Escrevo estas reflexões no momento em que a sociedade se divide, espezinhando a razão e a serenidade, por conta dos fatos políticos recentes. A Operação Lava Jato destampa o fétido esgoto da corrupção política e empresarial que, há séculos, vem forjando nossa cultura de poder. Diante de uma verdade que se revela, desconstruindo de forma dolorosa e abrupta mitos e crenças que davam suporte a existência de muitos, é natural o clamor de todos: uns, desesperados em segurar nos ombros o andor do santo de barro, que a cada dia se mostra mais vulnerável, virando pó; outros, também com seus valores e ídolos, ainda não investigados, como se estes fossem imunes, jogam pedras no adversário que, claudicante, usa todos os recursos que tem a mão, tudo valendo, inclusive a mentira – essa milenar aliada dos poderosos.
A paixão a todos cega. Como em um jogo de espelhos a realidade brinca com nossas percepções, pois um mesmo fato é visto de maneira invertida pelos dois lados – e ambos se colidem num perigoso jogo de força, desestabilizando a nação. Estamos à mercê dos fatos, os quais estão sendo julgados pelo STF e pelo Congresso – com suas falhas e imperfeições, com suas parcialidades e interesses, porém é o que temos de mais eficaz em uma democracia.
Fora da lei voltamos a barbárie.
Leio estarrecido, intelectuais com carreiras brilhantemente construídas ao longo da vida (doutorados no exterior com vacas sagradas da intelectualidade europeia, décadas de atuação na academia e na pesquisa social, outras dezenas de papers e seminários) serem capturados feitos moscas pelos traços significantes da trajetória de Lula, da sua prática política e seu discurso.
Vejo uma negação da realidade coletiva, alimentada por misteriosos mecanismos de defesa, estruturados por um delirante surto persecutório – que aliás, foi sempre este o mecanismo vivenciado pelos movimentos “revolucionários”. Na história antiga, temos os sacerdotes hebreus rasgando suas vestes numa demonstração de ódio contra Jesus, que os chamou de sepulcros caiados. Vencerem, com a crucificação daquele que ousara descortinar a falsa realidade que dava suporte a estrutura de poder de uma elite; na Alemanha, Hitler volta seu discurso histérico contra judeus e minorias étnicas, transformando-os em objeto fóbico, conduzindo uma enorme maioria da culta sociedade alemã a um ódio e violência irracional contra milhões de judeus; durante a ditadura militar de 1964 foi o conceito de “Segurança Nacional” que justificou a tortura e morte de vários que se opuseram ao Regime; o regime de Fidel em Cuba, após justificada defesa contra a tentativa de invasão americana, se nutriu, por décadas, usando este “surto persecutório” contra os Estados Unidos para sustentar seu regime.
É necessário tornar o outro absoluta e completamente culpado pelas adversidades e ameaças, daquilo que nossa ideologia tão impecavelmente forjou, para entender e dar conta da realidade política e social. Se a realidade histórica, com seus fatos impermeáveis aos nossos discursos, teorias e práticas políticas, insiste em se desviar, não é culpa nossa e sim do outro.
Este é um estranho comportamento que nasceu ainda em nossa pré-história, quando vivíamos em hordas, adorando o sol e a lua, erigindo totens para nos proteger das intempéries da natureza e tentar dar sentido a morte. O totem, com seus poderes imaginariamente projetados pelo homem, incorpora uma áurea sobrenatural fundamental para dar suporte a nossa frágil e efêmera existência.
Esta prática primitiva está na raiz das religiões, na formação do Estado Moderno e nas ideologias. Basta um desequilíbrio, como a crise que vivemos hoje, para voltarmos a nossa prática atávica.
O fenômeno Lula criou em torno dele uma esquerda totêmica, que de esquerda, no sentido histórico forjado desde o socialismo utópico ao marxismo e o pós-marxismo, tem muito pouco. O afeto se impôs ao intelecto, a razão foi pisoteada pela emoção, a crítica emudeceu transformando intelectuais, antes ilustres, em uma amorfa e alucinada horda em torno do seu sagrado mito. Com seus olhares fixos, suas cegas certezas, seus gritos ululantes dirigem seu ódio fácil contra tudo aquilo que ameaça sua percepção delirante de realidade. Uma realidade que se esvai diante de seus olhos – deixando apenas a angústia de um vazio.
Culpar a imprensa pela existência de fatos reais e graves, apoiar Lula em seu percurso, cada vez mais desesperado, pois esta é sua única estratégia que lhe resta, é totemizar nossa democracia. Podia esperar isto de militantes iletrados e desamparados, onde Lula – e outros também, FHC, o príncipe da sociologia, exerce seu fascínio sobre outras hordas – se instala em seus espíritos como um pai onipotente. Nunca, jamais, de acadêmicos detentores de um saber que, em tese, deveriam investigar, com a necessária postura crítica que a ciência exige, nossa realidade, nossa história, nossa cultura, enfim preparar caminhos para o destino da nação.
Quantos livros lidos com paixão! Quanta energia intelectual voltada para interpretar nossa realidade social! Quanto desprendimento pessoal em favor do interesse maior da sociedade…posso continuar listando muito mais, pois conheço, um pouco, o árduo valor de uma prática de pesquisa acadêmica.
Tudo isto jogado fora, pois como em complexo e ardiloso jogo a realidade infantiliza intelectuais, esmigalha nossa intelligentsia num perverso e danoso processo de inutilidade intelectual.
Lula e seus pragmáticos parceiros – alguns já na cadeia – gozam, se utilizam, manipulam parte desses “sacerdotes da academia”, tão cheios de saber, porém obnubilados pelas chamas crepitantes da fogueira em seus rituais totêmicos – as ideologias.
Ao longe, vindo de um desses becos escuros da história, é possível ouvir a horda em genuflexão adorando seu totem numa desesperada e vã tentativa de conter a realidade que se desmancha vertiginosamente, repetindo seu mantra “Não vai ter golpe! Não vai ter golpe! Não vai ter golpe!”.
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(*) Frase encontrada no Manifesto Comunista, de Karl Marx e Friedrich Engels – Tudo que é solido se desmancha no ar, tudo que era sagrado é profanado, e as pessoas são finalmente forçadas a encarar com serenidade sua posição social e suas relações recíprocas.
Lúcido e oportuno, João. Só não concordo com a referência a F. Henrique. Os correligionarios deste tem perfil diferente.
Caro João,
Concordo com vários pontos do teu artigo. Em particular, com a frase “Fora da lei voltamos à barbárie”. E é nesse ponto principalmente que me preocupa as paixões de ambos os lados. Acredito que se, por um lado, “O fenômeno Lula criou em torno dele uma esquerda totêmica…”, como disseste, o mesmo criou um grupo igualmente irracional e dominado por um ódio cego que a ele se opõe, tomado por uma passionalidade patológica. Entendo teu espanto ao ver que, no caso de muitos pensadores de esquerda, “O afeto se impôs ao intelecto, a razão foi pisoteada pela emoção…”. Mas, o que dizer quando, entre os críticos de Lula e do PT, intelectuais igualmente renomados e credenciados começam a praticar a mais básica das máximas patrimonialistas: “Para os amigos, tudo! Para os inimigos, a lei!”? Tenho colegas e amigos cientistas sociais, juristas e economistas de instituições de referência no meio acadêmico brasileiro que se engajaram numa lamentável campanha de desmoralização do Min. Teori Zavascki, por este ter tomado a decisão de manter o processo referente ao ex presidente Lula no STF (alguns deles estão, inclusive, encaminhando por meio eletrônico uma cópia do Art. 102 da CF-88 com uma rasura a mão, insinuando que o Min. Zavascki estaria reescrevendo a carta magna). Intelectuais estes que sabem muito bem que a decisão, de 2008, do Min. Gilmar Mendes referente à “Reclamação: Rcl 2186 DF” gerou clara jurisprudência pela extensão do foro privilegiado. Ou o que valeu para o ex ministro Pedro Malan e alguns outros tucanos em 2008 não vale para o ex presidente Lula em 2016? Mesmo que alguém achasse que os casos não são idênticos (o que me pareceria uma interpretação equivocada), seria preciso considerar que: a) uma jurisprudência pode se aplicar não apenas a situações idênticas, mas também a situações similares e; b) que, em sua decisão de 2008, o Min. Gilmar Mendes assumiu certos graus de liberdade doutrinária para uma interpretação flexível da norma legal e, assim, é necessário que, com base no princípio da isonomia, se admita que qualquer outro ministro do STF também possa fazê-lo. Portanto, não vejo outra explicação que não a hidrofobia irracional a explicar a atitude de intelectuais bem informados ao aderir a algo tão leviano quanto a atual campanha para desacreditar o Min. Teori Zavascki. Como você disse, “Fora da lei voltamos à barbárie”, mas a lei tem que valer igualmente para todos.
Grande abraço,
Jorge Alexandre
Sobre o ódio cego mútuo, ou a faca nos dentes…
Prezado João Rego
O que diferenciaria o ódio cego de um lado do ódio cego do outro? O fato de eu estar de um lado? Claro que não, isso seria uma estupidez. Mas comparar as ideias de um lado com a história, com o vivido pelas nações em um período histórico recente, talvez seja um bom caminho para entendermos esta questão. De um lado, os que estão com o PT tem como argumento decisivo para sua verdade, a melhoria das condições de vida das classes mais pobres. Também o discurso socialista, estatizante até, é um outro argumento de peso. Ao meu ver, a inserção da melhoria das condições de vida, tal como o PT adotou, não poderá ser ignorada por nenhuma política nacional daqui para a frente. Já o discurso estatizante, além de falido em outras nações (Cuba, Bloco Socialista, etc), não tem nada que o justifique historicamente. Mesmo aqui no país, teríamos argumentos para condenar uma política estatizante, como o sucesso das teles, da Vale, e de outras empresas que foram privatizadas na época de FHC. Aliás, as críticas do PT às privatizações foram e são apenas ideológicas, sem nenhum elemento prático. As dificuldades atuais da Petrobrás têm muito a ver com a restrição ao capital privado adotado pelo PT, sem dúvida alguma. Isto é um fato. Mas o PT mantém esta política por questões ideológicas (mais uma vez) – combate ao capitalismo, mesmo que não haja comprovação de seu sucesso histórico.
A chamada esquerda não abre mão destas políticas por achar que a mudança do caráter do estado é a sua missão. Mudar o estado, reduzir as desigualdades, sufocar o capitalismo, exceto aquele que aderir ao seu projeto, tipo Odebrecht. Mudar o estado, é o mantra político e ideológico. Esta é a sua ideologia, é o que permeia sua política. Para os intelectuais deste time, aderir ao povo, aos mais necessitados, purgar seu pecado original de ser classe média, pequeno burguês, se parecerem com Lula, e chegarem perto do céu. Para Lula, é conseguir (sem armas) o que a história recente não conseguiu (com armas), e entrar para a história como o grande Bolivar brasileiro. O risco atual de ser preso e este seu projeto afundar a mil metros de profundidade, leva-o e aos seus intelectuais à quase loucura, e à agressividade sem precedentes.
Nem todos intelectuais, graduados ou não, tem esta visão fechada. Muitos ficam pela metade, e outros tem o domínio de todo processo. Mas, para todos, enquanto não enxergarem a falência histórica dos projetos tipo Cuba e mais recente, o bolivarianismo da Venezuela, Equador, etc., não aceitarão o outro lado, custe o que custar. Repito, nunca estiveram tão perto do céu.
Já o outro lado, no qual me incluo, tem por referência histórica sociedades bem-sucedidas. Os países da Europa, da América do Norte, funcionam satisfatoriamente, com desigualdades infinitamente inferiores às existentes no nosso país e nos outros citados. Cuba é um caso à parte: a pobreza é socializada, não apenas devido ao bloqueio americano, todos sabem, mas não se compara com as democracias citadas. Assim, o avanço do Brasil em termos econômicos e políticos, para este lado de cá, não passa por nenhuma ruptura, não prevê mudança do caráter do estado, estatização de empresas, controle do Congresso, revolução cultural (como está sendo processada silenciosamente). Não pretendemos ser uma Venezuela, apenas crescer dentro de um sistema claro e vencedor, que é o capitalismo – que pode variar de acordo com as condições nacionais.
A faca nos dentes atual indica a proximidade de um ponto de ruptura, e os petistas, não os dirigentes, para quem isto está claro, mas os intelectuais graúdos e miúdos, precisam deixar isto claro para eles e para seus seguidores. TOMAR O ESTADO, MUDAR O ESTADO, é seu objetivo. Não é a democracia, o estado de direito, o respeito às instituições. Não, isso é o meio, é a forma. A campanha de Dilma em 2014, o estelionato eleitoral, é a evidência mais atual desta afirmação. Vale tudo para ganhar.
Portanto, os intelectuais petistas (este é o assunto aqui) tem de assumir que seu ódio mortal, sua agressividade, reporta à resistência dos democratas à sua intenção de domínio do estado.
Prezado Afranio,
Já que você esclareceu de que lado está, também irei revelar o meu. Embora não seja filiado, posso ser considerado um petista. Dito isso, gostaria de explicitar que concordo com muitos dos pontos que você coloca sobre a necessidade de uma dinâmica econômica satisfatória para sustentar um Estado de Bem-Estar Social (EBES). Sempre digo a meus alunos, um EBES custa caro! Como chegar a isso, porém, é algo que me parece muito mais complicado de responder! Espero não ser um problema citar aqui, mas publiquei em 2013 um artiguinho no Boletim da UFMG (https://www.ufmg.br/boletim/bol1821/2.shtml) no qual pontuei algumas coisas que vão ao encontro de várias das tuas considerações. Me permita reproduzir dois parágrafos do meu texto:
[Devemos aprender com a história e com os exemplos contemporâneos. Há algumas décadas, muitos cientistas sociais têm pesquisado o chamado Estado do Bem-estar Social (Ebes). Um dos problemas analisados se refere ao financiamento das políticas sociais necessárias à sua fundação e à sua manutenção. James O’Connor, nos anos 1970, já chamava a atenção dos leitores de seu então famoso livro, A crise fiscal do estado capitalista, para as dificuldades de financiamento de políticas públicas por parte de um Estado que busca atender demandas diversas em uma sociedade complexa.]
[O aprofundamento do processo de desenvolvimento social exige que a economia brasileira dê novos saltos tecnológicos para alcançar um padrão semelhante àquele dos países europeus citados acima (bem como o dos EUA e o de algumas nações asiáticas, em especial a Coreia do Sul). Para tanto, temos que avançar muito no processo de inovação tecnológica.]
Todavia, tenho muitas dúvidas sobre a eficácia das políticas liberais no Brasil. Se olhamos a história brasileira, os grandes saltos não se deram em momentos de hegemonia de políticas econômicas liberais, mas sim quando houve um dirigismo virtuoso do Estado. Em vários países, um padrão elevado de desenvolvimento foi alcançado a partir de políticas econômicas nada liberais. Os estudos de Alice Amsden (professora de economia do MIT, falecida em 2012), em particular sobre a Coréia do Sul, mostram fortes evidências de que os saltos tecnológicos e de renda resultaram de políticas econômicas marcadas por forte dirigismo estatal. Já Mariana Mazzucato (em particular em seu livro “O Estado Empreendedor”), professora de economia da Universidade de Sussex, mostra que vários saltos tecnológicos, mesmo em países supostamente liberais como os EUA, se devem ao dirigismo estatal (sabemos, também, que países onde o EBES alcançou padrões mais profundos, como Suécia e Noruega, estão muito longe do modelo liberal). Assim, na minha opinião, precisamos construir um programa de políticas de desenvolvimento com base em um dirigismo estatal virtuoso, mas sei que isso não é fácil de se fazer (no livro de Peter Evans, “Autonomia e Parceria: Estados e Transformação Industrial”, penso que encontramos indicações de caminhos possíveis; temos também, pelo menos, um exemplo empírico importante no Brasil, qual seja, a relação virtuosa entre a EMBRAPA, alguns campi universitários rurais e os produtores agropecuários, mas é importante reconhecer que só recentemente a EMBRAPA passou a investir um pouco mais em P&D de produtos mais típicos do agricultor familiar; não é à toa que, no seu livro sobre a economia brasileira, o Prof. Werner Baer, da Universidade de Illinois, costumava ressaltar que a produtividade da mandioca no Brasil era declinante, não sei como ele trata isso nas novas edições do livro, já faz tempo que não o leio). Penso que Dilma foi particularmente incompetente ao tentar fazê-lo, mas acredito que há exemplos importantes de intervenção nos governos de Lula que não devem ser esquecidos. Para chegarmos a isso, acho que ajudaria muito se pudéssemos ter no Brasil um debate intelectual aberto e respeitoso como o que estamos tendo aqui. Infelizmente, o que tenho visto é o inverso disso (como o artigo de João e ou meu comentário explicitam), um enfrentamento dominado pelo ódio mútuo.
Continuo sem entender como se dá essa “cegueira” relativa de certos intelectuais, que, em tese, deveriam ter muito mais informação e capacidade analítica. É uma discussão antiga. O historiador Tony Judt mostra claramente a cegueira do historiador Eric Hobsbawm relativa ao que ocorria na União Soviética enquanto ele escrevia; sobre a cegueira de Sartre em relação à União Soviética há muitas páginas. E, na minha esfera, Joan Robinson se desmoralizou politicamente ao publicar um livrinho de entusiástica defesa da Revolução Cultural de Mao. Acho que em geral continuamos sem entender esses intelectuais que hoje defendem o lulo-petismo, e assim não sabemos como lidar com eles: argumentos racionais funcionam apenas em parte (já que há intelectuais importantes que deixaram o PT).
PS – Não posso deixar de informar, a propósito, que sou membro da tal “horda” supostamente fascinada pelo ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso. Faço parte dessa horda desde que ele foi Ministro da Fazenda e começou a por em ação o Plano Real. Claro que acho que meus motivos são racionais. E continuo nessa horda até hoje, quando ele ainda é o mais lúcido e sensato dentre intelectuais e/ou políticos brasileiros.
PS2 – No parágrafo 5, há um erro tipográfico: é “venceram” (e não “ vencerem”}.
Concordo plenamente com a réplica Jorge Alexandre.
João gostei do seu artigo, como também da reflexão de Jorge Alexandre. Se mantivermos esse nível de dicotomia podemos caminhar para a guerra (barbárie) retirar a Dilma não resolve, pois o caminho ficaria livre para Temer (que já começou a preparação de um novo programa de governo junto com Serra, outra raposa velha, que sobrou da época da Ditadura). Lula não é o único vilão. O próprio conceito de capitalismo a brasileira em que os empresários só sabem investir se receberem subsídio do governo dá vazão a esse esquema nojento de propinas. É preciso definir um programa de recuperação, dando continuidade e apoio à Lava Jato (que também cometeu alguns erros). Por incrível que possa parecer, somente um parlamentar, Magno Malta (pois ele é da apedrejada bancada dos evangélicos) propôs isso. Quem é que vai dar o primeiro passo? Não sou intelectual, nem tenho mestrado nem coisa alguma, participei sim dos famigerados secundaristas PL que lutaram contra a Ditadura.
Caro Jorge Alexandre Neves
Concordo com você quanto às limitações e até impossibilidade de um desenvolvimento nacional com uma política liberal pura. Não há como esquecer, como Celso Furtado dizia (segundo Maria da Conceição Tavares), o país criou seus grandes esteios economicos com a intervenção estatal, como a Petrobrás, a CSN, e o polo de S.J. do Rio Preto com a Embraer, e alguns poucos outros. Acredito nisso, inclusive se pensamos no nordeste, com poucas chances de caminhar sozinho.Mas não acredito que o PT tenha esta visão. Eu endosso seus comentários, mas eles são economicos, principalmente, e aí há muito o que discutir sobre este país gigantesco e com imensas possibilidades de auto-desenvolvimento. Minhas discordancias com o PT são políticas. Participei do movimento pela sua fundação aqui em Recife, e , antes disso, tive uma militancia de vários anos em organização de esquerda, como tambem li bastante sobre a trajetória desta esquerda da qual fiz parte. Assim, percebo seus passos e entendo seus motivos rapidamente. O governo Lula, como eu disse acima, deixou um legado social que nunca vai poder ser ignorado, mas seus planos não coincidem com os que você comenta. O mensalão e o petrolão não são acidentes de percurso, circunstanciais. Estão ligados a um projeto de poder, de domínio, estranhos à prática democrática. Nada importa para os petistas, se eles se mantem no poder. Isto está no seu DNA, tenha certeza.
Prezado Afrani,
Quanto à relação dos indivíduos com o poder político, desde que li ensaios como “O Príncipe” de Maquiavel, “A Política como Vocação” de Weber e “A Lei de Ferro da Oligarquia” (que também conta com uma tradução de “A Lei de Bronze…”, não domino o alemão, então…; na verdade é um capítulo de um livro intitulado “Sociologia dos Partidos Políticos”) de Michels, me tornei talvez um pouco cínico na observação da política e não consigo ver nada tão estranho (quando comparado aos demais) no chamado “projeto de poder” do PT.
Quanto à questão econômica, analisando dados que estou incluindo em um livro que estou escrevendo, pude observar que durante o governo de FHC a taxa de crescimento do PIB brasileiro foi 75% da taxa de crescimento do PIB mundial, enquanto que no governo de Lula ela foi de 111%. É óbvio que precisarei refinar mais, em termos estatísticos, a minha análise. De qualquer forma, acredito que já temos aí uma pequena evidência de que o dirigismo estatal protagonizado por Lula teve lá suas virtudes. Dilma, infelizmente, enfiou os pés pelas mãos e errou muito em termos de política econômica (e também na gestão da sua coalizão política, se afastando do que você vê como o maior dos vícios do PT; acho que ela teve a melhor das intenções, mas disso o inferno já está cheio).
As discussões no interior das paredes que regem o pode politico de nossos mais parecem brigas em estadio de futebol: O time de fulano é o melhor unicamente por ser seu time e quando o juiz rouba contra é crime mas se rouba a favor não foi nada.