“Essa admirável vontade de nada separar nem excluir que sempre reconciliou e reconciliará ainda o coração doloroso dos homens com as primaveras do mundo”.
Albert Camus, Bodas em Tipasa (Record, São Paulo, 2021).
Tempo de eleição. Na França, uma interjeição. Na Inglaterra, uma mudança. Após quatorze anos. Nos Estados Unidos, um atentado. Cada país, uma sentença. Assinada pela nação cívica. Investida no voto.
A França, parlamentarista, vai exercer talvez longa espera. Por um novo primeiro-ministro. Pendente de improvável acordo entre a esquerda e o centro. A Inglaterra, também parlamentarista, mas enraizada em sólidas raízes ancestrais. Mudou o governo em igual segurança com que o rei Charles III recebeu a coroa colocada em sua cabeça.
Os Estados Unidos, herdeiro dos ingleses, firmaram a convenção da Filadélfia. Junto com os Papeis Federalistas, em 1787. Desenharam as bases filosóficas da nova nação: James Madson, Thomas Jefferson, Alexander Hamilton e George Washington. No entanto, esse espírito político foi atravessado por vezo belicoso. Em que, aparentemente, o faroeste interno foi transplantado para uma visão de domínio externo. E, em seguida, convertido eleitoralmente em política de armas.
Porque, lá, no Norte, 14 presidentes da República e candidatos presidenciais sofreram atentados. Quatro presidentes foram assassinados: Abraham Lincoln, James Garfield, William Mckinley e John Kennedy. E o atentado mais recente ocorreu semana passada.
Conforme o cientista político José Álvaro Moisés, a democracia traz benefícios. E envolve riscos. Porque depende, em grande parte, do grau de confiança na relação entre cidadãos e agentes políticos. Nesse contexto, é oportuno considerar:
- A democracia só funciona em ambiente de cooperação entre instituições, Poderes republicanos e cidadania. Os mecanismos institucionais operam a partir de modelos que são prescritos na Constituição;
- As teias institucionais, portanto, são redes de confiança. Que formam, na prática política, a construção do espaço público. Daí decorre, ou não, a existência de níveis desejados de qualidade política.
Trata-se, pois, de conexão funcional entre instituições, estilo cultural e confiança política. O resultado será a escolha entre democracia e autoritarismo.
Mas, um dado novo surgiu com a internet. A experiência demonstra que a instância digital não assegura a democratização da sociedade. Ao contrário. Porque as redes sociais, na prática, retiram dos Parlamentos a mediação própria da representação política. E, ao fazê-lo, criam uma arena digital. Na qual as redes sociais funcionam como casas de espetáculo político.
A consequência desse fato é que as redes sociais são uma extensão do ambiente político. Mas produzem também a fragmentação do espaço público. Gerando uma linha direta entre agentes políticos e o cidadão-eleitor. Esta linha direta enfraquece as instituições. Como o Parlamento. E fortalece o discurso carismático. E demagógico.
A probabilidade de eleição de candidatos, como Donald Trump, depende do grau de confiança do eleitor no sistema democrático. Se o eleitor acreditar na democracia, derrota Trump. Se o eleitor se frustrar com as propostas da democracia, elege Trump.
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