Novamente o governo brasileiro – e um governo do Partido dos Trabalhadores (PT) – se vê no dilema entre o apoio ao regime democrático ou o apoio a um regime aliado. No que concerne à Venezuela, esse impasse não é uma questão meramente ideológica. Muito pelo contrário! Estão em jogo muitos elementos relevantes que são atinentes às relações internacionais contemporâneas.
Juntamente com a Colômbia, o Brasil é o principal destino dos venezuelanos que abandonam o seu país (i). Sobretudo, em razão da facilidade proporcionada pela imensa fronteira terrestre que liga os dois países (ii) – na qual está inserida a região de Essequibo, em litígio com a Guiana. Além disso, embora suspenso desde 2016, a Venezuela não deixou de ser membro do Mercosul (iii).
O equilíbrio geopolítico da América Latina, evidentemente, passa pela questão venezuelana. Não é possível, a nenhum dos atores estatais, simplesmente ignorar a questão. Decerto os danos gerados seriam ainda mais graves. O Brasil e a Colômbia já sentem o peso da pressão demográfica advinda da imigração venezuelana. Não será esse o momento de chamar as autoridades venezuelanas a assumir as suas responsabilidades perante a comunidade internacional?
No domingo, dia 28 de julho, autoridades venezuelanas comprometeram o processo eleitoral, ao ter desrespeitado a liturgia do rito e convertê-lo em uma reles caricatura. Não foi por falta de engajamento popular. Muito pelo contrário. As manobras arquitetadas certamente não surpreendem a nenhum analista, pois já não são novidades por aquelas paragens.
Uma farsa não é montada de uma hora para outra! A querela antidemocrática na Venezuela vem de longa data, não se tratando de fato novo. No meu entendimento, o autoritarismo é um elemento constitutivo do chavismo. Não custa lembrar que o próprio Chávez liderou uma tentativa de golpe de Estado – frustrada – contra o então presidente Carlos Andrés Perez.
Na atual conjuntura nenhum analista pode alegar surpresa, pois os sinais foram dados pelo regime chavista e só não os viu quem não quis. Sob a liderança de Maduro, o regime perdeu qualquer sutileza. Maria Corina teve a sua candidatura impedida. Sua substituta inicial, Corina Yoris, sequer pode registrar-se. Logo, Edmundo Gonzalez foi uma cartada de última hora.
Estando no poder desde 2013, quando assumiu a chefia do executivo federal, após a morte de Hugo Chávez, Nicolás Maduro tem acumulado polêmicas e acusações em torno de si, em virtude de sua forma autoritária de governar. Repressão a qualquer protesto é a regra básica em sua cartilha. Embora o país seja rico em petróleo, a pobreza aumentou entre os venezuelanos.
As repercussões internacionais não foram boas para Maduro, exceto no caso de Lula, que tratou de suavizar o problema. Disse ele em entrevista: “Como vai resolver essa briga? Apresenta a ata. Se a ata tiver dúvida entre oposição e situação, a oposição entra com recurso e vai esperar na Justiça andar o processo. E aí vai ter uma decisão, que a gente tem que acatar. Estou convencido de que é um processo normal, tranquilo […] Não tem nada de grave, nada assustador.”
O que o presidente Lula não considerou – e isso lança suspeitas sobre a suas reais intenções no caso – é que a justiça da Venezuela já não goza da devida independência em relação ao governo federal de seu país. Em sua primeira entrevista sobre as eleições venezuelanas, dada à TV Centro América de Cuiabá/MS, afiliada da TV Globo, o mandatário prosseguiu: “Eu vejo a imprensa brasileira tratando como se fosse a terceira guerra mundial. Não tem nada de anormal. Teve uma eleição. Teve uma pessoa que disse que teve 51%. Teve uma pessoa que diz que teve quarenta e pouco por cento. Um concorda, outro não. Entra na Justiça, a Justiça faz.”
No mesmo dia Lula teve uma conversa por telefone com Joe Biden, presidente dos EUA, a respeito da crise venezuelana. No dia 1º de agosto o Secretário de Estado norte-americano Antony Blinken divulgou um comunicado de imprensa defendendo a vitória da oposição a Nicolás Maduro, considerando a existência de “evidências esmagadoras”, de que não deixavam dúvidas para os EUA de que Edmundo González foi o vencedor do pleito, tendo obtido “a maioria dos votos”.
A tomada de posição dos EUA levou a questão a outro patamar, tensionando as relações entre os demais atores estatais regionais. O movimento norte-americano explicitou a cisão entre os apoiadores e os opositores do regime chavista, deixando o Brasil em uma posição desagradável, senão vexatória. Ora, o desejo de protagonismo da diplomacia brasileira na cena internacional não é nenhum segredo.
Portanto, o posicionamento do Brasil no cenário internacional deve ser convergente com a sua política interna, isto é, o respeito ao imperativo democrático. Muitos atores, dentro e fora do país, têm externado a sua desconfiança sobre as reais intenções do governo brasileiro – e do presidente Lula em particular – em relação ao regime chavista. Há precedentes importantes para isso! Pragmático e democrata espera-se que faça a escolha para a qual foi eleito, isto é, ir contra o autoritarismo e não fazer qualquer tipo de aliança com regimes autocratas. Vamos aguardar os desdobramentos…
OEA? Carter? ONU? Blinken? “Considerando a existência de “evidências esmagadoras”? Aquele juiz que vai dar mais quantos minutos de prorrogação até que o time Mais Simpático a ele marque aquele golzinho besta? Os Estados Unidos atuando sobre a Soberania da Venezuela? (ainda existe esse conceito, Soberania, em algum lugar da análise política brasileira?) Esses EUA nao seriam aquele mesmo país que impuseram mais de 900 sanções econômicas a todo um povo cujo governo nao faz o que eles querem? Aqueles EUA, daqueles quantos golpes na história…? Vale questionar o TSE brasileiro, se fascista nao aceitar As Atas nossas, nas próximas eleições? Deixa pra lá. Que alguma boa pergunta, oxalá consigamos, valha por mais que 900 respostas. Nem bajular Maduro, nem querer ser mais nem saber mais do que o próprio povo venezuelano. Sim, soberano. Ou só se for soberania do jeito que a gente pensa que deve ser? Aquele abraço.