“Na floresta, a ecologia somos nós, os humanos.

São também os animais, as árvores, os rios.”

A Queda do Céu, Davi Kopenawa e Bruce Albert.

 

A Ucrânia não é para Lula. A ONU, sim. A Rússia, com rapto imoral de crianças, não é para Lula. O discurso moral da desigualdade, sim. A 78ª assembleia geral da ONU mostrou quatro evidências.

A primeira, há um deserto de líderes no cenário mundial. O presidente Biden desfila claro cansaço físico e mental. O presidente Xi Jiping se permite enigmático e obsequioso silêncio. O presidente Macron está atado a um questionamento interno por causa da reforma da Previdência. O primeiro-ministro inglês, noviço na função, exibe perfil distante da exuberância de Churchill. E o tirano invasor, Putin, é uma egolatria em busca de seu próprio abismo.

A segunda evidência é a perigosa fragilidade da ONU. O círculo de ferro do Conselho de Segurança imobiliza a instituição. Em proveito conspícuo de seus membros permanentes. A multiplicação dos Gês, G 7, G 20, G77, é uma certidão de ineficácia passada no cartório da descoordenação mundial.

A terceira evidência é a necessidade urgente de a ONU convidar os cinco membros permanentes, mais o Brasil e a Índia, com um objetivo: tentar a construção de um entendimento em torno da guerra da Ucrânia. Os custos já são elevados demais. Em termos humanos para os ucranianos. Em termos sociais para os europeus. E em termos econômicos para a economia global.

A quarta evidência é a necessidade de coerência do discurso político do presidente Lula. Do ponto de vista ideológico. A crítica que ele faz à visão antidemocrática da extrema direita deve ter igual correspondência à esquerda. Por que omitir crítica às ditaduras da Venezuela, da Nicaragua e de Cuba ? A avaliação de regimes políticos perde força e autoridade quando usa dois pesos e duas medidas.

A palavra do presidente Lula em Nova York foi reconhecida por todos que a ouviram. Pela continuidade lúcida no combate à desigualdade. E à atenção dedicada ao programa de mudanças climáticas desde a COP 21. Pela precisa arguição à injusta distribuição de recursos do FMI entre países europeus e países africanos. Mas, a grandeza de governante aparece quando o critério ético é objetivo, isento, imparcial. E se aplica universalmente.

Há um desejo de paz. Transparente no auditório das Nações Unidas. E há um deserto de líderes. Demonstrado no impasse em que se encontra a ONU diante de conflitos como o da Ucrânia. A possibilidade de prorrogação da guerra por mais cinco ou seis anos é penalidade inaceitável para o crescimento da economia global. O impasse impõe ao secretário-geral das Nações Unidas a responsabilidade de agir. De estimular as lideranças a buscarem alternativa de solução.

Finalmente, a situação incômoda, em que a omissão do governo anterior colocou a Amazônia, mudou. Agora, a floresta fala por si. O Brasil cobra os recursos prometidos com legitima autoridade. A FUNAI funciona. A Polícia Federal destrói as bases de contrabandistas. E Belém vai sediar encontro de países para formularem conjuntamente política com perspectiva amazônica.

Como escreveu Carlos Drummond de Andrade:

“A máquina do mundo, repelida,

Se foi miudamente recompondo,

Enquanto eu, avaliando o que perdera,

Seguia vagaroso, de mãos pensas”.