Terceira via – autor desconhecido

Terceira via – autor desconhecido.

 

O futuro é muito incerto, mais ainda neste país de imponderáveis e de tanta insensatez política. Em todo caso, podemos especular sobre as tendências e possíveis comportamentos dos políticos e dos eleitores, até porque precisamos antecipar movimentos futuros alternativos para orientar nossas decisões. Enquanto não tivermos novas surpresas que possam alterar completamente o quadro político do Brasil, podemos considerar relativamente prováveis, as seguintes tendências e possibilidades que definem as eleições presidenciais de 2022 (devo parte destas ideias a conversas com amigos da Roda Democrática, embora tenha toda a responsabilidade pelos seus acertos ou erros). 

  1. Bolsonaro tem grande chance de estar no segundo turno em 2022, mas remotas possibilidades de se reeleger. Ele perde para qualquer concorrente que, no segundo turno, deve atrair os votos dos 53% que consideram o seu governo Ruim ou Péssimo e dos 59% que rejeitam a sua eleição (Datafolha).
  2. Na medida em que cresce a rejeição a Bolsonaro, tornando muito improvável sua reeleição, aumenta a verdadeira ameaça bolsonarista: a tentativa de tumultuar as eleições (antes ou depois da sua derrota). Pode ser uma tentativa fracassada, mas, dependendo da sua capacidade de criação de um clima de caos social (seus milicianos são competentes), ele pode até atrair segmentos das Forças Armadas para uma aventura golpista. 
  3. Por isso, a principal iniciativa dos democratas neste momento deve ser a construção de uma Frente Democrática para neutralizar os movimentos de Bolsonaro, garantir as eleições limpas e democráticas e a posse do eleito. Entretanto, depois da última manifestação do dia 2, parece difícil avançar na construção dessa Frente. A dispersão das palavras de ordem em torno de temas controversos, e os ataques a Ciro Gomes, único presidenciável a discursar no evento, mostram que não há clima para uma frente com o PT. O PT não tem interesse nessa frente – provavelmente subestima a ameaça golpista – nem num impeachment, porque a sua posição na disputa eleitoral depende da polarização com Bolsonaro. 
  4. Lula é, no momento, a adversário mais forte de Bolsonaro, mas vai ter de enfrentar uma campanha eleitoral impiedosa, com acusações de ladrão e de responsável pela grande crise econômica do governo Dilma. As intenções de voto em Lula bateram no teto e vão declinar, declínio que depende de dois fatores: a redução da ameaça de reeleição de Bolsonaro (intenções de voto) e a capacidade de os outros candidatos ocuparem espaços na crítica ao mentecapto capitão. Por enquanto, Lula aparece como se fosse o único que critica Bolsonaro e que pode derrotá-lo, o que deve mudar na medida em que se aproximem as eleições. 
  5. A chamada terceira via não vai convergir para uma candidatura única. Pelo menos dois a três candidatos com algum peso não vão renunciar às candidaturas, a começar por Ciro Gomes. Desta forma, tende a haver uma grande dispersão dos votos que rejeitam Bolsonaro e Lula, sem que nenhum chegue ao segundo turno, a não ser que algum dos nomes em disputa consiga descolar do conjunto e atrair uma grande quantidade dos eleitores “nem-nem”. Neste caso, o mais provável seria um segundo turno entre Lula e um candidato do centro democrático, esvaziando a candidatura de Bolsonaro.  
  6. No caso de um segundo turno entre Lula e Bolsonaro, os partidos e candidatos da terceira via devem procurar o candidato petista, para formar uma aliança programática de reconstrução do Brasil. Mesmo que ele tenha muita chance de ganhar de Bolsonaro mesmo sem o apoio explícito dos partidos e candidatos da terceira via, deve ser exigida uma negociação em torno de uma aliança para reconstrução do país, que não pode se restringir ao programa do PT. 
  7. Não existe chance política, nem parece correto negociar esta aliança em torno da candidatura de Lula no primeiro turno, por três razões: i) o segundo turno ainda não está definido e não é improvável, embora difícil, que um candidato da terceira via cresça o suficiente para tirar Bolsonaro do segundo turno; ii) uma negociação para apoiar Lula já no primeiro turno seria uma simples adesão, sem nenhuma força de negociação programática; iii) uma vitória de Lula no primeiro turno, felizmente improvável, seria muito ruim para a democracia brasileira, na medida em que consolidaria a hegemonia do PT e reforçaria o populismo de Lula.
  8. A surpresa que alteraria completamente o desenho político-eleitoral seria a retirada da candidatura de Bolsonaro à reeleição. As tendências psicopáticas dele indicam que é muito pouco provável, embora existam sinais de inciativas e articulações neste sentido, considerando a possibilidade real de derrota e a dificuldade para um golpe, e com o propósito de enfraquecer a candidatura de Lula. De fato, com Bolsonaro fora do primeiro turno, Lula perde a energia da polarização, e os candidatos da terceira via crescem e projetam um deles para disputa do segundo turno.  

Como conclusão, seria aconselhável insistir na construção de uma Frente Democrática, mesmo considerando as grandes dificuldades e o desinteresse dos políticos, e participar de uma reflexão em torno da concepção de um programa de reconstrução nacional. Um programa que, no primeiro turno, alimente o discurso e as propostas dos candidatos da terceira via, na expectativa de uma posição no segundo turno. Ou, caso contrário, para orientar a futura negociação com Lula, num indesejável segundo turno polarizado entre o ex-presidente e o atual presidente.