No século 18, o pensador francês, Montesquieu, percebeu a hipertrofia de poder nas mãos da realeza. E escreveu O Espírito das Leis. Nele, Montesquieu introduziu a mais profunda e duradoura mudança nas instituições políticas modernas.
Ele propôs que o poder passasse a ser tripartido: um órgão seria encarregado do fazer. Outro órgão ficaria com o legislar. E a um terceiro órgão seria atribuída a função de julgar. Ou seja, o Poder Executivo, o Poder Legislativo e o Poder Judiciário.
Ao ver a violência de golpistas nos prédios dos três Poderes, em Brasília, no domingo, lembrei de Montesquieu. O que aqueles baderneiros faziam, com destrutiva ignorância, não foi atacar fisicamente prédios que sediam os Poderes do país. O que eles tentaram danificar, com aríetes de estupidez, foi construção institucional com dois séculos de existência. Não eram prédios. Era arquitetura política.
Democracia são símbolos. O Senado de Cesar representava a República romana. A Assembleia Francesa significava a emergência da representação parlamentar. O voto popular, na singeleza de sua força, representa o poder do povo.
A Esplanada de ministérios, em Brasília, é uma obra prima de arquitetura. Na leveza de suas curvas. No ineditismo de sua invenção original. Mas, vai além disso. Reproduz, na simetria de suas proporções, o equilíbrio da democracia. Ali estão os três Poderes. Ali está a vida republicana que vence o obscurantismo autoritário.
Pois bem. O ferimento foi tal, a indignação foi tanta, o risco foi tão insensato, que a noite da lucidez restabeleceu as coisas em seus lugares. Proporcionou a tessitura de um quadro que expressa a repactuação da República brasileira. Reuniram-se, em torno da mesa da democracia, os presidentes da República, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, do Supremo Tribunal Federal – STF e vinte e sete govenadores de estados.
Reuniram-se, em inspirada moldura, a República, a Federação e a democracia. Para celebrar a inteligência. Para comemorar o respeito. Pata testemunhar a Constituição. Para vivenciar a ideia correta de Brasil.
Porque ali, ne reunião, estava a diversidade política de opiniões diferentes. Sob a égide comum da unidade brasileira. Eu disse unidade. Não disse unanimidade. O diálogo. O respeito. A construção. O presidente da República dizendo ao governador de São Paulo, seu adversário político:
– Vou até seu gabinete tomar um cafezinho e podemos juntar recursos para realizar obras para o povo.
Na noite estrelada da sensatez, ficaram evidentes dois fatos:
1º A democracia brasileira cresce na adversidade, como disse o vice-presidente Geraldo Alkmin;
2º O trânsfuga da Flórida, acentuando disfarces de veracidade duvidosa, fica cada dia menor.
Amanhã, o sol nascerá do mesmo jeito que nasce desde sempre. Mas trará outra aurora. Mais inspiradora, mais amorosa, mais agregadora. Embalando no céu tropical, desenho de veraz utopia: o voo do pássaro da democracia.
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