Abraham Benzaquen Sicsú

 

Mineração de Dados, Internet das Coisas, Inteligência Artificial, Manufatura 4.0, palavras que faziam parte do meu dia a dia. Como professor e gestor na área de Inovação, dei aulas e palestras sobre o tema. Fiz parte de grupos nacionais de políticas para o setor. Visitei escritórios e empresas que eram apresentados como modelos no desenvolvimento e aplicação das técnicas. Ficava fascinado com máquinas que falavam com máquinas, com processos que administravam bilhões, trilhões de dados.

Confesso, no entanto, que o mundo que via e descrevia tinha algo de “futurismo”. Embora concreto, não me sentia vivendo essa nova era. Para mim, os modelos chapliniano, fordista, taylorista, em que ainda havia forte interação humana, eram minha realidade. Melhores seriam os anteriores, o artesanato, o comércio medieval, por exemplo.

A economia em rede, em que era fundamental participar virtualmente, não se concretizava em minha cabeça. A ideia de exclusão, caso não se integrasse, parecia muito coerente, mas válida para os outros. Eu passaria sem muito esforço.

Conseguiria ter uma vida tranquila no modelo em que fui treinado, onde a interação humana é fundamental, onde a discussão presencial parecia ser o mais adequado. Poderíamos até fazer reuniões à distância, mas era básico articulá-las anteriormente, predefinir o que se queria e o que se concluiria. Nada melhor que um bom almoço ou um café no final da tarde para isso. Os acordos dependiam de encontros físicos.

Veio a Pandemia. O isolamento fez-se necessário. As pessoas se viram confusas, as relações humanas vão mudando.

A comunicação prescinde, inclusive, do telefone. ZAP, TWITTER e outros aplicativos de mensagens são usados. Suas características são a rapidez e o evitar evidências de afeto e carinho, que pouco ajudam. A impessoalidade, sempre que possível.

Desenvolvem-se aplicativos para pedir comida, fazer compras, escutar notícias, atualizar informações, e tudo que se possa imaginar. Somente com eles é possível relacionar-se com o mundo.

As relações de ensino caracterizam-se pelas videoconferências.  E as do mundo do trabalho também. Têm que ser objetivas e diretas. Evita-se o afeto, as relações de amizade e a familiaridade íntima, em prol de uma eficiência de curto prazo. Não há espaço para posicionamentos do indivíduo, para a consideração de peculiaridades pessoais.

E tudo isso, tendo como suporte uma logística que se assenta nas relações de máquinas com máquinas, no aprofundamento da Internet das Coisas. Tudo comandado não se sabe por quem.

Não participar desse mundo é proibido. Na Pandemia, ver filhos, netos e pessoas queridas, somente por meios eletrônicos. Demonstrar afeto tem tempo limitado. Viver os dias de hoje muda nossos conceitos, nossos padrões de relacionamento. Tudo é virtual.  Até ler um bom livro passa pelo e-book, sem poder folhear as páginas e sentir o papel e seu cheiro.

As cidades mudaram. E, após a crise do isolamento, essas tendências não serão abandonadas. Teremos que nos adequar ao chamado mundo virtual e ao distanciamento protocolar. “Mais fácil e mais cômodo”. Haverá resistência, sem dúvida. Arrumaremos maneiras de trocar afeto com amigos de longa data, mas com comedimento.

Novamente, isso será apontado como nostalgia e coisa dos velhos e saudosistas. Se nos deixarem dar um abraço aos queridos, prosear com os amados, pode ser supérfluo, mas me contenta. Pelo menos, espero que façam essa concessão.