The Change money by Rembrant

The Change money by Rembrant

 

O respeitado cientista britânico Frederick Soddy (1877-1956), vencedor do Nobel de Química de 1921, apesar de formado nas ciências exatas, aventurou-se numa visão crítica do modelo de sistema econômico dos economistas. Fez isso em quatro livros, um dos quais, de 1926, com o sugestivo título de Wealth, Virtual Wealth and Debt (riqueza, riqueza virtual e dívida). Nele, propõe uma ciência econômica com raízes na física, em particular nas duras Leis da Termodinâmica. É usual a imagem do sistema econômico como um mecanismo. Contudo, raros economistas seguem essa metáfora até suas conclusões lógicas finais, como a de que, igual a qualquer máquina, a economia deve retirar energia de seu exterior, o meio ambiente. 

A primeira e a segunda leis da Termodinâmica proíbem aquilo que se conhece como moto perpétuo, situações em que máquinas criariam energia do nada ou a reciclariam infinitas vezes. Na verdade, como sistema isolado, sem entorno, o modelo de economia dos economistas, na percepção física, pareceria capaz de gerar riqueza ilimitadamente. Acontece que a riqueza real, essa que se apalpa (instalações, objetos, bens de consumo, etc.) possui natureza concreta. Já ativos financeiros (dinheiro, ações, derivativos, títulos) constituem abstrações. E são tais abstrações cujo crescimento não respeita limites.

A moeda (dólar, real, euro) e tudo aquilo que contém significado apenas por sua expressão em dinheiro (títulos de todo tipo) são símbolos que representam um direito do portador a certa forma de riqueza. A dívida, por sua parte, significa um direito do credor que depende da capacidade da economia de produzir riqueza no futuro, capacidade essa que dá ao portador do título a segurança de que seu direito será realizado. “A paixão dominante atual”, falava Soddy, “é converter riqueza em dívida”, no sentido de que o credor se livra de uma coisa que pode se destruir em troca de outra que é a garantia de que determinada quantia lhe será paga adiante. A moeda entra então para facilitar as transações. Os problemas vão surgir quando a riqueza e a dívida não são mantidas dentro de relação adequada. Que é exatamente o que acontece no mundo atual, haja vista que os ativos financeiros globais representam 26,3 vezes mais do que a economia referente a coisas concretas do planeta (há 95 anos, a economia real era maior), de cerca de 104 trilhões de dólares. Atualmente, há um giro financeiro diário no mundo (papéis trocados por papéis) de 7,5 trilhões de dólares. Se todos os credores de dívida quisessem convertê-las em coisas físicas, estouraria um colapso monetário global: a moeda, em cada país, viraria pó. Assustador, um tsunami. Porém, uma realidade possível.

A questão é que a economia de produção e consumo de coisas não pode crescer com a velocidade que se determinar. Segundo Soddy – e muita gente que já assimilou seus ensinamentos rigorosos, como os economistas ecológicos e a encíclica papal Laudato Si’ –, “não faz sentido contrapor permanentemente uma convenção humana absurda, como é o caso do espontâneo crescimento da dívida [juros compostos], à lei natural do espontâneo decrescimento da riqueza [entropia; Segunda Lei da Termodinâmica]”. De fato, o montante de riqueza que uma economia pode gerar é limitado tanto pelo montante de energia de baixa entropia que ela pode retirar de seu meio ambiente quanto pelo montante de efluentes de alta entropia da economia que o ambiente é capaz de absorver. A dívida em dinheiro, sendo algo imaginário, uma convenção no papel, não está sujeita a tais limites naturais. Pode-se expandir de forma ilimitada, com taxas mortíferas que enriquecem de modo concentrador a minoria parasitária ínfima dos que controlam o sistema. Passa-lhe ilusão de riqueza e põe em risco o bem-estar e a vida no planeta. Uma situação absolutamente insustentável.