No dia 21 de julho último, houve uma solenidade na sede da Fundação Joaquim Nabuco comemorativa dos 75 anos de sua criação, a que compareci. Com o nome original de Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais (IJNPS), essa instituição pioneira resultou de lúcido projeto do então deputado constituinte Gilberto Freyre baseado no fato de que em 1949 se dava o centenário do nascimento do grande abolicionista e pensador Joaquim Nabuco, razão para que se o homenageasse com a criação do IJNPS. Sobre isso, a saudosa historiadora Joselice Jucá, mãe do cineasta Kléber Mendonça Filho, que foi também da Fundação, escreveu Joaquim Nabuco Uma Instituição de Pesquisa e Cultura na Perspectiva do Tempo (Recife, 1991). De IJNPS, a instituição sofreu uma mudança, passando a se chamar Fundação Joaquim Nabuco em 1980.
Na solenidade da festa dos 75 anos, não se falou dos pioneirismos da Fundação, a começar da própria concepção do IJNPS em 1949 – tema de artigo preciso de Paulo Gustavo aqui na revista Será?. A ênfase foi em cultura. Pouca coisa sobre pesquisa social. Como membro dos quadros do IJNPS e da Fundação desde 1966 (até 2013), esperava que fossem reverenciados ali, além de Gilberto Freyre, nomes ligados à instituição do porte de Manuel Correia de Andrade, Mário Lacerda, Gilberto Osório, Waldemar Valente, Mauro Mota, Dirceu Pessoa, Tânia Bacelar, Leonardo Guimarães, Renato Carneiro Campos, Joselice Jucá, Edson Nery da Fonseca, Joaquim Falcão, Graziela Peregrino, Sylvio Rabelo, Sebastião Vila Nova, Amaro Quintas, Fred Pernambucano, Roberto Mota, Hélio Moura, cinco deles estando vivos. A sessão solene terminou sendo uma festa de pessoas de fora – com representação significativa do PT e um tom algo burocrático. Nem mesmo a extraordinária gestão de Fernando Freyre (1945-2005) – de 1972 a 2003 – mereceu menção.
No cinquentenário, em 1999, com ênfase na pesquisa, a Fundação organizou e sediou a I Conferência Latino-Americana e Caribenha de Ciências Sociais, da qual fui responsável, por ser da Fundação e da diretoria do Conselho Latino-Americano de Ciências Sociais (Clacso), que o IJNPS ajudou a fundar, em 1967, parceiro da reunião. Ela foi apoiada pelo próprio presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, que garantiu os recursos para a Fundação bancar os gastos com passagens e hospedagens do evento. Tal apoio foi selado numa reunião no Palácio da Alvorada, em Brasília, no dia 7 de julho de 1999, com a presença do presidente, de dona Ruth Cardoso, do vice Marco Antônio Maciel, do ministro da Educação, Paulo Renato Souza, do chefe da assessoria de FHC, Vilmar Faria, de Fernando Freyre, do secretário executivo do Clacso, o argentino Atilio Borón, e deste coordenador. Eu tinha a sorte de ser amigo de todos eles, o que facilitou articular esse memorável encontro.
O projeto da conferência logrou tanto êxito que ela originou um ciclo, passando a ser repetida de dois em dois anos até 2003 (Guadalajara e Havana) e, daí em diante, de três em três (Rio de Janeiro, Cochabamba, Medellín, México). A reunião de Havana contou com a presença do comandante Fidel Castro, que fez o discurso de encerramento dela, ocasião em que apelou para que as ciências sociais da América Latina dessem mais atenção à ecologia – um tópico que fora objeto de intervenções minhas. Quem esteve lá presente foi o linguista Noam Chomsky, além de Evo Morales, do renomado economista egípcio Samir Amin e do sociólogo pernambucano Chico de Oliveira.
No dia 21 de julho deste ano, não compareceu ninguém da família de Gilberto Freyre. Sua filha Sônia não foi convidada. Um membro da mesa que presidiu a sessão, Cristiano Ramalho, começou sua vida profissional na Fundação como estagiário da pesquisa social, sob minha supervisão, mas estava ali como secretário de Pesca no governo federal. Em 1999, ocupavam espaço na mesa de abertura o vice-presidente Marco Maciel, o governador de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos, seu secretário José Arlindo Soares, o presidente Fernando Freyre, da Fundação, o geógrafo Manuel Correia de Andrade – que proferiu a palestra magistral –, o secretário-executivo do Clacso, Atilio Borón, e eu. A reunião durou de 22 a 26 de novembro de 1999, com atividades simultâneas em locais diferentes, congregando cerca de 950 pessoas. Vieram participantes de toda a América Latina e alguns dos EUA e Europa, além de brasileiros de todo o país. Foi assim que se deu forma à comemoração dos 50 anos da Fundação Joaquim Nabuco. Uma homenagem à altura também dos 150 anos de Joaquim Nabuco e dos 100 anos, em 2000, de Gilberto Freyre.
O autor é Pesquisador Emérito da Fundação Joaquim Nabuco, aposentado; Professor da UFPE, aposentado; ex-Presidente da International Society for Ecological Economics (ISEE); Presidente de Honra da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica (EcoEco); membro da Academia Pernambucana de Ciências.< [email protected]>.
Forte artigo, querido Clóvis.
É de fato uma pena que o evento de aniversário da Fundação Joaquim Nabuco não tenha se voltado para homenagear os “ancestrais” e vislumbrar o futuro, limitando-se a um “tom algo burocrático”…
Dou por visto.
Abraço