David Hulak.

Noel Nutels.

Hoje, dia 08 de julho fiquei me lembrando de Noel Nutels. Não por alguma efeméride a ele relativa. Foi por causa de Jair e de Barroso. Os vetos de um e a peleja do outro, este incorporando o espírito nuteliano. Ambos tratando dos povos indígenas.

O Congresso aprovou Lei tratando da proteção aos poucos brasileiros mesmo que ainda restam, daqueles que às centenas de milhares sempre cá estiveram.

Jair vetou que o governo deveria garantir “a oferta emergencial de leitos hospitalares e de terapia intensiva”, a compra de “ventiladores e máquinas de oxigenação sanguínea” e a obrigação de liberar verba emergencial para a saúde indígena e facilitar o acesso de indígenas e quilombolas ao auxílio emergencial.

Não satisfeito, Jair vetou também a obrigação de garantir o “acesso a água potável” e distribuição “materiais de higiene, limpeza e de desinfecção para as aldeias”. O governo ainda ficou liberado da obrigação de instalar internet nas aldeias e de distribuir cestas básicas. Para justificar os vetos, Jair argumentou que as medidas criavam despesas obrigatórias sem que se demonstrasse o “respectivo impacto orçamentário e financeiro, o que seria inconstitucional”.

Nutels, ao saber disso, indignado, foi procurar Rondon, lá onde eles habitam, instando-o a que na sua qualidade de Marechal fizesse algo a respeito. Disse-lhe o criador do Serviço de Proteção ao Índio e do Parque do Xingu que deveriam ficar na deles e confiar nas Instituições, pois o outro, isto é Barroso, no dia seguinte aos vetos mandou o governo de Jair adotar medidas para proteger os povos indígenas da pandemia de Covid-19.

O Ministro havia determinado que o governo de Jair adotasse políticas concretas de restrição do contágio dos povos indígenas, considerados em situação de vulnerabilidade extrema. O governo tem 30 dias para obedecer. Entre as medidas, estão: planejamento com a participação das comunidades; ações para contenção de invasores em reservas e criação de barreiras sanitárias no caso de indígenas em isolamento ou contato recente (aqueles que têm baixa compreensão do idioma e costumes).

Barroso também disse que o governo deve garantir acesso de todos os indígenas ao Subsistema Indígena de Saúde e elaboração de plano para enfrentamento e monitoramento da Covid-19. E mais, disse que, pela caneta de Barroso, seria obrigado a fornecer aos povos indígenas “acesso a água potável” e “distribuição gratuita de materiais de higiene, limpeza e de desinfecção para as aldeias”.

Não sei se Nutels ficou tranquilo. Ele sempre foi atuante, como médico que combateu a tuberculose e a saúde dos povos das flores e por seu respeito à cultura nativa, a nossa.

Tinha o maior respeito pela Vida e desde a primeira expedição Roncador-Xingu, em 1943, passou a alertar que os brasileiros. Brancos, negros e pardo, estavam iniciando um genocídio de indígenas.

Havia imaginado o que viria a ser um Serviço de Unidades Sanitárias Aéreas, com apoio da FAB, ainda quando era Ministro de Educação e Saúde o grande Capanema, mas isso só veio a ser efetivado pelo Ministro da Saúde de JK, o médico Maurício Campos de Medeiros.

Sim, naquelas épocas tínhamos Ministros.

Noel Nutels entendia de genocídios. Criança veio com seus pais imigrados da Ucrânia dos pogroms e aqui entendeu as desigualdades. Não se amargurou, no entanto. Abrasileirou-se passando por Maceió, Garanhuns e pelo Recife, onde virou médico. Viveu o Rio de Janeiro e mergulhou nas florestas dos povos indígenas. Combateu e hoje seria execrado nas redes do ódio como perigoso esquerdista.

Conheci-o quando Telma Weisz nos apresentou no Primeiro Baile Municipal do Recife, invenção de Aluízio Falcão quando Arraes era Prefeito. Depois, e durou pouco, bebi de sua alegria e humanismo por três vezes. E de sua nordestinidade, criada na Pensão de Dona Bertha, a sua mãe. Ali se ajuntavam Capiba e a Jazz Band Acadêmica e os pensionistas Suassuna, Saulo e João, Fernando Lobo e Rubem Braga, este, capixaba pernambucanizado.

Em um dos nossos breves encontros tentei puxar dele aquele tempo, me credenciando por ser filho de Anete, amiga de Bertha. Ele sorria e se concentrava em Capiba. Falou mais sobre Darcy Ribeiro. Foi bom também, pois aprendi muito sobre dignidade e compromisso.

Tenho fé que Noel tenha ido a Darcy, depois da conversa com Rondon. Que os três nos ajudem e aos povos da floresta, sobretudo a mim que, no Grupo de Risco, só posso assinar manifestos.

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