Cena econômica: o emprego apresenta saldo líquido positivo de contratações com carteira assinada em julho. A taxa de juros cai para um dígito, 9,5%. A inflação anualizada de 3,8% estaciona aquém do centro da meta, 4,5%. O movimento de vendas no comércio varejista mostra reação e cresce em junho.
Cena política: início de agosto, o governo não consegue avançar com a reforma da Previdência. Meados do mês, o governo tem dificuldade para aprovar a revisão da meta fiscal que eleva o déficit para R$ 159 bilhões no biênio 2017/2018. A base política governamental evidencia divisão com disputa de espaços de poder opondo Centrão e PSDB.
Entre uma cena e outra, interpõe-se cenário da semana. O aumento da meta fiscal traz algo além de números. A contribuição previdenciária dos servidores federais, com salário acima de R$ 5 mil, passa de 11% para 14%. São postergados por um ano reajustes concedidos ao funcionalismo.
Por trás do cenário de contrição, contraste entre público e privado. Eficiência privada, resiliência pública?
Há um saldo político na questão, ainda irresolvida, da revisão da meta fiscal: baixa capacidade do governo para reduzir despesa. E insensibilidade congressual para aprovar medidas de estabilização da economia.
Placar provisório: como fica a pressão de parlamentares sobre o governo para ampliar vantagens partidárias e pessoais?
Há duas perspectivas: no curto prazo, calibrar o grau de aprovação de medidas destinadas a promover o ajuste fiscal. No médio prazo, definir o padrão da discussão política no país. Entre radicalização e moderação.
Radicais e moderados
Futuro é rito de passagem. E o futuro chamado 2018 passa por dois ângulos: o da radicalização e o da moderação. Envolvendo quatro dimensões:
1 Aprovação de medidas de ajuste fiscal: se aprovadas as medidas, prevalece tendência para cenário de moderação política. Se não aprovadas medidas de ajuste fiscal, prevalece tendência para cenário de radicalização política.
2 Aprovação de projeto mínimo de reforma da Previdência Social: se aprovado projeto mínimo, prevalece tendência para cenário de moderação política. Se não aprovado projeto mínimo de reforma da Previdência Social, prevalece tendência para cenário de radicalização política.
3 Geração de empregos com carteira assinada: se continuar na economia a geração líquida de empregos, prevalece tendência para cenário de moderação política. Se não continuar na economia a geração líquida de empregos, prevalece tendência para cenário de radicalização política.
4 Taxa de inflação abaixo do centro da meta: se o percentual de inflação continuar sob controle, abaixo do centro da meta, prevalece tendência para cenário de moderação política. Se o percentual de inflação sair de controle e se situar acima do centro da meta, prevalece tendência para cenário de radicalização política.
Trata-se, portanto, de duas dimensões de caráter político institucional: ajuste fiscal e reforma da Previdência Social. E de duas dimensões de ordem econômica: geração de empregos e taxa de inflação.
As duas primeiras dimensões, políticas, influindo sobre as duas outras. E, no refluxo das aspirações sociais, as duas outras dimensões, econômicas, replicando as duas primeiras.
Alma e corpo. Corpo e alma. Ânimo moldando política. Andante agitato ou alegro moderato ? Sem adágio. Nos fazeres da orquestração. Ou da desafinação. E daí ?
Qualidade política
Daí, viva a qualidade política. Essa geologia, agregada ao terreno onde se faz semeadura, determina a qualidade do produto. Populista ou institucionalizante.
A prevalecer a imobilização do governo, preso nas rédeas do clientelismo, a política vai desaguar no populismo.
Pois a conjuntura econômica vai penalizar ainda mais a situação social da população já devastada pela crise.
Se assim for, o discurso populista irá balizar os termos da campanha no próximo ano. Com o descolamento entre promessas inviáveis e realidade a ser recortada.
Prevalecendo a capacidade de o governo promover o ajuste fiscal, a tendência é a adoção de discurso propositivo. Pois o clima social, apoiado na economia estabilizada, cria compreensão para debater questões substantivas do país.
Portanto, o que está sendo decidido agora, não será apenas o número do déficit fiscal. Mas será o valor da política. Será o formato da paisagem política. A forma de fazer política. De um lado, política moderna, institucionalizada. De outro lado, política do atraso, populista.
A política moderna existe na convivência entre contrários. A política do atraso sobrevive na luta para eliminar o contrário. A política moderna propõe. A política do atraso depõe. A política moderna constrói. A política do atraso desconstrói.
O hoje retificará o amanhã. Ou não.
Gosto da linguagem quase telegráfica, sem a pompa grandiloquente que cansa. No conjunto, uma boa análise. Mas eu espero que mesmo com um ajuste fiscal muito precário não prevaleça em 2018 o populismo (em qualquer dos extremos do espectro político). A esperança é a última que morre? Será que ainda vale o dito popular?
Isso, Helga.
Esperança vence tragédia.
Sempre.