propostas alternativas para o desenvolvimento do Brasil.
Para além desta polarização eleitoral, que se reflete nas pesquisas, existe uma polarização política entre a extrema direita predatória do presidente Jair Bolsonaro e todas as forças democráticas e civilizatórias do Brasil. No entanto, dentro do aglomerado que resiste ao bolsonarismo existem divergências em relação à estratégia para tirar o Brasil do abismo e promover o desenvolvimento, principalmente no que diz respeito à política macroeconômica, ao papel do Estado e aos investimentos estruturadores de mudança. E estas visões diferentes precisam ser discutidas na campanha eleitoral. Tanto Lula e Ciro, quanto o candidato que pode emergir do entendimento entre PSDB e MDB, vão estar do mesmo lado, na crítica ao completo desmantelo do governo de Bolsonaro. Mas precisam ter espaços para apresentar ao eleitorado brasileiro diferentes opiniões e visões sobre a forma de lidar com os desafios econômicos, sociais e ambientais, sobre os caminhos para a reconstrução do Brasil arrasado pelo furacão de extrema direita. Como, por outro lado, são grandes as chances de Bolsonaro avançar para o segundo turno, todos devem se unir em torno do seu adversário, de preferência, negociando as grandes prioridades de governo. Para isso existem dois turnos. Todo voto é útil, porque expressa uma escolha política. Inútil é apostar na polarização eleitoral.
Na minha visão o artigo peca gravemente, logo no início, quando insinua e tenta deixar a candidatura Lula fora do campo centro-democrático “igualando” à candidatura antidemocrática da extrema direita.
Caro Antônio Jorge, entendemos que você interpretou mal o que está apresentado no editorial. Em nenhuma passagem tem alguma insinuação ou tentativa de “deixar a candidatura Lula fora do campo centro-democrático”. Não tem esta insinuação porque, na verdade, ele não faz parte deste campo. O centro-democrático é um conceito (pouco preciso, é verdade) para classificar os partidos e os políticos que se movem entre a direita e a esquerda do espectro político brasileiro. Todos os analistas políticos e o próprio Lula consideram que ele não se enquadra neste conceito porque seria de esquerda, uma esquerda meio atrasada, digamos, e que namora com governos autoritários desde que se declarem de esquerda (Venezuela e Nicarágua).
Por outro lado, em nenhuma passagem o editorial “iguala” a candidatura de Lula à da extrema direita. Quando dizemos que “existe uma polarização política entre a extrema direita predatória do presidente Jair Bolsonaro e todas as forças democráticas e civilizatórias do Brasil”, estamos situando Lula neste aglomerado anti-bolsonarista, destacando que, no entanto, existem divergências neste aglomerado em “relação à estratégia para tirar o Brasil do abismo”. Na verdade, a essência do editorial é a rejeição ao voto útil no primeiro turno precisamente para permitir a manifestação e discussão destas divergências internas às forças democráticas e civilizatórias.
O editorial ainda diz que, “tanto Lula e Ciro, quanto o candidato que pode emergir do entendimento entre PSDB e MDB, vão estar do mesmo lado, na crítica ao completo desmantelo do governo de Bolsonaro”. E que, num eventual segundo turno contra Bolsonaro, “todos devem se unir em torno do seu adversário” aquele que vai enfrentar o predador que, diga-se de passagem, nas condições atuais, parece ser mesmo Lula.
Por isso, Antônio Jorge, nos parece surpreendente que você tenha percebido nesse editorial uma tentativa de “igualar” Lula a Bolsonaro. Seríamos muito gratos se você voltasse a ler o texto porque achamos que iria mudar a sua impressão. E pudesse voltar a comentar o editorial manifestando a sua opinião sobre a tese central de rejeição do voto útil no primeiro turno das eleições presidenciais.
Os Editores
Concordo com o Editorial da “Será?”. O diálogo é imprescindivel para formar um consenso mínimo sobre como posseguir, na economia e na política. O que cada candidato propõe para o futufo? O que não sei é se ainda é possivel escapar da polarização. E o que sei é que se for apenas uma indignação contra a outra, sem um mínimo de pontos programáticos, o país pode ficar ingovernável, ou governável apenas segundo os interesses particulares e a miopia dos deputados do chamado “Centrão” , que ficam farejando em busca da posição que lhes proporcione mais dinheiro público. Por exemplo, como é que o eleitorado simplesmente permite que o Congresso queira aprovar a volta do quinquênio para a cúpula do funcionalismo público?