Sábio

Sábio

– Senhor Albert Bohr: o Aquecimento Global impõe à humanidade um desafio climático como jamais existiu. Isso prova que o racismo e a homofobia têm raízes quadradas, ou mesmo cúbicas, entranhadas na nossa ancestralidade cultural, física e matemática. Tanto que Arquimedes já dizia, após o banho: “Eureka, turekas, elereka”. Para entender melhor a relação entre uma coisa e outra, entrevistei neste mesmo programa um grego discípulo de Ostropoulus Atimorenko. Eu não sabia quem é ou foi Ostropoulus Atimorenko, mas ele garantiu tratar-se de um filósofo que jogou na defesa da seleção brasileira de futebol em 1982, sendo por essa razão considerado pré-socrático, pois, como sabemos, o inesquecível Sócrates atuava no meio de campo daquele mesmo time. Você concorda que a Amazônia está se acabando em fogo?

– Concordo.

– Exato, exato, senhor Bohr. Eu não esperava outra resposta de um sábio norueguês que, como eu, também nunca ouvira falar em Ostropoulus Atimorenko. Mas, isso não é tudo. Os maiores economistas franceses da atualidade são unânimes em afirmar que a dinâmica do capitalismo financeiro internacional globalizante excludente e desagregador está aumentando a desigualdade de renda e de riqueza no mundo, provocando muitas greves em Champs Élysées, como se isso fosse novidade. Qualquer um dos megatrilionários atuais tem mais dinheiro do que a família Silva inteira. Um absurdo, pois os silvas se contam aos milhões, enquanto o ricão é ele sozinho. Esse problema pode levar a uma convulsão mundial semelhante à Retirada da Laguna. Não acha?

– Acho.

– Vou lhe pedir que seja mais conciso pois, o senhor sabe, tempo de rádio ninguém espicha e, antes de terminar a entrevista, ainda quero que fale sobre o Quirquistão. É um país novo com uma população tão pequena, que o chamavam Quirquistá. Só recentemente, devido à explosão demográfica ocorrida na Bessarábia, os dois habitantes do lugar entraram em acordo para dar-lhe o nome que tem hoje. Mas, isso só aconteceu depois do segundo paredão no Big Brother, não é verdade?

– É.

– Conforme sabemos, o grande problema filosófico que tem absorvido seus esforços intelectuais nas dez ou quinze últimas décadas é explicar como o senhor, nascido no Quirquistão, se apresenta ao mundo dizendo ser um sábio norueguês. Muita gente lhe acusa de charlatanismo. Sua defesa tem sido afirmar que nem sabe quem fundou a mencionada escola. Poderia ser Jean Charlate? Mas esse foi apenas seu vizinho de porta, anos atrás. Nem trocavam palavra. Ou Marie Charlat? Mulher maravilhosa, que encantou Paris durante a invasão normanda. Vocês dois foram amantes, é sabido, mas ela não exerceu nenhuma influência sobre o seu pensamento. Quer acrescentar alguma coisa?

– Não.

Entraram no ar os acordes iniciais de O Guarani. Era a Voz do Brasil começando. Fora dos microfones, o radialista fez um comentário reclamando que o sábio norueguês Albert Bohr havia falado muito sem dizer nada.