Sérgio C. Buarque >

 

Toda virada do ano, a imprensa se enche de previsões sobre o ano que se inicia, videntes de todas as seitas e credos antecipando o que deve acontecer na política, na economia, na natureza e até na vida privada das celebridades. Sopro de guias espirituais, leitura dos astros, interpretação das cartas ou das pedras do tarô, as fontes são muitas e as previsões cheias de imprecisões e vagas mensagens para eludir as críticas e enganar os fiéis, do tipo “algumas pessoas vão se sobressair neste ano”, “o ano vai ser muito quente”, ou “alguns ministros de Dilma vão cair”.

Existe um ditado árabe que diz: “Aquele que prevê o futuro, mente mesmo quando diz a verdade”; afirmar o que vai acontecer no futuro é uma mentira pelo simples fato de antecipar o que é incerto e indeterminado, resultado de um jogo complexo de múltiplos fatores em interações – incluindo a ação dos homens – impossíveis de prever. Assim, mesmo que no futuro se confirme o previsto, no momento em que foi enunciado constituía uma grande farsa.

O que é possível e lícito é especular sobre tendências e hipóteses de desdobramentos futuros dos fatores determinantes, analisando as informações, refletindo sobre as circunstâncias como fazem os próprios videntes embora dizendo tratar-se de uma mensagem espiritual. Mesmo sem aceitar o poder de influência dos astros sobre a sociedade e as pessoas, parece aceitável o trabalho de alguns astrólogos que, como Eduardo Maia, afirma não fazer previsões e apenas indicar tendências utilizando recurso psicoterápico.

Mas a imprensa está cheia de previsões afirmativas baseadas em fatores espirituais sobre eventos do mundo cotidiano, muitas vezes dizendo o que parece óbvio. Em entrevista à revista Isto É da primeira semana do ano, o “médium” Robério Ogum questiona a expectativa da presidente Dilma de um “pibão” em 2013 afirmando que “seria muito pretencioso, diante de todas as circunstâncias (grifo meu), cravar que teremos um pibão, que só a gente vai crescer. Como espiritualista, eu não consigo enxergar isso. Não tem Dilma ou Barak Obama com força suficiente para atenuar o que vem em 2013”. Esta análise das circunstâncias econômicas faz parte de todo exercício de reflexão de economistas e cientistas políticos mundo afora, fundamentando suas expectativas nas informações e dados reais e concretos e sem necessidade de uma hipotética inspiração mágica de cartas, guias ou pedras.

Para não falar do ridículo de algumas das previsões como a de que o “Brasil será campeão (da Copa das Confederações) com certa facilidade”, o vidente Robério de Ogum ainda ousa prever mortes de personalidades: neste ano de 2013, diz ele na citada entrevista, “vamos perder um grande ex-jogador de futebol, outros dois que foram campeões do mundo, duas das maiores atrizes da televisão, um grande homem da comunicação esportiva e um grande cantor de música popular”. Ah! Ele sabe inclusive quem são as vítimas e só não diz os nomes por temer processos jurídicos. Pode?

Para não duvidarem do seu poder de previsão, o vidente lembra que, no ano passado previu a queda do ex-treinador Mano Menezes; e ele caiu. Precisava de algum guia espiritual para antecipar a probabilidade este evento? Vale lembrar o provérbio árabe: se ele afirmou categoricamente que Mano Menezes seria demitido, ele mentiu embora o fato tenha se confirmado. Os fatores que o levaram à previsão estavam à vista de todo mundo mas poderiam ter sido evitados por vários outros fenômenos não previsíveis mas possíveis, como a conquista das Olimpíadas. Podia ter conquistado? Claro que podia; especialmente no futebol, a força do acaso e imprevisto é muito grande e ninguém poderia afirmar o contrário como parece uma leviandade afirmar que o Brasil vai ser campeão da Copa das Confederações.

Folclore à parte, a divulgação destas previsões mágicas do futuro é um desserviço à sociedade, conferindo credibilidade à farsa da previsão, com o risco de gerar temores ou conformismo nos cidadãos crédulos, e alimentar um já florescente “mercado das almas” para os videntes de todas as linhas.

 Sérgio C. Buarque