“Com tempo suficiente até o PT aprende”.
Delfim Neto, ex-ministro da Fazenda e ex-deputado federal.
Na perspectiva dos petistas, Delfim Neto era um liberal de mercado. Filiado a John Stuart Mill. E admirador do capitalismo inóspito. Na perspectiva de Roberto Campos, o Velho, o professor Delfim Neto era um intervencionista. Keynesiano. E praticante do Estado responsável pelo crescimento.
Essa ambiguidade trouxe luminosidade intensa e breve à gestão econômica no período da ditadura de 64. Carregada por um professor da USP. Depois, ministro todo poderoso da Fazenda. Depois, embaixador em Paris. Depois, deputado constituinte. Depois, um sábio que disse:
“Nunca trabalhei, só vivi”.
Delfim Neto são três Delfim Neto: o docente universitário, o homem do poder e o político. Não é uma carreira. A Universidade seria pequena. Mesmo com diploma de doutor. O poder, mesmo o de um czar da economia numa ditadura, é passageiro. Todo ele é. E ser político exige uma dedicação filial que não era o destino de Maquiavel tropical.
Seria uma cordilheira. Um devaneio para uns. Uma tragédia para outros. Para todos, o cume do farol. De onde aquele economista assumiria improvável papel. E uma visibilidade de quem foi presidente. Não tendo sido.
Como parlamentar, Delfim viveu o raro constrangimento de um episódio na Câmara dos Deputados. Ao ver a entrada do ex-ministro no elevador, parlamentares petistas se retiraram. Deixando Delfim só.
Foi evento isolado. Na verdade, a passagem de Delfim no Parlamento revelou-se contributiva. Principalmente, no primeiro mandato. Quando ele foi constituinte. Dando qualidade a pontos importantes discutidos na proposta da Constituição de 1988. Mas, o mais inesperado viria depois.
No segundo governo Lula da Silva, ares de diálogo foram sentidos. Distantes da ortodoxia ideológica de setores do PT. Vivia-se a era de Antônio Palloci. Quando o poder conversava com todo mundo. Sem necessariamente estar obrigado a tal. Por contar com maioria parlamentar. Diferente de agora.
Pois bem. Para surpresa suprema do PT, da política e de quem se interessava pelo tema, Delfim virou conselheiro de Lula da Silva. Que ele recebia em Palácio. A quem indagava sobre o futuro. De quem ouvia o que era doce. E o que não era.
O país olhava perplexo. Como seria possível? Sim, foi possível. Porque, acima da ideologia, está uma coisa mais sutil, mais fina e mais eficaz: a capacidade de ver, de enxergar. O ano seguinte. Foi esta capacidade de se alongar no tempo (e no espaço) que uniu contrários. O mais longevo dos ministros da Fazenda. E um tri-presidente. Justapostos.
Talvez o mais apreciável, na história da República, não tenha sido tal encontro. E, sim, o convivente trabalho parlamentar dos deputados Roberto Campos, o Velho, e Delfim Neto. Dois homens preparados, eruditos. Intelectualmente brilhantes. Que, um dia, deram brilho ao Parlamento brasileiro. Sem orçamento secreto.
A artigo do Luiz Otávio é simplesmente preciso e no ponto. Diz tudo, com sutil ironia: num tempo que o Parlamento brasileiro já teve brilho, sem orçamento secreto. Saudades de um Brasil, que poderia ter dado certo.
Faço coro.
Clemente
Sei que o passado está sujeito a interpretações… Para mim, dois heróis sem caráter. Dois falsificadores da história. Dois oportunistas. Dois homens com ideias retrógradas sobre o que é o poder do Estado e sobre como o Estado deve usar esse poder. Um usando o outro para “passar pano” ou passar um verniz nos aspectos obscuros e maléficos de suas respectivas biografias. O Presidente Lula teria “pedido desculpas”, não sei quando nem sei o porquê, pediu desculpas ao signatário do AI5. Não só signatário, mas um de seus mais ferozes defensores. O “milagre” de Delfim foi apenas um dos “voos de galinha”, e foi produto do imediatismo tanto quanto foi produto do imediatismo a recessão de 2014-2016. Delfim também era frequentador do Palácio para conversar com a economista Dilma Rousseff. Essa verdade pra mim soa como piada de mau gosto. Como se não existissem economistas melhores. Só que não eram sabujos. Nessa dupla nunca houve nem sombra da doutrina liberal. Sou incapaz de ver o que houve de positivo nessa conciliação para embelezar atos vergonhosos e crimes do passado e do presente. Só porque é diferente da polarização de hoje?!