Alcides Pires, economista, empresário
O Chefe, um empreendedor de meia-idade, mora a seis quadras da praia. Ele tem uma pizzaria movimentada, fatura direitinho e tem 19 funcionários. Somente o gerente e os dois supervisores de turno ganham mais de 2 mil. A pizzaria paga 29 mil de impostos federais, e o Chefe rala para manter as contas em dia. Seu carro dá pro gasto.
O Peão, um sujeito batalhador que teve que deixar a escola cedo para ajudar com as despesas em casa, trabalha na pizzaria e ajuda na limpeza. Mora num bairro popular de Jaboatão. Sua filha, que frequentemente precisa voltar mais cedo por falta de aula na escola pública que frequenta, precisa de cuidados médicos regulares e sofre com a penúria do posto de saúde. Usa metrô e ônibus para chegar ao trabalho.
Naquele dia, o Chefe levantou cedinho, pegou sua bike e foi se exercitar vendo o mar. Na volta, parou e pediu uma água de coco. Sem querer, ouviu o Doutor, um funcionário federal aposentado que mora à beira-mar ali perto, comentar sobre a decepção de não ter reajuste na sua aposentadoria. Ele estudou muito. Passou por seus méritos num concurso e não se escondeu do trabalho como viu muitos colegas fazerem. Cumpriu suas etapas profissionais e aos 57 anos estava se adaptando à sua aposentadoria recente. Disse à amiga que ia reservar parte dos 29 mil que recebe mensalmente para ajudar uma instituição beneficente.
O Doutor não tem culpa, mas é parte de um sistema previdenciário que consome bilhões dos impostos para se sustentar.
O Chefe não tem culpa, mas é parte de um sistema tributário que arrecada muito e usa mal os seus impostos.
O Peão não tem culpa, mas sente muita falta de serviços públicos de saúde, educação e transporte que tornassem sua vida melhor e oferecessem melhores perspectivas para sua filha.
O Chefe pensou, então, no tanto de trabalho que era feito para gerar os 29 mil que saem todo mês da pizzaria e não servem para melhorar a vida do Peão, mas para pagar a aposentadoria do Doutor. Não é justo, pensou ao subir na sua bicicleta rumo ao seu dia de trabalho. O Peão, em pé num ônibus lotado, nem se dava conta da injustiça.
Esse modelo nos envergonha, subtrai de quem trabalha; esses nunca foram essencialmente servidores, se servem do serviço público, são muitas regalias. Honestamente não entendo essas disparidades, e você entende? Temos culpa de não nos posicionarmos contra este modelo de qualquer servidor público, se aposentem com qualquer valor acima dos que trabalham com carteira assinada. A aposentadoria nunca poderia ser semelhante aos valores da atividade na ativa, nunca uma vez mais por se confirmar que não mais são servidores.
Eduardo, acho que esse é o momento de mudar o futuro desse quadro. O momento é agora. Os servidores individualmente não são culpados pela situação, apenas são parte de um sistema que é injusto para a sociedade. É tempo de mudar isso. Obrigado pelo comentário.
Realmente, não temos ideia de quantos peões são usados para manter estas classes e mais os penduricalhos. O serviços publicos de necessidade básica não funcionam, a segurança não funciona, a educação não é de qualidade(mesmo com o esforço dos professores) que tem de trabalhar sem recursos, além de obrigatoriamente mascarar resultados passando os alunos independente de terem alcançado o aproveitamento esperado. É uma carnificina da Estância federal à municipal. Total descaso com o dinheiro público. Até um tempo atrás conseguia ver uma ponte para um caminho próspero, mas hoje, a cada dia penso em absolver todas as notícias de forma seletiva para não perder a fé no Brasil. As pessoas corruptas inteligentes que estão no poder, aprenderam a conduzir a massa dependente, que antes não conhecia seus direitos e hoje não sabem para quem devem ou como usar. As milícias organizadas de turbante encarnado se valem dos direitos privados ao cidadão de não ser precionado e vão para as ruas como se fossem gladiar contra espartanos, encontram o cidadão que ao acordar pensa em exercer sua cidadania, mas covardemente retrocede em seus pensamentos e imagina encontrar um gladiador disposto lutar pelo seu idealismo fajuto, financiado por ninharias, sem pudor e sem cinhecimento de caso.
Triste sim, é escutar de um amigo, na tv de um parlamentar, jornalista, de um advogado ou até de um magistrado a interpretação da lei, dos fatos, da denúncia, das bemfeitorias e dos males, sem serem apresentadas na forma em que lhes convém e não na verdade. Triste, triste, triste.
Antonio Carlos, compartilho da sua tristeza com a situação. Mas precisamos agir por um futuro melhor. Obrigado pelo comentário.
Meus cumprimentos, amigo Alcides. Sua história, apesar da sutileza, é bem didática. E nos aumenta a dor de ver nas ruas, sob bandeiras vermelhas – a cor da solidariedade – servidores públicos e sindicalistas a combater ferozmente a reforma da previdência, recorrendo a falácias como a da cobrança prévia dos débitos previdenciários, para justificar, na verdade, a defesa dos seus interesses corporativos. E sou insuspeito para falar sobre isso, pois estou na categoria do Doutor da sua crônica…
Amigo Clemente, agradeço as suas generosas palavras. Fiz questão de destacar que as pessoas não são culpadas pela situação na qual chegamos, e de fato seria muito bom reformarmos a previdência agora para evitar uma situação na qual as atuais aposentadorias precisassem ser revistas, ou seja, mexer em direitos adquiridos. O momento é agora.
adorei!!
* um desavisado poderia achar que se trata de um conto de lit. fantástica 🙂