Embora não tenha sido o único fator, é inegável que o auxílio emergencial (AE) fornecido pelo governo para 67 milhões de pessoas (44% das famílias brasileiras) foi o principal responsável pelo aumento de popularidade do presidente Bolsonaro, turbinando seu cacife político.

O problema é que o AE só vigora até dezembro. Na iminência do abalo social e econômico que advirá da cessação do benefício, bem como da consequente perda de prestígio político, o presidente está buscando uma maneira de torná-lo permanente, com um valor de R$ 300 para um contingente aproximado de 20 milhões de pessoas.

A questão é: com que recursos? Como sói acontecer nestas garimpagens por escassas fontes de renda, a malfadada ideia da CPMF sempre emerge como alternativa.

A última tentativa de recriar a “provisória” contribuição foi da presidente Dilma Rousseff, objetivando arrecadar R$ 10 bilhões para ajudar a tapar o buraco do orçamento de 2016. Não vingou.

A história desse imposto no Brasil não recomenda ressuscitá-lo.

De fato, quando a CPMF foi criada em 1997 seus defensores enalteciam o caráter provisório da contribuição, o baixo percentual da alíquota (0,20%), a nobre destinação de seus resultados (para a saúde), e suas vantagens operacionais: tributo simples, não declaratório, de difícil sonegação, proporcional à movimentação financeira do contribuinte e de baixo custo (usa a rede bancária).

Quando foi extinta em 2007, dez anos depois, havia sido prorrogada quatro vezes, a alíquota quase dobrou, ficando em 0,38%, da destinação original à saúde passou pela previdência e fundo de combate à pobreza, afetou atividades que tinham vários elos na cadeia produtiva (pois é um tributo em cascata, cumulativo), estimulou a desintermediação financeira, já que incentivava a informalidade fiscal e, naturalmente, onerou o custo dos empréstimos bancários para pessoas físicas e jurídicas.

O resultado final do tributo ao setor público em termos de eficácia e retorno social não se sabe direito, exceto que enquanto vigeu injetou R$ 222 bilhões nos cofres do governo, a preços da época.

Ademais, a recriação da CPMF eleva, por definição, a carga tributária brasileira (nos arredores de 35% do PIB). Mas o problema não reside aí.

Dinamarca e Noruega têm duas das maiores cargas tributárias do mundo (45% e 43% do PIB, respectivamente), mas, em compensação, desfilam elevadíssimos índices de desenvolvimento humano (proxy para políticas públicas de qualidade). A questão, portanto, não é o peso do tributo, mas seu retorno à sociedade, a qualidade de sua destinação.

Sem contar com a CPMF o presidente Bolsonaro está em Zugzwang (ocorrência no jogo de xadrez em que o jogador da vez piora sua situação com qualquer lance que fizer):

(1) se usar contabilidade criativa para embutir o AE no bojo da Renda Cidadã, não emplaca; (2) se achar alguma fórmula não compensatória de pagar o AE, só pode ser através de aumento do déficit, já o maior da história, e azeita ainda mais sua engrenagem circular (aumento do déficit nominal, aumento do risco-Brasil, aumento do dólar, aumento da inflação, aumento dos juros, aumento da dívida, aumento do déficit nominal…) e, por último, (3) se não continuar com o AE