Editorial

A 8ª turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região , em Porto Alegre, deu um golpe fatal no sistema de delação premiada quando absolveu o ex-tesoureiro do PT-Partido dos Trabalhadores José Vaccari Neto, que tinha sido condenado a 15 anos e três meses pelo juiz Sérgio Moro, pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, argumentando que não existiam provas materiais. De acordo com a sentença do juiz Sérgio Moro, os “depoimentos incriminatórios provêm (…) não de um, mas de cinco delatores, “formando um todo coerente”, depoimentos que resultaram no acordo de delação premiada do Ministério Público e que, portanto, revestem-se de regularidade, legalidade e voluntariedade (exigências da lei correspondente). A decisão do TRF deve ter como consequência a anulação dos termos do acordo de delação premiada, levando, portanto, à suspensão do respectivo prêmio de redução das penas concedido aos delatores. Na verdade, é muito difícil a apresentação de provas materiais de corrupção na medida em que ninguém assina recibo de propina, exceto quando a denúncia for antecipada de armadilhas, como no caso das gravações de Delcídio Amaral e, mais recentemente, de Michel Temer, ou da filmagem da grotesca corrida do deputado Rodrigo Loures pelas ruas com uma mala de dinheiro. A absolvição de Vaccari cria um grave precedente jurídico com repercussão sobre as denúncias já realizadas, levando à absolvição dos acusados e perda do prêmio, e inibe o interesse de potenciais novos delatores. Parece óbvio que delatar não é mais um bom negócio. Quem não abriu o bico até agora vai pensar duas ou três vezes antes de tentar este caminho, incriminando-se na tentativa, muito arriscada, de amenizar a sua pena. E quem delatou, assumindo sua parte da culpa, deve estar profundamente arrependido, até porque o tribunal da segunda instância parece inclinado a elevar as penas dos delatores-confessos. Se a absolvição de Vaccari enfraquece bastante o mecanismo da delação premiada, o generosíssimo prêmio concedido a Joesley Batista, o chefe corruptor que comprou vários políticos, dirigentes públicos e até procuradores, desmoraliza completamente o instrumento. Com a gravação do presidente, Joesley produziu provas materiais, mas a contrapartida desta prova plantada foi um prêmio tão absurdamente generoso que gerou o seu contrário, o descrédito no Ministério Público. Considerando a importância da delação premiada para a Operação Lava Jato, estes dois movimentos independentes de fragilização e desmoralização do instrumento representam uma grave ameaça ao combate à corrupção no Brasil.