O “nosso presidente”, como diz seu porta-voz, trouxe à cena das metáforas prosaicas a expressão “engolir sapo”. Disse que engolia sapos pela fosseta lacrimal e ficava quieto. É curioso e original o “nosso presidente”: sempre pensei que se engolia sapo pela boca. Numa rápida pesquisa ao pântano da internet, fui procurar pela batráquia expressão. A maioria dos sites diz que se origina da Bíblia, onde se fala que o antigo Egito sofreu uma praga de rãs. O trauma foi tão grande que posteriormente bastava uma situação difícil pra turma se lembrar de que as rãs, de resto muito mal-educadas, queriam entrar (e decerto entravam) pelas bocas a todo custo. Ainda não se descobrira a ranicultura nem os seus ganhos nutritivos e financeiros.
Deixemos quieto o velho Egito. Voltemos ao Brasil, onde não faltam bons cururus pra serem engolidos. Nada de rãzinhas mofinas como se feitas de gelatina. Nossa pátria amada é pródiga mesmo em cururus. Fala-se até da arte de engolir sapos. Outros povos engolem maná, chás alucinógenos, etc. Nós engolimos sapos. Eis o nosso castigo desde o tempo em que as lagoas não eram poluídas e sequer havia áreas de conservação. Antes os sapos ali viviam em paz, hoje, coitados, são engolidos, com fiscalização e tudo. Mas entendamo-nos: o presidente quer dar o exemplo, e o exemplo é ficar calado. Também não se pode falar com a boca cheia de sapo. Isso, além de má-educação, pode causar engasgos das mais diversas naturezas. Não podemos perder de vista o valor maior da lição presidencial: engolir sapo é uma arte e uma missão. De resto, sapo não tem rabo para ficar de fora.
Nossos analistas políticos (desculpem esse reparo) vêm perdendo o foco. Foco, como se sabe, é valioso. O foco, amigos, são os sapos. Se o presidente, que é o presidente, engole sapos, por que não os que estão ao seu redor? Não digo o povo, este já sabe das virtudes medicinais de qualquer cururu. O recado foi claro. Quantos sapos caberão nos estômagos mais refinados de Brasília? Não importam (caso existissem) os dados do IBGE. Porque sapos não faltam. É até comum se ouvir na hora do cafezinho em Brasília: “Você fala de barriga cheia”. Já se sabe: cheia de sapos. Não esqueçamos também que a Reforma da Previdência, de resto tão necessária, vem acompanhada de sapos de todos os tamanhos. Resta saber se os mais gordos desses bichos vão saltar fora ou vão mesmo cair na boca sofrida do povo.
Não há (o presidente está certo mais uma vez) quem não escape dos sapos. A Universidade, por exemplo, no momento está com um sapão atravessado na garganta. Grana curta, sapo imenso. Há quem diga (quanta maldade a dessa gente) que o próprio ministro da Educação é um sapo e tanto. Mas estudante não é criatura que saiba engolir sapo: a juventude ainda não aprendeu a estoica arte de deglutir sapos. É verdade que aprende depressa a arte da Balbúrdia, que é um novo nome para a mais perigosa das artes: a de incomodar os poderes constituídos. Arte que, se não controlada a tempo, pode vir a derrubar a República com consequências terríveis para humanos e batráquios.
Outro exemplo notável é o do Meio Ambiente. Flora e fauna vão pular mais que sapo na chapa quente. Nada de multa. O negócio é claro: tirar os sapos de cima de quem produz e colocá-los na boca daqueles que, de uma forma xiita e irresponsável, querem impedir o progresso. Afinal de contas, até um batráquio sabe que bicho não é gente, e que madeira pode virar ouro. Por falar em multa, pra que multar nas estradas? A indústria da multa é um sapo a ser abatido, este o presidente não engole. A classe média, disse ele, não tem mais prazer em dirigir. Por isso, radares e lombadas devem pertencer ao passado de um país atrasado. Aliás, por falar em país atrasado, pra que vacinas? Logo, aguardem, elas desaparecerão como um entulho autoritário. Povo que engole sapos é sempre saudável. O valor nutricional é fantástico e pouco calórico.
Finalmente, a área da segurança. Ora, quem não sabe que armas são fundamentais e que os filmes de faroeste sempre foram muito queridos? Do sapo da insegurança o povo vai se livrar. Tiros nesse sapo!, que aliás tem couro grosso. Daí que os calibres devam ser grossos também. Nada mais justo. O resto é mimimi. Uma ou outra gota de sangue é inevitável, mas, que diabo!, a Terra não é o paraíso, e até a maçã estava envenenada. Dirão as más línguas: agrotóxico! Olha, assim, é difícil governar. Pouca gente nasceu pra isso.
Paulo Gustavo
“… Balbúrdia, que é um novo nome para a mais perigosa das artes: a de incomodar os poderes constituídos”. Peço licença para discordar: balbúrdia não é só o que se instalou no transporte em S.Paulo na sexta passada, balbúrdia é o que se instalou em Brasília, nos palácios. A economista Monica de Bolle outro dia (Estadão, 08/05/19) disse que “cada governo tem a sua palavra, seu mot juste”, e a do governo Bolsonaro é balbúrdia, assim como a palavra do governo Dilma foi “estarrecida” ou “estarrecido”. E termina alertando para o perigo da combinação dessas palavras que nos trás o governo Bolsonaro: “Ficaremos todos estarrecido com a balbúrdia enquanto a economia padece no vácuo.”
ERRATA: faltou um S em estarrecido na penúltima linha.
Bem-vinda discordância.
Penso que o ministro usou balbúrdia pra não usar baderna.