O sistema tributário não tem como missão promover a justiça social. Esta é a responsabilidade das políticas públicas que, utilizando a arrecadação viabilizada pelo sistema tributário, distribuem os recursos de forma a construir uma sociedade justa, principalmente na oferta de serviços públicos de qualidade. Entretanto, se não deve ser justo, o sistema tributário não pode ser injusto, penalizando os segmentos da população de menor renda com alíquotas elevadas de impostos. O sistema tributário brasileiro é muito injusto. É um absurdo que os brasileiros com uma renda miserável, entre R$ 1.903,98 e R$ 2.826,65, tenham que entregar ao Leão 7,5% da renda (com um desconto padrão de apenas R$ 142,80), penalizando as classes E e D, que representam 50,7% da população com renda domiciliar até R$ 2.900,00. 

O governo Lula da Silva fez uma pequena correção nesta injusta cobrança de impostos, quando isentou do Imposto de Renda os brasileiros que ganham até dois salários-mínimos (exatos R$ 2.640,00, com o aumento do salário-mínimo para R$ 1.320,00). Com isso, segundo estimativas do governo, cerca de 13,7 milhões de pessoas deixarão de pagar Imposto de Renda. Decisão mais do que justa, embora ainda insuficiente para reduzir a carga de impostos que incide sobre a população pobre (classes E e D).  E estamos falando apenas de Imposto de Renda, lembrando que esta faixa da população compromete uma parcela desproporcional da renda com imposto  indireto (compra de bens e serviços).

A isenção desta faixa de renda (até dois salários-mínimos) deve provocar uma redução de R$ 6 bilhões por ano (segundo o Estadão, o SINDIFISCO estima uma redução de R$ 14 bilhões). Como o Estado brasileiro não pode se dar ao luxo de perda de receita, seria correto e justo compensar esta perda decorrente da isenção com elevação da alíquota do Imposto de Renda das faixas de renda mais alta, mantendo a arrecadação necessária para fazer justiça social através dos investimentos públicos. Não é absolutamente justo transferir para a classe média (classe C) – que já arca com uma alíquota de imposto muito alta – a compensação pela diminuição da receita decorrente da isenção dos mais pobres. Para reduzir a injustiça, os brasileiros com renda domiciliar acima de R$ 22.000,00 (de classe média alta a milionários) deveriam elevar a sua contribuição tributária.

O sistema tributário brasileiro não é só injusto com a população pobre. Os brasileiros de classe média (classe C), com renda domiciliar entre R$ 2.900,00 a R$ 7.100,00, são penalizados com três alíquotas diferentes, de acordo com o intervalo de renda: quem ganha até R$ 3.751,05 paga 15%, dos que têm renda entre R$ 3.751,06 e R$ 4.664,68 são cobrados 22,5%, alíquota que sobe para 27,5% para os que recebem renda superior a R$ 4.664,68. Isso significa que uma parte desta classe média (com renda acima de R$ 4.664,68) tem o mesmo tratamento dos brasileiros das classes B e A (com taxa de imposto de 27,5%). A incidência de imposto para o trabalhador que recebe salário de cinco mil reais é a mesma de um ministro do STF, com salários de 44 mil reais, do presidente do BNDES, que recebe mais de 80 mil reais, ou do presidente da Petrobrás, com renda de quase 120 mil reais. 

A reforma tributária que está sendo discutida agora deve concentrar a atenção nos impostos indiretos, buscando a simplificação do complexo e caótico sistema. O Imposto de Renda ficaria, por enquanto, de fora da reforma. No entanto, para que o presidente Lula da Silva se aproxime da sua promessa de campanha, de isenção de IR para quem ganha até R$ 5.000,00, o que excluiria grande parte da classe média atual (cerca de 33% dos contribuintes), será necessário redesenhar e redimensionar as escalas de alíquotas do Imposto de Renda, ampliando os intervalos com criação de novas alíquotas intermediárias, reduzindo as taxas para a classe média e elevando para as rendas mais altas (Classe B e A). A alíquota de 27,5% é extremamente elevada para quem tem um rendimento médio (até dez mil reais, digamos), e relativamente baixa para as altas rendas. A equação não é simples, porque os brasileiros das classes B e A são apenas 16% do total dos contribuintes e poderiam ser muito penalizados se tivessem que compensar a redução da arrecadação do IR da classe média. 

Em última instância, o grande problema do Brasil é a baixa renda média da população e a grande concentração de renda, o que não poderá ser resolvido apenas, nem principalmente, com justiça tributária. Depende do crescimento da economia e da elevação da produtividade do trabalho, que viabilizem o aumento da renda geral dos brasileiros, e a melhor distribuição de rendimentos na sociedade. Projeto de médio e longo prazos.