Luiz Otavio Cavalcanti

A globalização atesta fim e começo. Fim do ciclo industrial. Começo da era da informação. Mas a perspectiva enseja a pergunta: a nova configuração produtiva ajuda a atenuar o problema do desemprego? E garantir proteção social?

No século XX, o capitalismo foi construído tomando por base a empresa industrial. Em torno dela, selou-se acordo corporativo unindo empresários e operários. A indústria foi a unidade fabril que fixou aliança entre operação econômica e questão social. Nesse contexto, jornadas de trabalho são cumpridas, salários são pagos, produtos são fabricados e proteção social é garantida.

No século XXI, com a economia pós-industrial e a sociedade de serviços ocorreram três fatos:

1 a globalização;

2 a revolução tecnológica;

3 a terceirização e a modificação do contrato típico de trabalho.

Nessa nova formatação econômica, as relações produtivas enfraqueceram a aliança, fundada na indústria, entre empresários e operários. Deixou de existir a solidariedade orgânica, de que falava Durkheim, selada na fábrica. Na década dos 50, a Renault fabricava 80% do carro entregue. Atualmente, esse percentual caiu para 20%.

É que ingressamos, agora, na economia de serviços. Na qual os paradigmas são outros. A organização produtiva é outra. Há fragmentação na oferta da produção. Não há mais centralidade da indústria. Há diversificação produtiva distribuída no terciário moderno.

Se analisarmos a desigualdade, nos últimos setenta anos, veremos que ela diminuiu no período de 1945 a 1979. Essa redução ocorreu principalmente por causa da adoção do Estado do Bem-Estar Social, praticado pela social democracia europeia.

Tal modelo, abrangendo Alemanha, França, Itália, Áustria, foi construído por meio de redistribuição de renda (via impostos), programas sociais e elevadas aposentadorias. Acontece que o colapso fiscal determinou o fim dessa política.

Nas décadas de 80 e 90, a desigualdade voltou a aumentar. Por causa do desemprego. Era a época do Reagnomics, do Estado mínimo de Margareth Thatcher. Até meados dos 70, a taxa média de desemprego na União Europeia era de 5%. Na década dos 80 e 90, elevou-se para mais de 10%.

De lá para cá, nem nos Estados Unidos a política redistributiva de Obama produziu efeitos compensatórios significativos. Não obteve êxito, por exemplo, na recuperação do cinturão de ferrugem de Detroit. Por isso, não evitou o sucesso eleitoral do discurso radical de Trump. E o medcare continua a depender da maioria republicana no Congresso americano.

No século XXI, era da Tecnologia da Informação e Comunicação – TIC, o formato da produção econômica mudou. O insumo é conhecimento, informação, pesquisa, inovação, criatividade. Esse formato provocou a mudança do perfil do profissional do setor. Exigindo mais qualificação. Decorrerá daí o estabelecimento de aliança entre o econômico e o social como a que foi fundada na indústria?

Há dois fatos reconhecidos no horizonte: primeiro, nos países anglo saxões os sindicatos são capazes de aceitar concessões. Negociam com flexibilidade contratual coletiva contribuindo para ajustar o mercado de trabalho. Reconhecendo que não há outro caminho na nova economia. Este é exemplo que precisa ser seguido no Brasil.

O segundo fato é a consolidação das atividades inseridas no âmbito da Tecnologia de Informação e Comunicação – TIC. Por meio do avanço de rede poderosa de empresas tecnológicas que passa por Microsoft, Google. E uma infinidade de agentes de produção de softwares.

Principalmente a partir do modelo produtivo em que a primeira unidade vendida custa caro. E as demais unidades funcionam como espécie de locação. É modelo baseado em inovação, pesquisa, atividades criativas, tecnologia. Incorpora produtividade e agrega valor.

Esse modelo de produção tecnológico é o futuro. Deve estimular também a identificação de modos de aliança entre o econômico e o social, o empresarial e o laboral. Descobrindo formas para instituir rede de proteção aos que atuam do lado do trabalho.

Nesse contexto, a questão do grau de desigualdade social poderá ser enfrentada por duas vias: a do Estado e a da iniciativa solidária do setor produtivo.

No caso do Estado, a redistribuição de renda por meio de impostos (trabalhando-se alíquotas e base tributária) e programas sociais orientados (educação e capacitação) com avaliação de sua eficácia.

No caso do setor produtivo, maior proteção social através de modalidades de parceria entre empresa e colaboradores. Estas podem variar desde a celebração de contratos flexíveis, não típicos, de meia jornada, até a participação de empresas de prestação de serviços em atividades específicas como informática.

A economia de mercado, na era da informação, precisa ser criativa também introduzindo o social no seu conteúdo: economia social de mercado.     

Luiz Otávio Cavalcanti é membro do Movimento Ética e Democracia