Em 53 grandes cidades brasileiras, incluídas 18 capitais de estado, houve 2º turno nas eleições municipais de 2020. Em todas essas capitais o Ibope fez pesquisa de véspera do pleito ou em dias imediatamente anteriores.
Levando em conta somente os votos válidos, houve erro de estimativa do instituto em 12 das 18 capitais. Quer dizer, em 2/3 dos levantamentos as estimativas de intenção de votos ficaram fora da margem de erro amostral.
Aventou-se a hipótese de que tais erros estavam sendo potencializados por conta da passagem de votos totais(incluem os brancos, nulos e indecisos, o chamado não-voto) para votos válidos nas pesquisas, recurso necessário para comparabilidade com números oficiais dos pleitos.
Tecnicamente, essa passagem envolve duas suposições implícitas: [1] que os dados subtraídos de não-voto se distribuem proporcionalmente às intenções de voto dos candidatos e [2] que a quantidade de indecisos seja uma proxy para abstenção.
À guisa de exemplo: nas três pesquisas de antes do 2º turno no Recife (Ipespe, Ibope e Datafolha) as intenções de voto totais de João Campos e Marília Arraes foram exatamente 42% a 42%, e brancos, nulos e indecisos 16%.
O item (1) acima pressupõe que esses 16% foram repartidos proporcionalmente na base de 8 pontos para João e 8 pontos para Marília, de sorte que em votos válidos eles lograssem 50% e 50% de intenção de votos. Não foi o que aconteceu. Nas urnas, João teve 56,3% e Marília 43,7%.
No item (2) reside outra distorção. Nas três pesquisas mencionadas os indecisos somaram apenas 3%, na média. Já a abstenção chegou a 21%, uma diferença de 18 pontos.
Considerando agora somente os votos totais, também ocorreram erros de estimativa do instituto em 12 das 18 capitais. Na comparação entre as duas categorias, todavia, os desvios das estimativas relativamente aos resultados das urnas foram quase iguais, tanto em votos totais quanto em votos válidos[1]*.
Isso implica inferir que a passagem de votos totais para votos válidos não é a causa dos erros de estimativa dos institutos e que, portanto, dizer-se que a alta abstenção do pleito foi responsável por tais erros não encontra respaldo na evidência empírica (se assim fosse, os erros em votos válidos seriam muito maiores do que em votos totais).
O que está havendo, então? O que se sabe, por enquanto, é que os institutos de pesquisa estão com dificuldades de lidar com [a] a volatilidade do voto (o eleitor está decidindo o voto na undécima hora); [b] o comportamento errático do eleitor (cada vez mais “líquido”, despolitizado, indecifrável) e [c] a caixa preta do não-voto.
[1] Para comparar os desvios das estimativas das pesquisas em relação aos resultados das urnas, tanto em votos válidos, quanto em votos totais, usou-se a técnica de “discrepância média”, que consiste em calcular a média dos valores absolutos dos desvios. Os achados revelaram que são bem próximas as discrepâncias médias das duas categorias: votos válidos (desvio de 4,6 pontos vis-à-vis os resultados das urnas) e votos totais (desvio de 4,2 pontos).
Parabéns. Artigo curto e preciso. Junto com Bolsonaro e o PT, os institutos de pesquisa também foram derrotados. E a conclusão é um desafio só: volatilidade, errático e caixa preta, resume o enigma em que se tornou o eleitor. Os institutos superaram estes desafio? As pesquisas eleitorais ainda serão úteis? Ocorre o mesmo em outros países?