Editorial

Passeata em Boa Viagem, Recife no dia 13 de março de 2016 - por João Rego.

Passeata em Boa Viagem, Recife no dia 13 de março de 2016 – por João Rego.

A velocidade dos acontecimentos políticos no Brasil ao longo desta semana levou a “Revista Será?” a elaborar três editoriais diferentes, alterando o enfoque a cada fato novo. O Conselho Editorial decidiu publicar os três, na ordem da data em que foram redigidos.

Novidade na política brasileira

15/03/2016

O movimento “Vem pra rua”, que liderou as grandes manifestações do dia 13 março em mais de 200 cidades do país, é o que tem de novo e promissor na política brasileira, contaminada pela degradação em quase todos os entes e níveis da República: na União, com a incompetência e irresponsabilidade do governo Dilma, e no Congresso, com a mediocridade e mesquinharia dos interesses privados dos chamados “homens públicos”, para não falar na corrupção que domina a política. Lideranças jovens, munidas das avançadas tecnologias da comunicação, sem estrutura e sem vínculo partidário, conseguiram mobilizar em torno de três milhões de pessoas, na maior manifestação de rua da nossa história, captando com competência e inteligência a enorme insatisfação da população brasileira com a crise econômica e com o desgoverno. E, evidentemente, contra a presidente da República, o ex-presidente Lula e o seu partido, responsáveis pela rápida deterioração econômica e política do país e pela tentativa de polarização e demonização dos críticos e opositores. Trazer essa multidão para as ruas sem registrar nenhum distúrbio (nada dos atos de vandalismo de outras passeatas do passado) e com bandeiras convergentes e objetivas foi uma demonstração de maturidade e espírito democrático dos brasileiros e, particularmente, dos organizadores do evento (ações grosseiras e reacionárias foram casos isolados e irrelevantes). Para isso contribuiu a orientação divulgada nas redes sociais pelo movimento “Vem pra rua”, pedindo um comportamento democrático e respeitoso dos participantes e proibindo uso de bandeiras de partidos e organizações políticas para evitar conflitos: “Bandeiras de partidos políticos e outras organizações ligadas aos mesmos não serão permitidas. Esta marcha é do povo e ninguém a utilizará para autopromoção”. E o PT teve o bom senso de não sair às ruas, evitando possíveis confrontos. O Brasil está mais maduro.

Agora é tarde!

16/03/2016

Foi uma bela jogada: deslocou o Rei para uma casa de onde pode dar proteção à Rainha e, ao mesmo tempo, afastou-o provisoriamente da ameaça de uma ousada torre que penetrava pela lateral. Ganha tempo para pensar nas próximas jogadas, injeta ânimo no cambaleante Partido dos Trabalhadores, e esconde a atrapalhada Dilma do olhar espantado da população. Mas agora já é muito tarde. A crise econômica chegou a um estado agônico, o desprestígio do PT é enorme, e a credibilidade do ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva está contaminada pelas contundentes denúncias de corrupção e lavagem de dinheiro. A essa altura, mesmo com a sua saliva milagrosa, dificilmente Lula terá ambiente para recompor uma base política que permita governar. Na armadilha que foi criada pelos equívocos e irresponsabilidades do governo Dilma, o “novo governo”, agora conduzido pelo ex-presidente, tem duas alternativas: 1) Ressurge o Lula ortodoxo de 2003 e põe em prática um sério ajuste fiscal, criando as condições para uma recuperação da economia no médio prazo. Neste caso, o ministro (primeiro ministro??) arcaria com um grande desgaste entre os poucos segmentos sociais (incluindo petistas) que ainda apoiam o governo. 2) Assume o atual Lula, critico das medidas ortodoxas de Dilma, implementando uma política econômica expansionista e voluntarista de agrado dos petistas e tentando impedir o impeachment (além de reduzir o desastre eleitoral nas eleições municipais), mas aprofundando a já dramática crise fiscal do Brasil. Como não há milagre em economia, em qualquer das alternativas, no médio prazo, a imagem do informal chefe do governo deve se deteriorar mais ainda. No final das contas, se Dilma não governa, levando o Brasil a grave crise econômica, o eventual expansionismo do governo Lula levaria ao completo desastre.

Acabou, presidente!

17/03/2016

A mensagem das ruas na noite desta quarta-feira foi contundente: “Acabou, presidente! Seu governo foi um desastre. O Brasil não aguenta mais. E agora, presidente, a senhora rompeu com valores de honradez do cargo e de respeito aos princípios republicanos”. Numa reação espontânea de indignação, milhares de brasileiros saíram em manifestação nas principais cidades do país, pedindo a renúncia da presidente Dilma Rousseff e repudiando a nomeação do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva para ministro da Casa Civil. O governo catatônico de Dilma ignorou o grito das ruas que mobilizou cerca de três milhões de pessoas nas manifestações do domingo 13 de março. Longe de tirar lições daquela esmagadora mobilização, o governo provocou mais indignação na população com a nomeação de Lula, numa manobra clara para protegê-lo das investigações da Operação Lavajato. A divulgação do áudio da conversa telefônica de Lula com a presidente Dilma, confirmando a manobra, foi uma fagulha no ambiente político explosivo do Brasil, provocando novo impulso de revolta dos brasileiros. Se existe controvérsia em relação à divulgação do áudio, não há dúvida sobre a gravidade do conteúdo dos diálogos, especialmente quando comunica a remessa do Termo de Posse para ser utilizado “em caso de necessidade”. A presidente jogou sua última cartada com uma renúncia branca, entregando o poder a Lula. Além protegê-lo, esperava que, com seu conhecido carisma, ele pudesse impedir o impeachment. Minimizou a falta de credibilidade dela e do ex-presidente. Agora acabou, Presidente.