Fernando Dourado

Luiz Felipe d’Avila com FHC.

 

Dois meses atrás, cheguei a uma casa simpática e acolhedora, aqui em São Paulo. Da rua, quase não vem barulho, salvo pelos estampidos deflagrados por um ou outro motoqueiro apressado. Quem passa pela calçada, imaginará, com razão, que ali pode morar uma família bem estabelecida, e que o movimento ocasional de carros na garagem se deva a preparativos de fim de ano, época em que a cidade regurgita de energia. O que pouca gente sabe, porém, é que o entra-e-sai de pessoas não tem quase nada a ver com o que as aparências indicam. Pois é nessa mansarda, que poderia abrigar o ramerrão de uma rotina acomodada, que se reúne o núcleo duro de colaboradores de Felipe d´Avila, pré-candidato pelo PSDB ao governo do Estado de São Paulo. E é em torno dele que orbitam, sem quaisquer exageros, algumas das melhores cabeças do País. Uma coisa é certa: quem entra pelo portão de ferro, não será a mesma pessoa ao sair. Pois o que antes era vaga intuição, ao chegar, terá ganhado tangibilidade, na partida.

A ritmo intenso, entremeado pelas curtas viagens que Felipe faz ao interior e para fora do País, as palavras de ordem à equipe lá acantonada são duas: foco e aplicação. Isso porque, em qualquer cenário, a missão da força-tarefa é dar ao Estado, ao Partido e ao Candidato, seja ele quem for, o que melhor puder orientar as políticas públicas em todos os âmbitos da extensa pauta. Nesse contexto, não há lugar para a sisudez, apesar da presença frequente de consultores renomados em variados domínios do conhecimento. Informalidade é a tônica. O que há de prodigioso para quem olha o cenário, é que o pré-candidato não se permite angústias de calouro no batismo das urnas. Perguntado sobre a possibilidade de não ser o escolhido nas prévias do PSDB, fixa o interlocutor e diz: “Então será porque não merecemos”. Para bom entendedor, o recado está claro: trabalhemos duro para estarmos à altura. Assim são os homens de fé. Primeiro acreditam, para depois verem. Diz-se que essa ordem não funciona quando invertida. É bíblico, como sabemos.

É talvez essa crença inarredável na missão o que mais impressiona. Tanto os que estão no dia a dia dos trabalhos quanto os visitantes, sejam eles ocasionais ou frequentes. Entre os primeiros, Embaixadores como Rubens Barbosa ou Roberto Azevêdo. Professores como Marcos Troyjo e Matias Spektor. Luminares como André Barrence e Ana Clara Abrão. No segundo grupo, Wilson Risolia, da Falconi, à frente de um amplo contingente da renomada consultoria, ademais de Patrícia Ellen, da McKinsey. Os nomes acima são, invariavelmente, da proximidade pessoal de Felipe, tendo não raro atuado nas diversas frentes abertas pelo CLP – o Centro de Liderança Pública -, instituição que fundou e presidiu até recentemente, e tida como um dos melhores celeiros de gestão pública de que se tem notícia no País. Explica-se, portanto, o entusiasmo dos visitantes. Mesmo os calejados, não poupam as tintas: “Se der certo, cara, será o melhor governo da História do Estado”. Alguém duvida? Ninguém, nem os adversários, é o que dizem observadores abalizados.

Outro detalhe eloquente é o rito que rege os encontros. Mais do que cultivar cérebros para entreter conversas de salão – o que seria por si só um feito, num estágio em que muito pré-candidato não daria um passo sem a certeza da postulação -, Felipe conduz a pauta para o domínio de excelência do convidado. Nada em sua atitude denota transbordamento de ego, narração de feitos, voluntarismo ou vaidade. A cada reunião, chega com a mesma vontade de escutar. A tônica que consagra é a do exame do mérito e do exercício da paciência. Pode até conhecer bem o tema, mas refreia conclusões para que todos participem. E adia julgamentos ao máximo. É assim na selva de pedra, mas não seria diferente se integrasse um grupo perdido na floresta ou nas alvuras da neve sem horizonte. Nessas circunstâncias, vê-se que não hesitaria em tomar a frente e dar o exemplo. Manteria a calma, pouparia água, leria as estrelas, cavaria uma trincheira, sem sucumbir à tentação heroica. Seria sim um primus inter pares escandinavo em ritual viking, sem direito a regalias.

Na paisagem urbana, contudo, na pauta do possível futuro Governador, foco e aplicação no programa também pedem ousadia e perspicácia. Na educação, a esposa Ana Diniz acata com bonomia o saber convencional, mas quer inovação e velocidade. Dona de vastíssimo repertório nessa frente, conselheira e conhecedora dos meandros da Secretaria, a longa trajetória na iniciativa privada ecoa com senso de urgência na implementação das políticas. O mesmo acontece na Saúde e Segurança, onde ex-secretários aparecem para dividir o melhor da experiência com a equipe. Assim sendo, nenhum benchmark fica fora do raio de escrutínio, por ousado que seja. Determinado a resolver a questão da poluição dos rios da capital, Felipe toma fôlego e enuncia o mantra: “A pior coisa em política pública é a surpresa, a gestão pelo terror midiático, o espalhafato. O que funciona é sentar, estabelecer bases e depois cobrar. O bom gestor tem que se sentir prestigiado. Se a meta não for cumprida, começamos a sancionar. Sem rancor, mas sem titubear”.

Convidado para atuar como uma espécie de líbero da Casa – logo a jogar numa ampla faixa do gramado, fazendo a liaison entre a Comunicação, o Programa de Governo e a Estratégia -, tenho que admitir minha satisfação em presenciar de perto como se operam as engrenagens da formulação. A tarefa que nos congrega torna a missão tanto mais estimulante quanto não se perde de vista a determinação de se forjar uma diplomacia subnacional que desfralde a bandeira de São Paulo mundo afora. Para governar um Estado que, se fosse autônomo, perfaria um PIB superior ao da maioria das nações do mundo, Felipe não desgruda do estudo de padrões de desenvolvimento e complexidade econômica, de Ricardo Hausmann, de quem se aproximou em Harvard. A competitividade das regiões do Estado será grosso modo função da capacidade de exportação. Em reuniões com lideranças, é sobre esses números que faz anotações em letra miúda que, a essa altura, já perfazem resmas de papel, e que repassa antes de sair, para se certificar de que assimilou a mensagem.

Quando a noite cai sobre a rua quieta, e já nenhuma voz ecoa no casarão escuro, lá estará a luz acesa na sala do candidato. Para quem se dispõe a abraçar a política partidária, sabe que não há trégua possível. A todo momento haverá um político ou jornalista à espera de uma palavra e aceno. A caminho de um encontro com líderes comunitários em algum ponto da cidade, é Alckmin quem reforça a mensagem: “O caminho é esse, não há outro, siga adiante”. Dizem os mais versados na alma discreta do Presidente do PSDB, que a decisão já está tomada. “Geraldo sabe que Felipe teria todos os votos do Doria. Mas sabe também que ele conquistaria um eleitorado com que Doria não pode sequer sonhar a essa altura, especialmente se sair da Prefeitura ou do partido. Geraldo sabia o que estava fazendo quando convidou-o, vá por mim”. Eis um tópico de conversa no qual ele não se estende. Sentencioso, diz: “Não me angustio com o que não está a meu alcance. Só não poupo energia para agir sobre o que está. Confio no destino”. Todos nós.

Certo é que amanhã, com o primeiro raio de sol, ele estará pedalando na Marginal. E, no fundo, sonhando com a despoluição do rio.