Sitiada e intensamente bombardeada pelas tropas russas, a cidade portuária de Mariupol é o retrato mais cruel da virulência da invasão da Ucrânia pela Rússia. Noventa por cento das edificações e da infraestrutura da cidade foram destruídas e grande parte dos 400 mil habitantes que não conseguiram fugir sobrevivem sem acesso a comida, água, eletricidade e suprimentos médicos. Decidido a tomar a cidade para consolidar sua posição no Mar de Azov, interligando com a Criméia e o Mar Negro, Putin promoveu um massacre impiedoso que está arrasando a cidade e esmagando a população local. O terrível bombardeio de Mariupol parece indicar também a reação descontrolada do autocrata diante do fracasso da sua aventura militar de ocupação da Ucrânia. A resistência do povo ucraniano, até mesmo da parte leste da Ucrânia, onde está Mariupol (supostamente de maioria russa) desmoralizou os discursos de Putin de uma Ucrânia ligada à cultura russa e a ilusão de que a invasão seria um passeio. Fracasso e desmoralização devem ter despertado a revolta irada do presidente da Rússia.
Esta semana, em pronunciamento no Conselho de Segurança da ONU e no parlamento da Espanha, o presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, denunciou a devastação de Mariupol, comparando com a destruição de Guernica, pequena cidade basca, bombardeada por aviões nazistas, no dia 26 de abril de 1937, em apoio às tropas fascistas de Francisco Franco. A indignação com o massacre de Guernica, há 85 anos, ficou eternizada no mural do pintor espanhol Pablo Picasso que, no seu estilo cubista, mostra figuras despedaçadas de pessoas e animais, simbolizando a tragédia que antecipava os horrores da segunda guerra mundial. Mariupol tem sido citada também como a “Alepo da Europa”, numa referência à devastação da grande cidade síria, durante quatro anos, pela artilharia e bombardeio aéreo do ditador Bashar al-Assad, com o apoio militar de Vladimir Putin, o mesmo que está esmagando a pequena cidade da Ucrânia. A relação é mais evidente porque, como diz Jennifer Cafarella, diretora do Instituto para o Estudo da Guerra, a “Síria foi a escola de guerra da Rússia para depois invadir a Ucrânia”. Enquanto a guerra e a devastação continuam na Ucrânia, o mundo espera que um novo Picasso use a força e a sensibilidade da arte para manifestar a indignação diante da destruição de Mariupol e de toda forma de violência e agressão militar.
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