“Olha o passo do siricongado ! Olha o passo da siriema!
Olha o passo do jaburu! E a Nação-de-Cambinda-Velha!
E a Nação-de-Cambinda-Nova! E a Nação-de-Leão-Coroado!
– Danou-se, mulata, que o queima é danado!
Que imensa poesia nos blocos cantando.”
Ascenço Ferreira, em Catimbó Cana caiana, Editora Martins Fontes, 2008, São Paulo.
O Carnaval está democratizado. Ponto. Decreto baixado por Sua Excelência, Rei Momo, primeiro e único. Processo social de incorporação das massas populares. Ao longo dos últimos sessenta anos. Nesse período, o popular tornou-se fator preponderante na festa.
Pois é. O Carnaval mudou. Tornou-se festa de rua. Acabaram-se as festas de clube. Nas quais a burguesia se fantasiava, se pintava, se preparava para eventos fechados. Onde os salões se enchiam com casais e grupos frevando. O Iate Clube do Recife, o Country Club, o Internacional, o Clube Português, o Sírio Libanês. Eram ilhas de celebração social. E havia o corso. O desfile de carros. No centro da cidade. Um atrás do outro. Também finito.
Por outro lado, ampliou-se a participação das classes médias. Por meio da organização e difusão, cada vez mais forte, de blocos carnavalescos. Reunindo diversos segmentos sociais, classes de renda, profissões, trabalhadores, estudantes. Unidos todos sob os estandartes de cores diversas, distintos lemas e motes variados. À escolha das preferências de saber e de sabor de bairros, de ruas e de entidades.
Atualmente, blocos carnavalescos são de todo tamanho e tema. Tem para quem quiser. Os de sábados, os de domingo, os da terça feira. E até os da quarta-feira de cinzas. Em Olinda e no Poço da Panela. Há três tipos principais:
1 Blocos líricos;
2 Blocos de tom político;
3 Blocos inspirados em utopias sociais.
Talvez o mais importante deles tenha sido o Nós Sofre mas Nós Goza. Fundado nos anos 70, inspirado na oposição à ditadura, amparou-se na frondosa árvore intelectual do livreiro Tarcísio Pereira. Seu ilustrador mais admirado foi o cartunista Lailson.
O mais popular e demograficamente milionário é o Galo da Madrugada. Nascido pequenino, semioculto nas cercanias do Forte das Cinco Pontas, nos anos 70, foi crescendo. Tomou, ao longo do tempo, o tempero do profissionalismo. E a caipirinha do espírito alegre e divertido do pernambucano. E, hoje, acaba arrastando gente do país inteiro. A cada Carnaval, reúne mais de 1 milhão de foliões.
Nessa altura, já oferece uma descendência: o Pinto do Galo. Desfila no sábado de Carnaval, cedinho. Este ano, sua camiseta é um pedido de paz. Refletindo o ambiente de solidariedade e preocupação com a guerra da Ucrânia e o conflito de Gaza. Seu principal folião, Pedro Bezerra, lembra o movimento hippie dos anos 60. Recorda as passeatas pela paz e contra a guerra do Vietnam. A flower power. E a serpente da guerra.
Esses elementos alegóricos estão na camiseta do bloco este ano. Uma camiseta vermelha, de aplicações brancas, acentuando emoção tropical e apelo à paz. O Carnaval é uma festa em que se manifesta principalmente as expressões de arte. Seja a na dança, na música, nas fantasias, nos estandartes, nas camisetas. No fundo, sabemos todos, que a arte é a energia mais poderosa contra a violência. Basta lembrar O Grito, de Munch; e Guernica, de Picasso.
Vida longa ao Carnaval, à arte, ao Galo da Madrugada. E ao Pinto do Galo.
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https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2024/01/metade-da-populacao-global-tem-eleicoes-em-ano-de-democracia-a-prova.shtml
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