Depois da farra irresponsável que viveu o Brasil nos últimos dois/três anos, afundamos agora numa grande ressaca. Este é o preço que se paga pela alegria da festa quando esta chega ao fim. E acabou porque faltou cerveja, os tira-gostos sumiram e o dinheiro mingou. A crise econômica que estamos enfrentando agora é o resultado direto dos erros e irresponsabilidades cometidos pelo governo no passado recente. Os brasileiros pareciam felizes com a farra e, descuidados dos limites da economia, mergulharam no consumo, os pobres e a classe média contornando a demanda reprimida e os ricos torrando dinheiro em Miami. O modelo centrado no consumo, no estímulo ao gasto, com preços das estatais contidos artificialmente, com elevação dos gastos correntes públicos e crédito barato era insustentável. Resultado: déficit fiscal, pressões inflacionárias mesmo contidas artificialmente (prejudicando o desempenho das estatais que quase leva à falência da Petrobrás e da Eletrobrás) e endividamento das famílias. Para não perder as eleições, o governo mascarou, maquiou e, principalmente, escondeu as más notícias, represando os sinais da resseca. A festa acabou e agora o garçom chegou com a conta. Soltou os preços reprimidos dos produtos administrados (combustível e energia), apertou os gastos públicos e elevou os juros, combinação explosiva que empurra a economia para baixo. Tem alternativa? Não. Estamos pagando com a ressaca pela farra de ontem. Não se deve criticar o governo pelo ajuste fiscal e sim pelos equívocos anteriores que levaram à crise e à necessidade de mudança de rumo. É duro, mas necessário para evitar o descontrole da inflação que desorganiza mais ainda a economia e aumenta a corrosão do poder de compra das famílias, principalmente dos pobres.
Curto e claro. A dura verdade. Muito bem escrito.
Certeiro e fulminante como um tiro na testa.
Alguém se arrisca a contestar, ressalvar ou contemporizar?
Que se apresente.
E agora José? A festa acabou …
É quase impossível refutar quaisquer dos pontos levantados pelo editorial. Quando adolescente, adorava jogar xadrez. Sempre que a situação ficava feia, eu me perguntava: se Bobby Fisher estivesse aqui, o que ele faria? Ou bem esperaria que o adversário cometesse um erro crasso – inverossímil no grande cenário – ou, no máximo, ele conseguiria travar o jogo e descolar um empate. O mesmo nos perguntamos hoje. Ora, quando Levy, o ministro-fiador, fala de tijolo a tijolo, está fazendo uma exortação à moda de Churchill para que não acreditemos na retomada da farra. E que nos preparemos para tempos de suor e lágrimas.
Mas a história também se lê nas pequenas coisas. Às 18:15 dessa aprazível sexta-feira paulistana, num pequeno mercado de iguarias dos Jardins, um dos homens mais representativos do País – não só pela alta função que ocupa, mas pelo preparo e honradez – fazia compras. Meticuloso, colocava óculos para ler os rótulos dos produtos invariavelmente “light”, escolhidos pelos componentes nutritivos. Na fila do caixa, fiquei atrás dele e vi-o pagar R$215,82 por suco de soja, linhaça, aveia, torrada sueca “light”, cogumelos brancos, “nirá”, pão de oito grãos, dentes de alho, duas laranjas grandes entre outras coisas. O que quero dizer com isso? Que apesar de ter tido um dia 5 de junho ingrato, ele estava ali. Digno e altivo.
Ora, não é fácil o sujeito ver seus pares de governo ser vaiados em restaurantes – Haddad, Padilha e Mantega – e se expor como cidadão a um lugar onde, se identificado, suscitaria reações negativas dos exaltados. Ponto para ele. Em segundo, a alimentação austera atesta que pretende viver muito; logo que não acredita no dilúvio inevitável. Terceiro, tem fé no que faz, apesar de ter visto hoje seus critérios questionados e mexidos. Quarto, pagou com cartão de crédito – modalidade que gente de juízo evita. Quinto, tinha cédulas de dois reais bem acondicionadas na carteira, o que indica que a moeda não caiu em descrédito total. Sexto e último, não havia ali uma gota de bebida para desligar no fim de semana.
Saindo do mexerico de costumes e indo para uma seara cara aos leitores dessa revista, o carrinho desse homem austero me remeteu ao que me disse certa feita um terapeuta. Quando lhe consultei sobre aceitar ou não uma função pública que muito me envaideceria, mas que me forçaria a fazer concessões a padrões de poder, e não só aos de resultados – ótica da iniciativa privada -, Dr. Simões saiu do mutismo e foi sentencioso. Só um monossílabo poderia iluminar minha dúvida: fé. Ou eu a tinha ou não. E deu por encerrada a sessão. Não aceitei o cargo oferecido. Moral da história: sim, tem gente de alta octanagem que se comporta como se ainda tivéssemos um amanhã. Fica, portanto, a reflexão otimista para desopilar.
Quando chegou minha vez, tirei metade das cervejas que levava no carrinho. Quero viver para ver a virada.
Será?
Fernando
UM ARTIGO, (EDITORIAL), QUE SÓ TEMOS QUE APLAUDIR, ATÉ PELA SIMPLICIDADE DE EXPOR A VERDADE DOS FATOS.