Quando milhões de democratas brasileiros, assustados com a pulsão ditatorial do presidente Jair Bolsonaro, mobilizam-se através de vários manifestos (e até das “torcidas organizadas”) em defesa das instituições democráticas, o ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva recusa-se, de forma arrogante, a participar do movimento. Num momento grave da história política do Brasil, ele prefere isolar-se com a sua bolha de fanáticos, apostando numa polarização com o bolsonarismo que, sem querer, ele ajuda a desmontar. O que explicaria esta decisão do líder petista? A primeira explicação, mais evidente, está implícita na sua simplória argumentação. Quando ele diz “não sou Maria que vai com as outras”, ele está reafirmando o velho lema do PT: “se a iniciativa não é minha, não presta, e eu vou criticar”. Tão arrogante quanto, é a visão de Lula e do seu partido, de que só eles são democratas. Como disse a presidente do PT, “Lula não assinou o manifesto porque FHC e Temer não são democratas”. Por trás da posição de Lula poderia existir, por outro lado, um fator emocional que o impede de compreender o momento político: o ressentimento pessoal com parte dos líderes políticos e intelectuais que assinaram os manifestos. Esse fator pode ter influenciado, mas tudo indica que o ex-presidente se baseia num cálculo político que, entretanto, reflete uma percepção totalmente ultrapassada da história recente do Brasil. A grande aposta de Lula é a continuidade da polarização política entre o lulismo e o bolsonarismo, polarização que, felizmente, ele está ajudando a acabar, quando se isola das diversas tendências democráticas e, até mesmo, de muitos dos seus simpatizantes, preocupados agora com a fúria ditatorial do bolsonarismo. Ele parece sonhar com uma improvável repetição, em 2022, da polarização que quase levava o seu partido de volta ao poder, polarização essa que, em última instância, ajudou a eleger Bolsonaro. Se o PT já não tinha proposta nem envergadura para ser a alternativa anti-bolsonarista, com o isolamento proposto por Lula, neste momento crítico da política nacional, esvazia-se o polo petista. E o PT afunda no ostracismo político. O Brasil ainda vai agradecer ao ex-presidente.
Postagens recentes
-
O ódio político no Brasilnov 15, 2024
-
Quem mentiu: Trump, Putin ou The Washington Post?nov 15, 2024
-
The Book is on The Tablenov 15, 2024
-
Todo mundo vai ao Circonov 15, 2024
-
Ainda Estou Aqui, O Filmenov 15, 2024
-
Última Páginanov 15, 2024
-
Almodóvar Desdramatiza A Mortenov 8, 2024
-
Trump 2.0 pode incendiar o planetanov 8, 2024
Assinar Newsletter
Assine nossa Newsletter e receba nossos artigos em seu e-mail.
comentários recentes
- José clasudio oliveira novembro 20, 2024
- helga hoffmann novembro 19, 2024
- Elson novembro 19, 2024
- Marceleuze Tavares novembro 18, 2024
- Keila Pitta Stefanelli novembro 16, 2024
Alcides Pires A Opinião da Semana Aécio Gomes de Matos camilo soares Caruaru Causos Paraibanos civilização Clemente Rosas David Hulak democracia Editorial Elimar Nascimento Elimar Pinheiro do Nascimento Eli S. Martins Encômio a SPP Estado Ester Aguiar Fernando da Mota Lima Fernando Dourado Fortunato Russo Neto Frederico Toscano freud Helga Hoffmann Ivanildo Sampaio Jorge Jatobá José Arlindo Soares José Paulo Cavalcanti Filho João Humberto Martorelli João Rego Lacan Livre pensar Luciano Oliveira Luiz Alfredo Raposo Luiz Otavio Cavalcanti Luiz Sérgio Henriques manifestação Marco Aurélio Nogueira Maurício Costa Romão Paulo Gustavo Política psicanálise recife Religião Sérgio C. Buarque Teresa Sales
No meu entender, a análise é perfeita!
Editorial em linha como a objetividade e o senso crítico da revista Será?
Sob uma perspectiva histórica, cada vez mais Lula apequena-se em relação à principal referência política (civil) do país – Vargas, assim como Bolsonaro em relação à liderança (militar) de Castelo Branco. Para os seguidores das seitas lulopetista e bolsonarista, contudo, a redenção do Brasil passa necessariamente pelos seus criadores. Que a anacrônica polarização de 2018 jamais se repita.
A aposta editorial me parece correta: Lula optou por seu rival. E não quer mesclar se na Frente. Velho costume hegemonico.
Só não entendo é o porque desse ladrão não estar – aliás, de onde nunca deveria ter saído! – atrás das grades…
Lula anda se autodestruindo há algum tempo… Cadê a velha raposa? Mas o que é assustador, de verdade, é que ainda continue existindo tanta gente que acha que o que houve em 2016 foi golpe, sem se dar conta que estão usando para o que aconteceu em 2016 a mesma palavra que usavam para classificar o golpe civil-militar de 31 de maio de 1964. Com isso boa parte da discussão política fica confusa, e se dificulta uma análise do que houve em 2016. Será que foi um erro das forças democráticas, naquele ano? E agora, está se encaminhando um golpe? E, juridicamente, mas também politicamente, como é que aqueles que foram contra o impeachment em 2016 agora são pelo impeachment do atual Presidente? Quais são as condições necessárias e suficientes para um golpe? E para um impeachment?