Guerra não é bom negócio. Não o foi para Napoleão. Nem para os franceses. Não o foi para George W. Bush. Nem para os norte-americanos. E não o é para Vladimir Putin. Nem para os russos.
Quatro razões levam analistas a entender deste modo a bárbara invasão da Ucrânia. A primeira razão é a menor reputação deixada pelo Exército russo. O que seria destruição rápida e incontornável, tornou-se exercício continuado de violência. Contra civis, mulheres e crianças. Há dúvidas sobre a estratégia e a eficácia bélica dos russos.
A segunda razão é o enfraquecimento da economia e da moeda russa. Face ao vigoroso conjunto de sanções imposto por países ocidentais. Considerando-se especialmente o fato de que a economia russa é mono funcional. Produz muito petróleo e gás. Mas não apresenta complexidade moderna. Petróleo e gás são insumos do passado. O futuro é das energias limpas, sustentáveis.
A terceira razão é a fuga de organizações empresariais. Setor privado gosta de estabilidade política e econômica. Pois só assim tem retorno do investimento. Uma guerra não faz parte da sintaxe mercadológica da empresa privada. Abriu-se uma cratera de desconfiança a investimentos capitalistas na terra de Alexander Soljenitsyn.
A quarta razão é o temor social da burguesia russa. Em relação à sensatez do governo. Diga-se, de Putin. Porque havia um movimento ascendente das classes médias afluentes em Moscou e em São Petersburgo. Mais investimento ocidental, mais lojas, mais consumo. Uma sensação de integrar um planeta onde se poderia usufruir de bens antes só vistos na tv.
A estratégia de Putin descreveu um círculo de completo fracasso. Seu perfil político mudou. Antes, tido como um autocrata de decisões seguras para suas hostes, revela decaído nível de visão estratégica. Na prática, um Stálin restaurado das sombras do comunismo, a quem só se pode chamar de ditador. Carregando o bolor de tempo revogado. Figura minúscula de um totalitarismo que ninguém quer mais.
E, aí, surge a consequência preciosa da funesta aventura do ditador russo: a revalorização da democracia. Porque a guerra da Ucrânia mostrou os riscos, a desumanidade, a violência das tiranias. Ora, a tirania é um subproduto do populismo. Que desconhece as regras da lei. Que ofende e frauda as instituições. Qual foi o chefe de Estado que visitou Putin às vésperas da guerra da Ucrânia?
A guerra da libertação da Ucrânia é um espelho de duas faces. Mostra a face desnuda de autocratas. E revela a certeza confiante do constitucionalismo, dos direitos humanos, da diversidade étnica. Este elenco notável de conquistas sociais do homem contemporâneo. Que o induz a olhar e enxergar o outro. Numa rede de solidariedade, que é filha da generosidade. Por exemplo, no gesto simples, mas alguma vez ignorado, de respeitar os mortos da covid.
Zemmour, candidato presidencial na França, pediu desculpas por seu discurso contra a imigração. E o governo da Polônia, que abriu os braços para amparar os refugiados ucranianos, reabilita-se no seio do internacionalismo.
Os brasileiros torcem pela Ucrânia, querem respeito à lei e à Constituição, força às instituições republicanas. Simbolicamente, apertam a mão valorosa de Zelensky. E ofertam às crianças ucranianas iguais rosas às que elas receberam, hoje, nas escolas polonesas. Que as acolheu. Entre sorrisos feitos de inocência. Mas também de nascente consciência do que significa humanidade.
Excelente artigo, Luís Otávio. Obrigado.