Sérgio C. Buarque

Na discussão sobre políticas sociais costuma haver uma grande confusão entre renda e ativo. A renda é um fluxo gerado por alguma atividade econômica, que se manifesta na forma de salário, lucro ou dividendos, juros e impostos. De modo que a distribuição de renda constitui uma simples transferência de mãos do que tenha sido gerado nas atividades econômicas. A grande vantagem da renda é a sua divisibilidade, na medida em que, expressa em unidades monetárias, pode ser fracionada em diferentes tamanhos, para sua distribuição. Mas é limitada e depende da fonte geradora. A renda distribuída pelo “Bolsa Família” e por outros programas sociais, por exemplo, é transferida do orçamento da União para as famílias pobres, mas foi gerada antes pela economia, e recolhida pelo Estado através dos impostos. Depende, portanto, do volume de renda gerada, e da parcela apropriada pelo Estado, e disponível para distribuição.

O ativo, ao contrário, é um patrimônio (e não um fluxo) que, adequada e devidamente utilizado na produção, pode gerar renda e valor. Terras, máquinas, ferramentas ou equipamentos são ativos econômicos que, dependendo das suas características, podem ser organizados no processo produtivo. A distribuição de renda estará sempre dependendo de uma fonte geradora, que decorre de algum ativo econômico ou social. Mas esses ativos não são divisíveis como a renda, o que praticamente impede a sua distribuição equânime na sociedade, exceto, parcialmente, no caso da pequena propriedade agrícola para a produção familiar rural. Além disso, esses ativos físicos são caros, depreciam-se com o uso, e ficam obsoletos com o tempo, por conta das inovações tecnológicas.

Apenas um ativo é divisível, tem flexibilidade de uso, e não se deteriora com o tempo. Ao contrário, cresce e se amplia tanto mais quanto seja utilizado. Estou falando do ativo conhecimento, da educação e da qualificação profissional. Este é um ativo ilimitado, e que aumenta também quando se compartilha, porque é produzido e expandido pela troca e interação entre as pessoas e os saberes. Se a renda se encerra com o consumo, o conhecimento aumenta com o consumo e com a distribuição. Por isso, a mudança estrutural que promove o desenvolvimento e a equidade social sustentável só é possível com uma ampla distribuição social do ativo conhecimento, educação e qualificação, que prepare o cidadão para a vida e para o trabalho, viabilizando a convivência social e a geração de renda.

E por que a distribuição de renda é mais utilizada e valorizada nos nossos pobres países do que um empreendimento de distribuição do ativo conhecimento? Provavelmente porque é mais simples, fácil de operar e de resultado imediato. Além disso, a doação desperta um sentimento de gratidão do beneficiário pelo seu patrocinador. O estadista, ao contrário, não espera resultados rápidos nem gratidão, pensa na construção do futuro, que é lenta, penosa, e nem sempre bem compreendida pelo cidadão.