O congelamento do orçamento público da União por 20 anos, apresentado ao Congresso através do Projeto de Emenda Constitucional (PEC 241/2016), deve conter a escalada de gastos correntes públicos dos últimos anos, que levou à grave crise fiscal do Brasil (déficit primário de R$ 170,5 bilhões neste ano). Entretanto, a drástica medida criou uma enorme rigidez na confecção e execução do orçamento e armou uma verdadeira armadilha fiscal. Pelo menos um item do orçamento, a Previdência social, não pode ser contingenciado, e apresenta uma tendência de expansão acelerada dos gastos futuros, acompanhando o envelhecimento da população. Com uma população idosa (60 anos e mais) de 23,4 milhões (11,7% da população total), a previdência social (INSS e Regime Estatutário) já compromete atualmente cerca de 26% do orçamento da União, beneficiando cerca de 33 milhões de brasileiros.
Nas próximas décadas, de acordo com projeção do IBGE, a população nesta faixa de idade tende a crescer de forma rápida (taxa de 3,4% ao ano) de modo que dobrará em 25 anos, chegando a 54 mlhões em 2040 (quase 24% da população total). Com o total do orçamento congelado, o aumento dos gastos da Previdência deve ampliar a sua participação no total (dos atuais 26%) provocando, portanto, redução continuada dos demais itens de despesa. A não ser que seja realizada uma reforma da Previdência capaz de deter o movimento de expansão das despesas, o congelamento do orçamento tende a criar uma armadilha perigosa para o Brasil, e pode forçar uma diminuição dos recursos disponíveis para as áreas estratégicas e que preparam o futuro.
A volta do crescimento da economia brasileira em patamares médios (3 a 4% ao ano), possível no longo prazo mas muito pouco provável nesta década, pode moderar a pressão nos gastos e aliviar a armadilha do orçamento público federal. Entretanto, a própria retomada do dinamismo econômico requer a recuperação da capacidade fiscal do país; o que depende da contenção da expansão dos gastos correntes, com destaque para as despesas com a previdência social. Pela regra do congelamento da emenda constituiconal, o eventual aumento da receita que decorra da retomada do crescimento da economia (provável no médio prazo) não deverá ampliar os gastos correntes, sendo destinado à redução da dívida pública, que alcançou níveis preocupantes (mais de 70% do PIB) e que compromete a poupança nacional.
A reforma da Previdência é a única alternativa para desarmar a armadilha do congelamento e proteger os recursos para educação, saúde e inovação. E apesar da contravérsia em torno desta reforma, parece evidente que o sistema de previdência, criado num período em que a população era muito jovem e a expectativa de vida baixa, não suportará a mudança demográfica, com o processo rápido de envelhecimento da população brasileira. Mesmo que conseguisse desfazer o enorme conjunto de privilégios e abusos do sistema, o que parece improvável,considerando os chamados “direitos adquiridos”.
Meu caro Sérgio:
Não entendo de Economia e exulto quando vejo o seu domínio na área, mas dizia-me um matuto amigo que “o malfeito é da conta de todo mundo, Dotô” e por isso me intrometo. Tem toda a razão quando se refere a dificuldade de mudança, sobretudo em função dos direitos adquiridos, mas com relação a previdência, tenho uma sugestão absolutamente dentro dos contornos legais: Porque não se discute com seriedade a UNIFICAÇÃO DO SISTEMA PREVIDENCIÁRIO? Num país já terrivelmente desigual, se mantém o sistema previdenciário privado que tende a aposentar todo o mundo com uma pensão de salário mínimo (Já é a imensa maioria!)? e, enquanto isso, a previdência dos servidores públicos é a glória total para uma velhice ociosa e serena, razão pela qual todo o mundo quer ser servidor público: Estabilidade eterna, pouco trabalho e feliz remuneração, sem esquecer que a grande maioria é premiada com promoção ao se aposentar.
Sou um aposentado no sistema privado e quando de minha baixa, contribuía sobre VINTE salários mínimos e hoje me considero feliz quando minha pensão só dá, rigorosamente, para pagar o plano de saúde (meu e de minha mulher). Para minha felicidade, com a sorte de ter me filiado ao CASSI (Banco do Brasil), uma das poucas coisas decentes que ainda restam em nosso país e que o regime petista não conseguiu degradar como fez com o seu fundo de pensão – o PREVI.
Só, amigo Sérgio, que pertenço a uma família que tem uma má-vontade danada pra morrer, estou beirando os 90 anos e faz mais de 25 anos que desfruto dessa rica pensão e ainda acho que sou um sortudo, mas essa conta não fecha no cálculo atuarial. E o envelhecimento é uma questão séria que tem que ser enfrentada sem demagogia, como o mundo civilizado já fez ou está fazendo. Enquanto isso, a população brasileira enfrenta uma verdadeira guerra para obter a sorte máxima de incluir-se no rol dos bem-aventurados servidores públicos. Tenho um exemplo em casa. Recentemente, um querido neto que carrega o meu nome, passou em um concurso para a polícia civil no Estado, disputando com (acredite se quiser!) com 49.000 candidatos e fiquei orgulhoso pois conseguiu ser o 19º no cargo pretendido.
Depois que entram, começam as reivindicações: Salário baixo; trabalho excessivo; más condições de trabalho; aqui e acolá uma grevezinha que permite umas segundas férias a exemplo do judiciário; remuneração dos dias parados na invariável primeira cláusula do acordo para fim da greve; qualificação pessoal às custas do Erário, até com cursos e pós-graduações no Exterior; buscas incessantes por gratificações que melhorem seus salários; sem contar com as benesses e mordomias que grande parte desfruta.
Falo com absoluta tranquilidade e sem reticências, como diria o Mestre Graciliano. Servi com honra aos três governos de Arraes e aos de Eduardo. Não possuo lauréis acadêmicos, nem comendas sodalícias, nem cargos favorecidos, e isso sem quaisquer queixas, pois quando me senti desconfortável, sem mais conversas botei o chapéu na cabeça e fui embora pra casa.
Discursos vazios realçam, sempre, a desigualdade econômica imoral que domina nosso Brasil, mas, objetivamente, não fazem nada para corrigí-la estruturalmente. Continuam dando peixe em vez de ensinar a pescar; permitem a coexistência de mais de vinte milhões de analfabetos totais que estão nos transformando num país de doutores e analfabetos; quando dirigi a Área de Mediação de Conflitos do Governo do Estado, escutei a maior reivindicação de marisqueiras de Paulista, em período de defensa: “Dotô, o que a gente queria era se alfabetizar, pra aprender a trabalhar com reparo de barcos e pranchas de resina que dá dinheiro e nunca mais a gente ia precisar dessa esmola”
Uma sugestão: talvez idiota quanto o seu formulador. Respeitando-se os direitos adquiridos dos servidores públicos, doravante proibir a criação, atribuição, concessão de quaisquer adicionais salariais além dos salários-base, inclusive indenização das apelidadas verbas indenizatórias (!) a qualquer título. (Por exemplo, auxílio moradia de $4.200,00, ou seja, o valor atribuído para matar a fome de cinco famílias com salário-minimo) Reforçando o dispositivo, qualquer reajuste salarial de servidor público de qualquer Poder, Alçada, Efetivos, Comissionados ou Gratificados seria limitado a iguais reajustes concedidos ao SALÁRIO-MÍNIMO.
Ainda sugeriria a todos a leitura de um artigo do Ministro Luis Roberto Barroso em 23 de maio de 2016, anterior portanto ao excelente discurso de posse da Ministra Carmem Lúcia, em que analisa com muita propriedade as causas da corrupção. Está na Internet com o título “Foro privilegiado deve acabar ou ser limitado aos Chefes dos Poderes”
Simples, não, mas quero ver quem tem coragem de entrar na jaula!
Caro Ivan
Você tem toda razão. O principal problema da previdência social reside na aposentadoria e pensão dos servidores públicos. Estes representam apenas 4% de todos os aposentados e pensionistas do Brasil e recebem 20% de todo o custo com a previdência (regime geral e estatutário). Em 2015, o sistema de aposentadoria dos estatutários teve um déficit de R$ 72,4 milhões para atender a pouco mais de um milhão de beneficiários. No mesmo ano, os 28,1 milhões de aposentados e pensionistas do setor privado (INSS) geraram um déficit R$ 78,9 milhões, apenas um pouco mais do que foi gerado por 4% dos beneficiários. Numa conta simples, é como se faltasse R$ 2.807,83 para pagar cada aposentado do INSS e R$ 70.388,35 para cobrir o buraco gerado por cada beneficiário dos estatutários (déficit per capita 35 vezes maior). A principal e mais urgente reforma deve ser no setor publico. Precisamente onde se manifestam as maiores aberrações e privilégios. Mas o envelhecimento rápido da população pede uma mudança geral em todo o sistema de previdência. O tema merece uma discussão aprofundada.