Editorial

Em vez de uma guerra do Estado brasileiro ao crime organizado, o que vemos hoje no Brasil é um violento conflito armado entre organizações criminosas disputando espaços no grande e promissor negócio de drogas, armas, assaltos e subornos. Neste conflito pelo controle do tráfico e das rotas de entrada de drogas e de armas no país, as organizações criminosas se matam nos presídios e nas ruas sob o olhar perplexo da sociedade e dos governos. O massacre de presos no presídio de Manaus foi apenas mais um dos dramáticos eventos de disputa de poder do crime organizado e nada indica que será o último. A deterioração das instituições, corroídas pela incompetência, leniência, irresponsabilidade e corrupção (que envolve policiais, agentes de segurança, políticos, promotores, advogados, líderes comunitários e mesmo juízes) abre espaço para a expansão do crime organizado. A crise econômica e social cria o ambiente fértil para a sua propagação, e o sistema prisional – subhumano e superpovoado – favorece a organização, o recrutamento e o treinamento das poderosas quadrilhas. Os presídios brasileiros transformaram-se em verdadeiros quarteis-general das sofisticadas organizações criminosas. E, paradoxalmente, quanto mais cresce a população carcerária – de 2004 a 2014, quase dobrou, saltando de 336.400 para 607.700 – mais se amplia o poder e a base de comando das diversas quadrilhas que operam na rede de drogas e armas. E também, mais intensa e violenta a guerra entre elas. Demonstra a falência do sistema prisional brasileiro mas, principalmente, o total fracasso e a completa inadequação e ineficácia das políticas de segurança e combate ao crime organizado no Brasil. No enfrentamento da corrupção – o crime de “colarinho branco” – o Brasil tem demonstrado competência e eficácia com a atuação integrada de Juizes, do Ministério Público e da Policia Federal desbaratanto a complexa rede criminosa de políticos, empresários e servidores públicos que estavam assaltando o Estado brasileiro. Este sucesso pode apenas mostrar que a guerra ao crime ainda não está perdida. Mas, para enfrentar as poderosas e sofisticadas organizações criminiosas que operam na rede de drogas e armas – PCC, Comando Vermelho, Terceiro Comando, e outras organizações regionais como a Família do Norte – é necessário uma ação muito mais abrangente, integrada, inteligente e complexa considerando a sua amplitude, irradiação e capilaridade e, principalmente, sua prática violenta com grande e moderno arsenal. A estratégia é conhecida: controle das fronteiras, reestruturação profunda do sistema prisional, quebra dos seus fluxos financeiros e destruição do seu potencial armamentista, tudo associado a politicas sociais que interrompam a relação do crime com a sociedade, principalmente com os jovens vulneráveis. Aparentemente a sociedade e os governantes ainda não perceberam a gravidade e extensão deste fantasma subterrâneo que avança na sociedade brasileira e domina territórios e presídios.