No grupo de países do BRICS, a democracia não tem nenhuma relevância como fator de organização, apesar da declaração final do encontro de alto nível realizado esta semana, na África do Sul. “Nós reafirmamos nosso compromisso com o espírito do BRICS de respeito e entendimento mútuo, soberania equânime, solidariedade, democracia, abertura, inclusão, forte colaboração e consenso” (em tradução livre). Declaração estranha, pelo menos no que trata de democracia, considerando que dois dos cinco membros atuais (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) são regimes autoritários, nomeadamente China e Rússia, ditaduras abertas ou disfarçadas, com limitações graves da liberdade de manifestação e de imprensa, eleições simuladas e violações e abusos das liberdades civis. Segundo a classificação da EIU – The Economist Intelligence Unit (Democracy index), os outros três países que formam, atualmente, o agrupamento – Brasil, Índia e África do Sul – seriam democracias imperfeitas. 

O pouco compromisso do BRICS com a democracia se manifesta ainda na decisão tomada em Johanesburgo de iniciar o processo de adesão de mais seis países – Argentina, Egito, Etiópia, Arábia Saudita, Irã e Emirados Árabes Unidos. Com exceção da Argentina, cuja adesão ainda depende do resultado das próximas eleições no país (dois dos candidatos são explicitamente contrários ao grupo do BRICS), os outros cinco candidatos constituem regimes autoritários e monarquias religiosas. Desta forma, quando concluída esta ampliação do grupo para onze membros, o BRICS seria formado por sete países com regimes autoritários e apenas quatro com democracias imperfeitas. 

Do ponto de vista econômico, o BRICS é um agrupamento de grande dimensão e enorme potencial de mercado, exercendo uma força de atração de países de médio ou baixo desenvolvimento, principalmente pela fonte de financiamento do NDB – New Development Bank. Mais de 40 países já teriam manifestado interesse em participar do grupo, principalmente da África e da América Latina, indicando que estaria se formando um contraponto ao G7 e à hegemonia mundial dos Estados Unidos, sob a liderança incontestável da China, a maior economia do bloco (70% do PIB-Produto Interno Bruto do bloco e 69% das transações comerciais entre os seus membros). Através do BRICS, a China abre o caminho para a ampliação da sua influência econômica e comercial no mundo, estratégia legítima de ocupação de espaços no processo de globalização. Ao Brasil interessa a relação com o seu maior parceiro comercial e eventuais acordos comerciais com os outros países do bloco. Mas os discursos e as declarações do presidente Lula da Silva vão muito além do interesse econômico, sinalizando para um inadequado alinhamento político e ideológico com um bloco de países autocráticos.