Elimar Pinheiro do Nascimento
Professor do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Sustentável, Universidade de Brasília
Sei que a maioria dos brasileiros está otimista ou esperançoso com o governo que começa. E a criticidade da situação econômica, não enseja outros sentimentos. Imagina-se que a situação é tão ruim que nada poderá ser pior. Contudo, a incerteza é o que impera entre nós. Quem poderia pensar que um presidente da Câmara conhecido como corrupto fosse ser substituído por um paspalhão, conhecido agora como Zé (a)nulidade? Por isso, toda precaução é pouca.
Não é do meu feitio desarrumar festas alheias. Sinto-me, porém, na obrigação de citar alguns senões neste processo politico que se inicia hoje, quinta, 12 de maio. Começando pelo folclórico.
Fiquei surpreso que nada de extraordinário aconteceu entre quarta e quinta feira. Tudo transcorreu conforme o script. Não houve briga no senado, não houve quebra-quebra nas ruas, nem as “massas” vieram se despedir da Presidente. A marcha do Palácio do Planalto ao Palácio da Alvorada gorou. O número de pessoas em frente ao Congresso na noite de quarta e madrugada de quinta era pequeno, e pela primeira vez os adeptos de Dilma eram maioria. Houve empurrões, insultos e pequenas brigas aqui e acolá, sobretudo em São Paulo. Exceções que confirmam a regra. Muito positivo, mostra que a cultura política democrática não morreu, como imaginavam alguns. Os ritos estão sendo observados.
Contudo, faltou recato, como diz Josias de Souza, a troupe do Temer na chegada ao Palácio do Planalto. É o mínimo que se pode dizer. Um processo de impeachment é sempre traumático para um país. Não é algo normal, nem muito menos banal. Exige-se sobriedade. Fechando os olhos veio-me na mente uma ceia medieval, em que um bando de homens come com as mãos e limpa a boca com as mangas do casaco. Lastimável.
Faltaram mulheres no novo ministério. Zero. É o sinal do machismo que reina na política. Não ter nenhuma mulher no ministério é no mínimo uma falta de sensibilidade com as mudanças do tempo. E um sinal de que talvez os novos tempos não sejam compreendidos pelo Presidente em exercício. Imperdoável. E para completar faltaram negros. Fiquei com uma impressão de um governo dos anos 1950.
Faltou racionalidade no enxugamento do Ministério. Não tem sentido dissolver o ministério da cultura na educação e manter o ministério do turismo. Ambos, e mais o esporte, deveriam estar sob um novo ministério: o da economia criativa. Qual a função relevante do ministério da integração? Ou do Trabalho? Porque a comunicação vai contaminar o ambiente de ciência e tecnologia, e não integra o de transporte? Por que indústria não se integra com Minas e Energia? Enfim, possibilidades distintas da que foi adotada. Sem dúvida a decisão não foi pensada, talvez pela pressa.
Excedeu-se em políticos. E velhos e maus políticos. A cara do Parlamento. Muitos já pertenciam ou pertenceram aos governos pretéritos. Muitos estão na politica por negócios. Vários investigados. Suspeitos. Amanhã réus. A fama da grande parte é a pior possível. Em cada um de seus respectivos estados a fama é de homens de negociatas, de corrupção e outros mais. Não todos, mas a maioria. Ruim. Decepciona parte da opinião pública, que pensava, ou almejava, um governo de competência e não de simples arranjo.
A situação econômica é desastrosa e não será fácil fazer o País retomar o crescimento. A recessão é forte e o desequilíbrio das contas públicas é imenso. A receita cai e a dívida pública sobe, a cada dia. O número de desempregados ainda deve crescer. E a má qualidade dos serviços públicos tem deixado o povo absolutamente insatisfeito. Insatisfação que se voltará para o atual governo se algo importante não for feito. Lembremo-nos que os tempos administrativo e politico nem sempre são compatíveis. E se as ruas se rebelarem a pressão sobre o Parlamento crescerá, aumentando as chances que votos mudem de direção. Alto risco.
A troupe do Temer chegou como se tudo estivesse resolvido. Será? Talvez eu seja um dos poucos que, se opondo ao governo Dilma, não acredita que o passado está enterrado e a Dilma é carta fora do baralho. Estranho esta reflexão porque afinal a admissibilidade foi aprovada largamente. Era necessário apenas 41 e foram 55 votos. Um a mais de um terço necessário ao impeachment. Como faltaram 3 e sabe-se que destes três um será favorável ao impeachment, afinal seu filho foi nomeado ministro, outro, o substituo do Delcídio, provavelmente será contra pelas amizades com a troupe do Lula, e o terceiro está desgostoso porque não foi contemplado, tendo sido apeado do ministério da Dilma, pode-se afirmar que bastam três dos 55 votarem contra o impeachment para Dilma voltar. Impossível? Talvez. Mas não estou convencido. Já vimos de tudo recentemente no Brasil. Coisas que nunca imaginávamos. E uma surpresa a mais não deveria nos espantar.
Finalmente, há uma variável independente: a lava jato. Vários dos peemedebistas, e eles são um terço do governo, estão na linha de tiro. E entre elas figuras importantes, como o ministro do Planejamento. E se Cunha, ou outro, resolve fazer uma delação premiada, o presidente em exercício não será contaminado? Ademais há um processo no TSE com indícios claros de propina da Petrobrás na chapa vencedora da qual participava o presidente em exercício. Ou seja, dinheiro escuso.
Há muitas incertezas e nuvem carregadas, para ficarmos simplesmente otimistas. Esperançosos talvez, mas com parcimônia, pois, a situação é grave e os atores, medíocres.
PS. Neste mesmo dia enviei um artigo para o blog da politica brasileira, de título – Os desafios do governo Temer (mas as vezes o editor inventa de mudar o titulo), chamando a atenção para o que espera o governo Temer em três esferas, o da economia, o da governabilidade e o da opinião pública.
Governantes exageram nos seus personalismos carregados de desvios. Abafam seus comprometimentos espúrios e escandalosos. Os interesses pessoais (e de grupos) estão acima dos da sociedade. No fundo, os partidos precisam se democratizar. Eles existem e sobrevivem imperialmente. Reinam para eles mesmos.
Caro Elimar
Diante da gravidade da crise econômica e das enormes incertezas políticas que você enunciou no artigo, me parece desproporcional e extemporânea a sua preocupação com a ausência de mulheres ou negros no ministério de Temer. Claro que a composição do ministério é ruim, pelas mesmas razões que o era no governo Dilma, e completamente independente do sexo ou cor da pele dos seus membros. Aliás, se existisse algum nexo entre sexo e competência, o que poderia ser concluído da experiência da primeira mulher presidente do Brasil? Você acha que Temer deveria ter posto uma mulher no ministério só para mostrar que tinha sensibilidade, quando o que vai dominar nesta gestão é a política macroeconômica? Eu não acho. Poderia ser pior, um simples cargo “pra dizer que não falei de flores”.
Você lembra a frase emblemática do assessor de Clinton na campanha contra George Bush pai?: “É a economia, imbecil!” (imbecil é o Bush, claro) Isso vale para o Brasil de hoje: o que predomina na crise e o que determina o futuro próximo do Brasil é a economia. A economia do Brasil está na UTI e vamos exigir agora que a equipe médica tenha negro e mulher? O que interessa neste momento é a condução da política macroeconômica. Como disse a Opinião da “Revista Sera?”, o Brasil presisa agora de um contador que saiba fazer contas e conheça a diferença entre receita e despesa, porque, se não tivermos um avanço, mesmo pequeno, na recuperação econômica, o Brasil vai continuar afundando, branco, preto, índio, mulher, e viado, nordestino e sulista, pobre e rico (não, os ricos pegam o avião e vão pra Miami). A manchete do jornal O povo de hoje foi bem instigante: “Não tem cearense no ministério”. Ah, bom, tem pernambucano demais! O que eu quero saber agora é quem é o contador e como vai tirar o Brasil da UTI. E acho que o Meirelles é um bom contador (Lula também acha, mas Dilma simplesmente “não gostava dele”). As grandes decisões políticas devem ser preparadas e amadurecidas para a disputa em 2018. Eu não acho, como dizem alguns, que ajuste fiscal é coisa da direita liberal, o equilibrio fiscal não tem ideologia. Mas, mesmo quem pensa assim deveria deixar os liberais equilibrarem a economia enquanto se preparam e criam musculatura para o confronto ideológico de 2018.
Acho que você tem razão em afirmar que “o passado não está enterrado e a Dilma (não) é carta fora do baralho”. Acho difícil que ela volte. Mas acho que tudo depende da politica macroeconômica e sua capacidade em deter o processo de afundamento da economia brasileira.
Grande abraço, Sergio
Sergio. No meu artigo começo dizendo que vou começa pelo menor, pelo folclórico – a ausência de mulheres e negros no ministério. Acho que errei. Não é menor. A presença de pessoas competentes com gênero e etnias diferentes é muito importante. Simbólico sem dúvida, mas essencial. Não acho que se trata de colocar por colocar. Não! Trata-se de ver entre as mulheres e os negros competentes quais poderiam integrar o ministério. E são muitos. É uma questão de símbolo, de gesto. De atitude de respeito e deferência com a diversidade. E este, em política, é tudo. E um traço marcante de nossa contemporaneidade, por isso afirmei que o ministério tem a cara dos anos 1950. Sensibilidade política que a Dilma não tinha – não perdia tempo em conversar com um deputados desgostoso – e o Temer tem. Errou ao fundir cultura com Educação (imensa), mas logo tentou corrigir em parte quando sentiu que a sociedade reclamava, leia-se, artistas, poucos mas ultra relevantes na sociedade do espetáculo que somos contemporaneamente.
Minhas dúvidas em relação ao governo Temer vai no, entanto, muito alem de nao ter mulheres ou negros em seu ministério. E uma deles está em seu comentário. A economia é tudo. Defendo que a economia é central hoje, mas não será resolvida se não houver governabilidade e não houver legitimidade do governo. Temer tem um dígito de apoio na opinião pública e digo claramente se não sinalizar corretamente a saída de crise o povo volta as ruas, e sua governabilidade começa a ficar abalada, e sem ela não ha Meirelles que possa resolver. Portanto são três arenas de luta e não uma ou duas, e elas se retroalimenta.
Este é um governo de transição muito frágil. E se não acertar cai ou nos leva para uma situação ainda pior, por incrível que pareça. Se acertar se consolida e inicia a nos tirar do buraco que a Dilma nos legou por sua incompetência, mas também por sua arrogância. Esta é uma armadilha que este governo não pode cair. Vamos em frente!
PARABÉNS ELIMAR E SÉRGIO, EMBORA NÃO CONCORDE COM TUDO QUE VOCÊS ESCREVERAM GOSTEI DOS ARTIGOS. ACHO QUE OS DOIS TEM ALGUNS PONTOS CORRETOS. MAS NÃO ACREDITO QUE ESTE GOVERNO TENHA CAPACIDADE PARA COLOCAR A ECONOMIA NA DIREÇÃO CERTA AFIM DE FAVORECER O POVO.COM ELE TEREMOS MUITO APERTO PARA OS MAIS NECESSITADOS.OS TRABALHADORES É QUE VÃO PAGAR O PATO.
GRANDE ABRAÇOS AOS DOIS.
Obrigado pela nota Elzimar. Esta é uma aposta boa: o governo irá ou não equilibrar as contas publicas e permitir a retomada do crescimento com redução do desemprego, sem destruir os bons programas sociais existentes. Só saberemos que tem tem razao daqui há um ano, caso a Dilma não volte ao governo.
Elimar e Elzimar.
Sair da crise econômica ou pelo menos enveredar por um caminho que retome o crescimento é possível, sim. Agora de forma a favorecer o povo, as camadas mais necessitadas da população, não dá para acreditar. Vão usar e abusar do argumento de que “é preciso sacrifícios” para justificar suas decisões. As medidas contra o povo terão sempre a “justificativa” do combate à crise. Embora por questões políticas possam não utilizar a expressão,vão se valer da máxima do Delfim Neto de que é preciso “primeiro fazer o bolo crescer para depois dividi-lo”.
Mas de modo geral não acho que o problema maior seja o econômico.Não basta chamar o contador.O problema maior do país é político. Pelo tamanho da corja que compõe o Congresso e está entrando no executivo não dá para esperar grande coisa pelo menos no curto prazo. E afirmo isso não porque deposite crédito caso a Dilma volte.A questão agora não é o dilema, Dilma ou Temer. Os que defendem o desenvolvimento com melhoria da vida dos mais necessitados que formam a grande maioria da população terão que construir uma alternativa, um outro caminho. E isso é um processo longo!
Concordo com o Cristovam Buarque quando afirmou em entrevista recente: “O desespero maior vai demorar, mas a crise financeira a gente começa a sair em poucos meses. Agora, a crise brasileira, de uma política que não funciona, de uma desigualdade que resiste a tudo, de corrupção generalizada. Essa, nós vamos necessitar de décadas para superar. Décadas! Se começarmos rápido”.
PB
Oi Elimar
Alguém já disse que esse governo é a volta dos que nunca se foram, por isso o ministério tem a cara dos anos 1950.
Abraços para Cristina e Elzimar.