Parte da imprensa internacional não consegue entender porque a maioria da população desfechou um tremendo ”Golpe do voto” no PT e não teve o mesmo rigor com os outros sócios da chamada corrupção sistêmica, que foi revelada na operação Lava a Jato. Artigos assinados e matérias informativas dos mais credenciados órgãos de imprensa do mundo ocidental reconhecem que o PT perdeu 60% do número de Prefeituras do Brasil, com repercussão maior nas cidades mais industrializadas.
Uma dúvida que aparece na mídia de alguns países é se a punição foi apenas ao PT ou ocorreu um veto à corrupção como um todo. Isso porque, outros partidos, fortemente vinculados aos processos de corrupção, não tiveram o mesmo percentual de perda da legenda petista. O caso do Partido Popular (PP), legenda campeã em citações na Lava a Jato, conseguiu até aumentar o número de prefeituras. Da mesma forma, o PMDB, sócio preferencial dos negócios ilícitos, manteve a sua tradicional performance na conquista de municipalidades. Não é difícil entender as razões dessa aparente contradição na leitura seletiva do eleitorado a respeito da punição aos agentes responsáveis pelo esgarçamento moral do sistema político do país. O PT teve, por 13 anos, a hegemonia da Presidência da República, que é de longe o símbolo de maior visibilidade junto à população. Além disso, o PT nasceu com um discurso radical de mudança nos valores tradicionais da política oligárquica no Brasil. Um discurso alimentado por um líder carismático, que fez sua carreira estimulando a polarização entre os puros e os impuros, ou, de forma mais precisa, entre a elite predatória e o povo honesto e trabalhador. Tal discurso, quando traído pela prática, de forma tão abusiva, tende a ter uma reação avassaladora no imaginário do eleitorado. O veredito popular é, quase sempre, proporcional ao tamanho do esbulho, que se materializa na maior ou menor identidade que cada agrupamento conseguiu amealhar na sua trajetória política. O PMDB já foi vítima dessa vindita popular, ao decepcionar a população, como fiador da chamada Nova República. Depois do fracasso da Nova República, o partido desistiu de ter a hegemonia presidencial e passou a ser, apenas, um instrumento fisiológico de sustentação a qualquer governo, a um custo ético muito elevado, que já não tem nada a ver com o partido da resistência ao regime militar.
Relatório recente do Fórum Econômico Mundial constata que o Brasil se tornou a quarta nação mais corrupta do mundo, atrás apenas do Chade, da Bolívia e da Venezuela, conclusão tirada com base em uma pesquisa com 15 mil empresários, localizados em cerca de 140 países. Acrescente a esse quadro a invencionice na condução da política econômica do governo Dilma, com consequências devastadoras, tanto na imagem do partido como nas condições de vida de milhões de brasileiros. Pesquisa recém-divulgada pela empresa “Tendência” revela que a herança deixada pela má gestão do PT está levando o país a um retrocesso social imenso, com a pobreza tendendo a aumentar nos próximos nove anos, mesmo que haja uma melhora do crescimento econômico. Portanto, não é de admirar que o protagonista principal dessa combinação explosiva – corrupção com retrocesso econômico – não tivesse o julgamento rigoroso por parte da maioria do eleitorado, principalmente da parcela localizada nos grandes centros urbanos.
(*) Sociólogo, pesquisador do Centro Josué de Castro
Zé Arlindo,
Menos pelo aparente “isolamento” da montanha e mais por uma questão de escolha de temas aos quais me dedicar, afastei-me muito da discussão política nos últimos tempos. Acompanho sim, o que vale a pena, na imprensa. Na sexta que antecedeu as eleições municipais e na última, o caderno especial do Valor Econômico (o de hoje ainda não li) fez matérias com muitos cientistas políticos. Mas digo: esse teu curto artigo é dos melhores que li. Parabens!
Caro Zé Arlindo, acrescento que a percepção popular se agudizou ainda mais pela necessidade da ex-presidente de esgarçar a verdade durante a campanha eleitoral presidencial.
Muito obrigado Teresa, mesmo sabendo que você é sempre criteriosa, mas, no caso, de seu elogio tem que que dá o desconto de vir de uma grande amiga.
Síntese perfeita da revanche popular dessa eleição. A vingança das massas. Muito bom Zé Arlindo.
Excelente artigo! Análise exata do recado deixado pelos eleitores. Parabéns!
Coloquei abaixo os números: de fato o PT perdeu 61% de seu eleitorado entre 2012 e 2016. E como proporcionalmente conseguiu levar menos candidatos para o segundo turno, sua perda relativa vai se agravar. Entre as grandes cidades, só no Recife o PT conseguiu levar candidato para o segundo turno. O encolhimento do PT foi a maior surpresa dessas eleições; o eleitorado tendeu para o “centro” em torno do PSDB e PMDB. É verdade que o PT foi o mais visível nos escândalos do propinoduto, pois seus principais líderes são condenados ou réus, e o partido insiste em declará-los “herois do povo brasileiro” ou “guerreira do povo brasileiro” (o que evidentemente aumenta a notoriedade dos corruptos). O caso do PP é antigo, na medida em que é mais que sabido que se Paulo Maluf puser o pé fora do Brasil será preso pela Interpol. Mas no caso do PP, e também do PMDB, os envolvidos no propinoduto não tiveram tanta visibilidade, e nem ficou tão claro quanto no caso do PT que o desvio de dinheiro público, seja no Mensalão, no Petrolão, ou na maquiagem das contas públicas pela ex-Presidente, era antes de tudo parte de um projeto de controle da máquina estatal para eternizar-se no poder. Dito isso, não creio que a investigação da corrupção tenha determinado o grosso do deslocamento eleitoral. Se a economia estivesse tão bem como esteve durante o desperdiçado boom de commodities, duvido que o deslocamento eleitoral fosse tão grande. O PT foi punido, também por suas ideias erradas, pela adoção de políticas públicas de forma errática e até contraditória, que trouxe inflação, recessão e desemprego. Foram essas políticas erradas, denunciadas por todos os economistas exceto a dúzia dos heterodoxos mais conhecidos há muito identificados, que trouxeram uma inflação que não responde nem à taxa de juros nem à recessão, e que deixará de subir e recuará quando houver ordem nas contas públicas
Número de prefeitos eleitos
10 maiores partidos – 1o. turno
2012 2016
PMDB 1.042 1.027
PSDB 718 791
PT 655 256
PSD 501 537
PP 472 494
PSB 446 412
PDT 320 334
DEM 280 265
PTB 297 261
PR 277 294
O PT se dizia o partido da ética, mas fez tudo ao contrário e está pagando caro por seus erros e crimes. Todos sabemos que não foi este partido que inventou a corrupção e infelizmente existe no mundo todo, mas da forma como foi feita para se manter no poder, partindo de um partido que só sabia bater em quem estava no poder, para poder chegar a ele, tinha que acabar desta forma. Teve o apoio do povo e a maioria absoluta no Congresso para mudar a cara do Brasil e preferiu não pensar no país. Nada mais do que justo, que pague um preço mais elevado como coordenador da quadrilha. Os outros pagarão em seguida por seus crimes, mas primeiro os grandes responsáveis e o povo soube julgar rápido. Que punam os agregados também.
Texto sintético, claro, de lucidez analítica própria ao fenômeno da sociopolítica brasileira recente e presente que alerta para a urgência da necessidade de mudança qualitativa do modo de fazer política e partidos…talvez tanto quanto importante sinaliza o somatório dos votos nulos, em branco e o volume do absenteísmo espontâneo às sessões eleitorais.