Editorial

O Rombo.

O Rombo.

A metralhadora giratória de Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, provocou um arranhão na credibilidade do governo interino de Michel Temer e deixou os políticos em polvorosa. No mesmo dia, o governo anunciou medidas de ajuste fiscal para tomar a ofensiva política no terreno movediço da crise econômica e do desequilíbrio macroeconômico, precisamente onde se espera que demonstre competência para reverter o quadro dramático das finanças públicas. Conseguiu aprovar no Congresso a nova meta fiscal, na verdade uma autorização de gasto e de déficit, e apresentou proposta de reforma constitucional que define um teto para o gasto público. Apesar de comemorações da maioria dos economistas, algumas bem discretas, esta meta fiscal levanta uma incômoda pergunta: como um governo de austeridade, que deveria buscar superávit primário (gastar menos do que arrecada) para sanear as finanças públicas, pede autorização ao Congresso para gastar R$ 170,5 bilhões a mais do que pensa ter disponível neste ano, assumindo oficialmente um déficit primário de 2,7% do PIB? A explicação está no enorme buraco fiscal que recebeu constatando o desastre decorrente de despesas já comprometidas (incluindo nove bilhões de despesas atrasadas do PAC), muitas das quais intocáveis, e de uma reestimativa realista de receita ao longo do ano. Mas o governo falhou na comunicação. Mesmo antes de apresentar uma proposta de revisão da meta (pedindo autorização para o déficit assustador), o governo teria que expor claramente os dados e justificar à população, de forma detalhada e fundamentada, o dramático quadro fiscal que recebia com as amarras dos comprometimentos e as restrições para cortes e remanejamento.  Mesmo o rombo que o governo Dilma já tinha estimado nos seus últimos dias – R$ 96,6 bilhões – subestimava gastos e superestimava receita, escondendo a gravidade da crise fiscal e evidenciando que não seria cumprida a meta anterior. Por outro lado, o déficit será financiado com mais endividamento, acrescentando os R$ 170,5 bilhões de reais à rolagem da dívida que o governo só poderia resgatar se tivesse superávit primário (o déficit total – ou nominal – deve alcançar este ano quase 9% do PIB). O Brasil fica à espera de medidas estruturais e profundas, nem sempre fáceis de aprovação no Congresso, para saneamento das finanças públicas, especialmente a reforma da Previdência. Do contrário, estaremos jogando o futuro no lixo.