É uma quase ficção. E o autor não esconde este fato, pois está na capa. Abaixo do título – Jogados ao mar – está escrito ficção, em que o i é um ponto de interrogação à espanhola, invertido. Portanto, uma pergunta: será que é uma ficção ou um descrição? De fato, o autor é de uma honestidade brutal. Diz no livro o que pensa sobre o humano, a sociedade e, sobretudo, a desigualdade que o incomoda sobremaneira e denuncia há anos. E sem pudor. Em um texto direto, cru. Sem sofisticação, tendo como personagem central um jornalista de casos policiais. A descrição de um real aparentemente invisível em forma de narrativa ficcional.
Li-o de um fôlego. E, ao final, fiquei pensando: este não é um livro para guardar nas minhas estantes. É um livro para circular. E foi o que fiz. Pedi desculpas ao autor que me o havia presenteado, dizendo-lhe que dispensava dedicatória (ele me enviou o livro junto com outros pelo correio). E, na primeira oportunidade, presenteei-o a um casal de amigos.
É um livro que nos incomoda. Perturba. E não deve deixar ninguém calado. Prevejo que as reações sejam muito diferentes e mesmo díspares e contraditórias. Alguns dirão que é um panfleto. Uma porcaria. Outros dirão que é um livro corajoso, verdadeiro, que escancara a mediocridade e o cinismo da elite brasileira, incluindo um largo segmento da classe média. Alguns o criticarão pela ausência de uma escrita não sofisticada, esquecendo que o autor, está dito no livro, é um jovem jornalista. O mesmo que sai para a periferia do Distrito Federal para escrever sobre um menino desaparecido. E a busca por descobrir o mistério do desaparecimento de Pedro Ivo, o conduz a descoberta de algo que muitos já sabiam, mas não o tinham percebido da forma dura que é apresentada. E outros ficarão estupefatos, porque nunca haviam pensado a respeito. E cobrirão o livro e, sobretudo seu autor, de elogios.
Mas, haverá aqueles que jogarão o livro fora antes de concluir a leitura. Perderão a melhor parte. Aquela em que uma personagem explica porque está presa por envolvimento no tráfico. Presa, e diz que está feliz, porque foi por uma boa causa. Sem qualquer arrependimento. Faria tudo de novo. O que levará alguns a dizer que o autor está estimulando o crime.
Em meio a tantos impropérios e elogios, o livro deve seguir uma bela trajetória. Salvo se a nossa sociedade estiver tão anestesiada que não se importe por mais nada, salvo pela sua vida mesquinha, construída por banalidades e Fake News. Sinal de que nossa sociedade se envolveu em uma bolha, distante da realidade dos fatos. E só nos resta ter pena, e esperar que um dia ela estoure.
Não li o livro que o professor Elimar indica, mas por sua narrativa creio que ele retrata uma história muito comum em minha região, próxima a fronteira com o Paraguai, em que tantas mulas do tráfico, em geral garotas muito jovens, são jogadas ao mar, empurradas por uma tempestade de circustâncias. Enquanto isso, pessoas de bem continuam incendiando o pantanal e indo a missa todos os domingos.