David Hulak

Perdemos mais um: o manso e profícuo Carlos Fernando.

Não quero fazer um necrológio, juro. Tentarei chamar a atenção dos que lerem isso para um grande brasileiro que não é celebridade.

Compositor de alta qualidade, parceiro de outros como ele.

Muitos, mesmo sem saber, cantaram e dançaram as suas obras.

Comecei por “um manso” no sentido que aprendi com amigos cristãos.

Era um grande convivente. Conversar era uma arte que ele cultivou.

Falava de si, das coisas do mundo. Contava histórias hilariantes e tinha uma enorme capacidade de ouvir os seus interlocutores.

Ativo militante político e cultural (seja lá o que isto queira dizer) sempre indignado com a exploração, o cinismo, os malfeitos, mas sem espumar pela boca. Nunca o vi odiento.

Conheci-o no MCP, nas conversas de botequim em Olinda, no Recife e no Rio. Estivemos juntos na origem do Siri na Lata, na Casa de Caruaru que houve nas Graças.

Nos últimos anos nos víamos pouco por contingencias dessa vida isolacionista. Acho que como eu não feicebucava. Mas sempre, no baile do Siri, enquanto todos se esbaldavam saiamos do camarote para por o papo em dia. No deste ano ele não chegou a ir. Já estava doente e agora fiquei sabendo que então estava no hospital.

Espantava-me a sua sincera humildade demonstrada pela voz e pelo corporal. Sempre lembro como ele agradeceu a inclusão de “Aquela Rosa” num espetáculo chamado Memórias de Dois Cantadores que montamos no TPN, eu mais Hugo Caldas e Silvio Batuchansky.

Lembrava que havia sido a primeira vez que uma música sua estava em espetáculo e cantada por Teca Calazans.

Magine Só: ele agradeceu quando nós é deveríamos ser-lhe gratos por ele permitir usar aquela lindeza.

Não sei se o ECAD transferiu para ele o que recolhemos. Nem sei se o fez com rigor ao longo de sua carreira. Ele não ficou rico com o seu ofício. Deveria ser ao menos, por conta dele, um remediado de classe média, mas precisava ralar em outras labutas.

Escrevo tudo isso para que possamos armar uma conspiração tipo “do not forget”.

Ao longo desta semana, talvez a tal mídia de massas toque no assunto e quando do seu centenário haja um “especial” e o Prefeito de Caruaru aponha uma placa.

Enquanto isso toquemos os discos com as suas músicas, cantemos suas parcerias com Alceu e “Geraldim”, por exemplo; programemos Carlos Fernando em botequins que fazem cantorias como o Retalhos e outros que não conheço.

Quem tiver algo para contar sobre ele, dane na “Será?”.

É não deixar a peteca cair. Para nossa alegria, a de nossos filhos e netos e do povo em geral. Ele, modestamente, agradeceria.

Evoé.