A eleição de Donald Trump presidente dos Estados Unidos parece um surto psicótico do povo norte-americano que, com grande maioria, entrega os destinos da nação e, indiretamente, do mundo, a um homem mentiroso, desequilibrado, racista, xenófobo, machista e isolacionista. Depois de oito anos da elegância política de Barak Obama o mundo vai conviver agora com este fanfarrão, grosseiro e desegante. A vitória da insensatez dividiu gravemente o país e criou um fosso profundo entre os Estados e segmentos econômicos avançados e o restante dos atrasados e ressentidos com a crise e a globalização. Embora, ao contrário do que se pensava, também foram milhões de pessoas cultas, mulheres, negros e latinos, agredidos pelos discursos boçais do milionário, que votaram e ajudaram a eleger Trump. Vitória do populismo, do discurso simplista, patriótico e agressivo, Trump se elegeu contra a assustada elite do conservador Partido Republicano, dobrou a grande imprensa e os formadores de opinião se comunicando direto com Holmer Simpson. Se a eleição de Trump é um desmantelo para os Estados Unidos, em se tratando da maior potência econômica, política e militar, o delírio do povo norte-americano é um ameaça para o mundo, de imediato para a economia global altamente integrada e interdependente e já vivendo uma persistente recessão. É possível que o presidente Trump não possa fazer toda promessa ridícula feita na campanha – revisão dos acordos comerciais, taxação dos produtos chineses, construção do muro separando o México, e a proibição da entrada de muçulmanos – mas assusta saber que a maioria do povo americano apostava nessas insensatas e irresponsáveis promessas. Como bem definiu a jornalista Mafalda Anjos (Revista Visão), “Trump é isso tudo. Simplista, básico, mentiroso. Mas ele é, também, o grande espelho da América real. Do multicultural, complexo e contraditório circo americano”.
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Comentar surpresas no calor da hora é difícil. E não é que, quando aparece uma oportunidade, aflora no Brasil o anti-imperialismo, o velho anti-imperialismo do tempo da guerra fria? 1. Não é império, ou, se quisermos usar o chavão, não é ó único. 2. Não surtou não. Foi um “voto racional”, sobretudo de uma classe média branca, trabalhadora, sem educação superior, com fé em deus (o dos protestantes e evangélicos de regrinhas comportamentais medievais), com muita raiva de estarem “esquecidos”, de não terem melhorado nada com a globalização. Racional porque votaram acreditando que obterão benefícios com o programa populista, nacionalista e protecionista. Acreditaram que, contra a globalização, “a América terá de volta sua grandiosidade”, gritando o refrão “to make America great again”. É a mesma ilusão dos que aprovaram os programas populistas de nacional-desenvolvimento em países latino-americanos. A incerteza é grande, ainda que hoje já tenham aparecido previsões de aumento da inflação nos EUA. Mas estou mais em linha com José Serra: “Treino é treino, jogo é jogo.”
Endosso cada vírgula, Helga. Retrocesso é sempre um sentimento pungente onde quer que ocorra, mas causa calafrios especiais quando emanam dos EUA, e não da Coréia do Norte ou da Bolívia.
Trump é sim a outra face da moeda populista que grassou por aqui como erva-daninha. É difícil, ademais, para boa parte da humanidade, entender que ela integra uma maioria que só mudará de patamar de vida se ceder à educação de qualidade.
Esses eleitores a que você aludiu, são os arautos da chamada invejá má, aqueles que ficam vendo o desfile de carros alemães pelas estradas e se dizem “onde está o meu?”.
Quebrar essa inércia é obra hercúlea. Mas estou contigo, vamos à base de Serra por enquanto. Vamos ver se, efetivamente, prevalecerá o “nada se parece tanto com governo quanto oposição no governo”.
Helga
É evidente que Trump presidente dos Estados Unidos não pode fazer tudo que alardeou na campanha, como alias diz o editorial: “É possível que o presidente Trump não possa fazer toda promessa ridícula feita na campanha – revisão dos acordos comerciais, taxação dos produtos chineses, construção do muro separando o México, e a proibição da entrada de muçulmanos …”. Mas, se ele fizer 10% dessas desastrosas promessas (e desconfio que muito mais do que isso tentará) o “jogo”, como você fala, vai ser muito desagradável e o resultado final pode ser um desastre. By the way, não gosto nada desta frase de Serra porque indica que, na campanha, deve-se falar o que o eleitorado quer ouvir (pra ganhar, o que importa é ganhar?) e não o que, de fato, se pretende fazer (e não gosto porque acho que ele se comportou assim na campanha pra presidente). Penso que o líder não deve dizer o que querem ouvir, ser o simples porta-voz do eleitorado. O líder deve ajudar a formar a opinião do eleitorado. Espero isso de Serra. O jogo começa no treino.
Sergio, concordo com você que nessa interpretação a frase de Serra é muito ruim, pela conotação de que em campanha vale tudo, até mentira e chantagem. Mas ele usou a frase ante reações estapafúrdias, desesperadas, a prever que o mundo com Trump na presidência dos EUA estaria à beira da desintegração atômica. Interpretei a frase como “calma pessoal, estamos na América Latina, e de qualquer modo um governante nunca consegue fazer tudo o que promete”. Por exemplo, ainda que no FB já circule a imagem de um matuto com formão e tijolo, cara de operário da construção civil desempregado, com legenda “Bora fazê muro”, esse muro de 3 mil e tantos quilômetros não será construído: nem os EUA tem dinheiro pra isso e nem têm como obrigar o México a pagar. Para a América Latina e o Brasil pioraram as perspectivas comerciais nos mercados dos EUA e da Europa, mas aí, como mostra Marcos Jank, é hora de se dedicar mais à Ásia. Como populistas sempre fazem déficit fiscal, já há quem preveja aumento da inflação nos EUA e, assim, mais cedo ou mais tarde, aumento de juros: daí o aumento da taxa de câmbio real/dólar. Quanto às frases com que governantes no mundo inteiro receberam a vitória de Donald Trump, prefiro de longe a da chanceler Angela Merkel.
Sergio Buarque, concordo com você que nessa interpretação a frase de Serra é péssima, pela conotação de que em campanha se pode dizer qualquer coisa, usar mentira e chantagem emocional. Mas ele usou a frase ante reações meio desesperadas, a prever que o mundo com Trump na presidência dos EUA estaria à beira de desaparecer em catástrofe nuclear. Interpretei a frase como “calma pessoal, aqui é América Latina, e nunca um governante consegue fazer tudo o que promete”. Por exemplo, ainda que no Facebook já circule a imagem de um matuto com formão e tijolos, cara de operário da construção civil desempregado, com legenda “Bora fazê muro”, esse muro de 3 mil e tantos km não será construído, nem os EUA tem dinheiro para esse tipo de coisa, e nem têm como obrigar o México a pagar. Para a América Latina e o Brasil pioraram as perspectivas de comércio com os EUA e a Europa, mas aí estou com Marcos Jank: hora de se dedicar mais à Ásia. Como populistas em qualquer ponta do espectro político fazem déficit fiscal, já há previsões de aumento da inflação no EUA e, assim, aumento dos juros: daí o aumento da taxa de câmbio real/ dólar. Quanto às frases com que governantes no mundo inteiro receberam a vitória de Donald Trump, prefiro de longe às da chanceler Angela Merkel.