Protestas en Caracas contra la reelección de Nicolás Maduro, 2024 Wikimedia Commons

Protestas en Caracas contra la reelección de Nicolás Maduro, 2024 Wikimedia Commons

Novamente o governo brasileiro – e um governo do Partido dos Trabalhadores (PT) – se vê no dilema entre o apoio ao regime democrático ou o apoio a um regime aliado. No que concerne à Venezuela, esse impasse não é uma questão meramente ideológica. Muito pelo contrário! Estão em jogo muitos elementos relevantes que são atinentes às relações internacionais contemporâneas.

Juntamente com a Colômbia, o Brasil é o principal destino dos venezuelanos que abandonam o seu país (i). Sobretudo, em razão da facilidade proporcionada pela imensa fronteira terrestre que liga os dois países (ii) – na qual está inserida a região de Essequibo, em litígio com a Guiana. Além disso, embora suspenso desde 2016, a Venezuela não deixou de ser membro do Mercosul (iii).

O equilíbrio geopolítico da América Latina, evidentemente, passa pela questão venezuelana. Não é possível, a nenhum dos atores estatais, simplesmente ignorar a questão. Decerto os danos gerados seriam ainda mais graves. O Brasil e a Colômbia já sentem o peso da pressão demográfica advinda da imigração venezuelana. Não será esse o momento de chamar as autoridades venezuelanas a assumir as suas responsabilidades perante a comunidade internacional?

No domingo, dia 28 de julho, autoridades venezuelanas comprometeram o processo eleitoral, ao ter desrespeitado a liturgia do rito e convertê-lo em uma reles caricatura. Não foi por falta de engajamento popular. Muito pelo contrário. As manobras arquitetadas certamente não surpreendem a nenhum analista, pois já não são novidades por aquelas paragens.

Uma farsa não é montada de uma hora para outra! A querela antidemocrática na Venezuela vem de longa data, não se tratando de fato novo. No meu entendimento, o autoritarismo é um elemento constitutivo do chavismo. Não custa lembrar que o próprio Chávez liderou uma tentativa de golpe de Estado – frustrada – contra o então presidente Carlos Andrés Perez.

Na atual conjuntura nenhum analista pode alegar surpresa, pois os sinais foram dados pelo regime chavista e só não os viu quem não quis. Sob a liderança de Maduro, o regime perdeu qualquer sutileza. Maria Corina teve a sua candidatura impedida. Sua substituta inicial, Corina Yoris, sequer pode registrar-se. Logo, Edmundo Gonzalez foi uma cartada de última hora.

Estando no poder desde 2013, quando assumiu a chefia do executivo federal, após a morte de Hugo Chávez, Nicolás Maduro tem acumulado polêmicas e acusações em torno de si, em virtude de sua forma autoritária de governar. Repressão a qualquer protesto é a regra básica em sua cartilha. Embora o país seja rico em petróleo, a pobreza aumentou entre os venezuelanos.

As repercussões internacionais não foram boas para Maduro, exceto no caso de Lula, que tratou de suavizar o problema. Disse ele em entrevista: “Como vai resolver essa briga? Apresenta a ata. Se a ata tiver dúvida entre oposição e situação, a oposição entra com recurso e vai esperar na Justiça andar o processo. E aí vai ter uma decisão, que a gente tem que acatar. Estou convencido de que é um processo normal, tranquilo […] Não tem nada de grave, nada assustador.”

O que o presidente Lula não considerou – e isso lança suspeitas sobre a suas reais intenções no caso – é que a justiça da Venezuela já não goza da devida independência em relação ao governo federal de seu país. Em sua primeira entrevista sobre as eleições venezuelanas, dada à TV Centro América de Cuiabá/MS, afiliada da TV Globo, o mandatário prosseguiu: “Eu vejo a imprensa brasileira tratando como se fosse a terceira guerra mundial. Não tem nada de anormal. Teve uma eleição. Teve uma pessoa que disse que teve 51%. Teve uma pessoa que diz que teve quarenta e pouco por cento. Um concorda, outro não. Entra na Justiça, a Justiça faz.”

No mesmo dia Lula teve uma conversa por telefone com Joe Biden, presidente dos EUA, a respeito da crise venezuelana. No dia 1º de agosto o Secretário de Estado norte-americano Antony Blinken divulgou um comunicado de imprensa defendendo a vitória da oposição a Nicolás Maduro, considerando a existência de “evidências esmagadoras”, de que não deixavam dúvidas para os EUA de que Edmundo González foi o vencedor do pleito, tendo obtido “a maioria dos votos”.

A tomada de posição dos EUA levou a questão a outro patamar, tensionando as relações entre os demais atores estatais regionais. O movimento norte-americano explicitou a cisão entre os apoiadores e os opositores do regime chavista, deixando o Brasil em uma posição desagradável, senão vexatória. Ora, o desejo de protagonismo da diplomacia brasileira na cena internacional não é nenhum segredo. 

Portanto, o posicionamento do Brasil no cenário internacional deve ser convergente com a sua política interna, isto é, o respeito ao imperativo democrático. Muitos atores, dentro e fora do país, têm externado a sua desconfiança sobre as reais intenções do governo brasileiro – e do presidente Lula em particular – em relação ao regime chavista. Há precedentes importantes para isso! Pragmático e democrata espera-se que faça a escolha para a qual foi eleito, isto é, ir contra o autoritarismo e não fazer qualquer tipo de aliança com regimes autocratas. Vamos aguardar os desdobramentos…