Ninguém sabe o que Joe Biden, presidente dos Estados Unidos, falou para Jair Bolsonaro no encontro privado durante a Cúpula das Américas. No encontro aberto, ele afirmou, de forma muito genérica, que o Brasil tinha instituições sólidas e “estava fazendo esforço para proteger a Amazônia”, muito estranho, considerando que o seu interlocutor, o presidente do Brasil, tem dedicado toda a vida a desmontar as instituições democráticas e a estimular as ações criminosas que ameaçam o ecossistema amazônico. Dois dias antes do encontro, Bolsonaro voltou a destilar sua ira contra o STF- Supremo Tribunal Federal, que acabara de confirmar a suspensão do mandato do deputado Fernando Francischini: “Eu que sou chefe das Forças Armadas. Nós não vamos fazer o papel de idiotas. Eu tenho a obrigação de agir”, afirmou Bolsonaro, ao mesmo tempo em que assumia e repetia a farsa das urnas viciadas que levou à cassação do mandato do deputado. Para completar a moldura desastrosa do encontro entre os dois presidentes, na mesma semana, o indigenista Bruno Pereira e o jornalista Dom Philips, do importante jornal inglês The Guardian, desapareceram na Amazônia, provavelmente assassinados pelo crime organizado (garimpeiros, madeireiros e pescadores ilegais, misturados com narcotraficantes) que atua livremente na região. Com a sua ignorância e ausência total de empatia, pouco antes do encontro com o presidente dos Estados Unidos, Bolsonaro chegou ao cinismo extremo de culpar as vítimas que, nas suas palavras, fizeram uma “aventura não recomendável”.

Quando cumprimentou Bolsonaro, o presidente Biden deve ter lembrado da simpatia do presidente brasileiro pelo seu rival Donald Trump, de quem copia as acusações de fraude eleitoral como ingrediente de preparação para um eventual golpe de Estado. Para reforçar a memória, no mesmo dia, uma comissão do Congresso Norte-americano confirmou que a invasão do Capitólio foi uma tentativa de golpe liderada por Trump. Depois que falou em público que a democracia “é o ingrediente essencial para o futuro”, o presidente Biden poderia ter advertido Bolsonaro de que não admitiria uma aventura golpista no Brasil. Mesmo que não tenha ouvido palavras contundentes de Biden, o presidente Bolsonaro deve saber que encontrará forte resistência internacional, particularmente dos Estados Unidos, a qualquer tentativa de quebra das regras democráticas no Brasil.