Será que a dimensão assustadora dos atuais escândalos da Petrobrás, ao atingirem altos escalões do governo e das empresas, ameaçarão as nossas instituições democráticas? O polêmico pensador Nassim Nicholas Taleb criou o conceito de antifragilidade para expressar os sistemas que, não apenas se recuperam nos choques e crises, mas, mais do que Fênix, ressurgem das cinzas, ganham força e se desenvolvem quando atacados. Com outras palavras, é o que afirmava Friedrich Nietzsche: “o que não me destrói, me fortalece”. Assim parecem as instituições democráticas brasileiras. A postura inabalável do juiz Joaquim Barbosa, ex-presidente do STF e relator do processo do chamado mensalão, amplia-se agora com as investigações da Polícia Federal, do Ministério Público e do juiz federal Sérgio Moro, que comanda a Operação Lava Jato sobre o escândalo da Petrobrás. A prisão de dirigentes do Partido dos Trabalhadores em 2008 e agora a detenção de dezenas de ex-diretores da Petrobrás e de altos executivos das principais empresas construtoras do Brasil, parece demonstrar que as instituições jurídicas e policiais, estão em pleno e perfeito funcionamento. Esta força de juízes, promotores de justiça e polícia federal na Operação Lava Jato, se alcançar, como tudo indica, dezenas de parlamentares e se aproximar perigosamente da Presidência da República, levará a desdobramentos capazes de provocar uma grave crise das instituições políticas, ameaçando a democracia brasileira? Ou, ao contrário, abrirá caminho para novos arranjos institucionais que ampliem e fortaleçam a democracia?
A conjunção perversa, entre Petrobras e as maiores empreiteiras do país, nos remete a uma cadeia no Paraná. Mas nos faz pensar também na teoria das elites. Afinal, estamos tratando com a fina flor da construção pesada e da burocracia petroleira.
A teoria das elites, construída por Vilfredo Pareto (1848/1923) e Gaetano Mosca (1858/1941), afirma que, em toda sociedade, há minoria que detém o poder. Poder econômico e poder político. O italiano, Mosca, dizia que a existência de governantes e governados decorria do fato de que os mais atentos se organizam. E exercem o poder na sociedade.
Por sua vez, o também italiano, Pareto, acentuava que era evidente a circulação das elites. Que estas têm seus ciclos. E que, decadentes, cedem espaço para que outros assumam seu lugar no poder.
Karl Manheim, sociólogo alemão, por volta dos anos de 1930, escreveu (em Liberdade, Poder e Planificação Democrática) que a existência de elites não impede a manutenção da democracia. Antes, a confirma na ação dos talentosos. E vice versa. A existência de elites não impede a vida democrática.
A experiência política contemporânea mostra que esses autores estavam certos nos seus entendimentos. É natural existir elites que se destacam no campo econômico e no campo político. Como no campo intelectual, no religioso, no esportivo. E é óbvio que essas elites coexistem com o regime democrático. Porque tomam parte ativa nele.
Este é o ponto. Qual o papel das elites num país como o Brasil? No momento em que tentamos construir uma nação menos desigual e mais decente?
Prezados,
Os acontecimentos têm levado à mídia a abandonar essa visão contaminada de PT , Petrolão e Presidência da República. Acredito que Será? está desatualizada. Leia então artigo de um tucano de alta plumagem que é mais transparente na sua análise do que o presente Editorial. Leiam:
“Nunca se roubou tão pouco Folha de São Paulo, 22.11.2014″
Ricardo Semler
Não sendo petista, e sim tucano, sinto-me à vontade para constatar que essa onda de prisões de executivos é um passo histórico para este país
Nossa empresa deixou de vender equipamentos para a Petrobras nos anos 70. Era impossível vender diretamente sem propina. Tentamos de novo nos anos 80, 90 e até recentemente. Em 40 anos de persistentes tentativas, nada feito.
Não há no mundo dos negócios quem não saiba disso. Nem qualquer um dos 86 mil honrados funcionários que nada ganham com a bandalheira da cúpula.
Os porcentuais caíram, foi só isso que mudou. Até em Paris sabia-se dos “cochons des dix pour cent”, os porquinhos que cobravam 10% por fora sobre a totalidade de importação de barris de petróleo em décadas passadas.
Agora tem gente fazendo passeata pela volta dos militares ao poder e uma elite escandalizada com os desvios na Petrobras. Santa hipocrisia. Onde estavam os envergonhados do país nas décadas em que houve evasão de R$ 1 trilhão –cem vezes mais do que o caso Petrobras– pelos empresários?
Virou moda fugir disso tudo para Miami, mas é justamente a turma de Miami que compra lá com dinheiro sonegado daqui. Que fingimento é esse?
Vejo as pessoas vociferarem contra os nordestinos que garantiram a vitória da presidente Dilma Rousseff. Garantir renda para quem sempre foi preterido no desenvolvimento deveria ser motivo de princípio e de orgulho para um bom brasileiro. Tanto faz o partido.
Não sendo petista, e sim tucano, com ficha orgulhosamente assinada por Franco Montoro, Mário Covas, José Serra e FHC, sinto-me à vontade para constatar que essa onda de prisões de executivos é um passo histórico para este país.
É ingênuo quem acha que poderia ter acontecido com qualquer presidente. Com bandalheiras vastamente maiores, nunca a Polícia Federal teria tido autonomia para prender corruptos cujos tentáculos levam ao próprio governo.
Votei pelo fim de um longo ciclo do PT, porque Dilma e o partido dela enfiaram os pés pelas mãos em termos de postura, aceite do sistema corrupto e políticas econômicas.
Mas Dilma agora lidera a todos nós, e preside o país num momento de muito orgulho e esperança. Deixemos de ser hipócritas e reconheçamos que estamos a andar à frente, e velozmente, neste quesito.
A coisa não para na Petrobras. Há dezenas de outras estatais com esqueletos parecidos no armário. É raro ganhar uma concessão ou construir uma estrada sem os tentáculos sórdidos das empresas bandidas.
O que muitos não sabem é que é igualmente difícil vender para muitas montadoras e incontáveis multinacionais sem antes dar propina para o diretor de compras.
É lógico que a defesa desses executivos presos vão entrar novamente com habeas corpus, vários deles serão soltos, mas o susto e o passo à frente está dado. Daqui não se volta atrás como país.
A turma global que monitora a corrupção estima que 0,8% do PIB brasileiro é roubado. Esse número já foi de 3,1%, e estimam ter sido na casa de 5% há poucas décadas. O roubo está caindo, mas como a represa da Cantareira, em São Paulo, está a desnudar o volume barrento.
Boa parte sempre foi gasta com os partidos que se alugam por dinheiro vivo, e votos que são comprados no Congresso há décadas. E são os grandes partidos que os brasileiros reconduzem desde sempre.
Cada um de nós tem um dedão na lama. Afinal, quem de nós não aceitou um pagamento sem recibo para médico, deu uma cervejinha para um guarda ou passou escritura de casa por um valor menor?
Deixemos de cinismo. O antídoto contra esse veneno sistêmico é homeopático. Deixemos instalar o processo de cura, que é do país, e não de um partido.
O lodo desse veneno pode ser diluído, sim, com muita determinação e serenidade, e sem arroubos de vergonha ou repugnância cínicas. Não sejamos o volume morto, não permitamos que o barro triunfe novamente. Ninguém precisa ser alertado, cada de nós sabe o que precisa fazer em vez de resmungar.”
Folha de S.Paulo – Opinião – Ricardo Semler: Nunca se roubou tão pouco – 21/11/2014
RICARDO SEMLER, 55, empresário, é sócio da Semco Part …
http://www1.folha.uol.com.br/op…nunca-se-roubou-tao-pouco.shtml
Obrigado à Gláucia Oliveira por ter transcrito este artigo do empresário Ricardo Semler, que põe os pingos nos ii.