Poeta em solidão

Poeta em solidão

O nosso pecador impenitente Luiz Roberto, mineiro de Belo Horizonte, acaba de pôr em circulação mais um livro seu, “Poesias e outros pecados”, edição do autor. São poesias refinadas, bem a seu jeito, falando de amor e da vida circundante, algumas vezes, me parece, inspirado no ambiente familiar. Em nota no “Preambulando…” o nosso poeta aponta que a poesia é um luxo para os poucos que gostam dela e que é o que o poeta aproveita na solidão. Imagino que essa solidão é quando o poeta arruma tempo para divagar, filosofar e poetar. Depois de clinicar, que nosso poeta é médico. Quando se deixa inebriar pelo que vê e sente a seu redor. 

A poesia de Luiz Roberto tem muito de amorosa, inspirado em sua musa eterna, mas alça voo em torno de outros sentimentos, de outros elãs de vida. Um olhar interior, no que vai pela alma. Em linguagem que se lastreia no coloquialismo também. Versos simples, pontes sobre profundidades humanas. São versos impregnados de sensualidade, com filosofia da vida cotidiana. Com ares de crônicas, por vezes. 

No prefácio, o que se assina Prefaciador (alter ego do autor?) faz ironias sobre as poesias e sobre o autor; como que nosso poeta procurasse se antecipar a possíveis reparos, digamos, até de suspicácias sobre certo nível de sensualidade de alguns poemas que dialogam com algum erotismo. Mas o poeta não cai nunca num erotismo barato, que, diz pela voz do Prefaciador, detesta. 

Conheci  o Luiz Roberto o ano passado, no lançamento de outro livro de poemas seu, “Uns dias de versos”, na Mariana colonial, dos sinos, das igrejas e dos poetas. Conheci também sua família e sua neta, seu xodó, que não era bolsonarista, já que no ano passado o tema eleitoral se impunha; uma pena que a jovem ainda não votava. Tomamos uns vinhos, conversamos. E isso de conhecer o poeta muitas vezes nos leva a apreciações extra literárias ou poéticas de seus versos. O que acontece agora comigo. Assim, vejo o Luiz como um poeta feliz, porque é um homem feliz. Simples e feliz. Isso está lá nos seus versos, que respiram vida. Mas não uma felicidade ou alegria piegas. Sabe das problemáticas da vida, por médico e por poeta. E ele gostaria, imagino, que se acrescentasse por amante.

Entre tantos poemas que saí marcando para destacar, transcrevo aqui estes dois:

No sertão

A árvore seca e maltratada, 

entristecida à minha frente,

aponta os galhos às nuvens.

Uma lamúria deprimente.

Braços abertos

num pedido amargurado…

Pede água, angustiada e sedenta.

Mostra o cerne descascado. 

Está nua a pobre coitada.

E as nuvens olhando de cima,

só umas poucas espalhadas,

também estão tristes, sofridas.

Sentem muito porque não chuvam.

Estão secas, desidratadas, 

tímidas, encabuladas.

Olham para a árvore, acanhadas…

Sentidas se desculpam

por não poderem fazer nada.

E…

Carecendo sejam perdoadas, 

penitenciam-se.

Falta-lhes água

(não têm lágrimas)

com que chorem umas chuvadas…

Descartando

Quem pensa que pode.

Na verdade, não pode.

Quem pensa que quer.

Na verdade, não quer.

Quem pensa que é.

Na verdade, não é.

Quem pensa que vive.

Na verdade, não vive.

Quem só pensa.

Na verdade, dispensa:

Poder.

Querer.

Ser.

Viver.

Pena eu não ser dispensado

dessa baboseira toda.

Não ando por aí sendo René…

Não penso…

Logo, 

faço Descartes.

ALDRAVIAS

Já na segunda parte do livro encontramos suas aldravias, um tipo de poema nascido nas Gerais, mais precisamente Mariana, de seis versos univocabulares (Na página 88 o livro traz nota explicativa sobre a mecânica da Aldravia). Com outras inspirações, o poeta, sinteticamente, se volta para os cotidianos diversos, a frugalidade da vida e dos sentimentos e emoções:

luxúria

clamor

de

pecado

exagerado

perdoado

boca

tocada

sem

sobeja

 

beija

água

corrente

lágrimas

vulcânica

depressão 

lava

Em final de ano, é bom se deixar levar e enlevar pelos versos do poeta, que vê a vida que muitas vezes não vemos, estafados nas nossas correrias sem sentido. Melhor ainda quando o poeta peca por nós.