Não falou da guerra na Síria, não tratou da espionagem americana nem comentou as intenções, pacíficas ou militaristas, da pesquisa nuclear do Irã. Não. O presidente do Uruguai, José Mujica, não analisou os conflitos políticos, econômicos, militares ou religiosos que sacodem o planeta. No seu discurso na 68ª Assembleia Geral da ONU, o presidente Mujica discutiu os destinos mais profundos da humanidade e, de forma poética e filosófica, questionou os pilares da civilização. “Parece que nascemos apenas para consumir e consumir e, quando não podemos, carregamos a frustração, a pobreza e até a auto-exclusão”. Como se a felicidade pudesse ser comprada nos objetos. Ele veio de um pequeno país do Sul, sem poder político ou militar. Porém com a força moral da sua coerência política e da sua vida pessoal sem esbanjamento e ostentação, todo o contrário das estruturas dos governos mundo afora. Tudo indica que o discurso de José Mujica não teve impacto naquele plenário das Nações Unidas, com governantes envolvidos nos conflitos e emergências do momento e insensíveis aos desafios do futuro. Contudo, suas palavras são proféticas e ficam como uma advertência para a história. “Nossa civilização montou um desafio mentiroso e, assim como vamos, não é possível satisfazer esse sentido de esbanjamento que se deu à vida” (….) “Prometemos uma vida de esbanjamento, e, no fundo, constitui uma conta regressiva contra a natureza, contra a humanidade no futuro. Civilização contra a simplicidade, contra a sobriedade, contra todos os ciclos naturais” (….) “O pior: civilização contra a liberdade que supõe ter tempo para viver as relações humanas, as únicas que transcendem: o amor, a amizade, aventura, solidariedade, família. Civilização contra tempo livre que não é pago, que não se pode comprar, e que nos permite contemplar e esquadrinhar o cenário da natureza”.

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